# I. Introdução saúde mental se fundamenta como um campo excepcionalmente polissêmico e plural conforme seu fluxo referente ao estado mental dos sujeitos e das coletividades, circunstâncias por si só bastante complexas. O grupo populacional heterogêneo que neste estudo é foco de reflexões, possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória (POLÍTICA NACIONAL PARA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA, 2009). Está população em situação de rua, sofre os efeitos da organização social é do sistema econômico vigente que são base para a manutenção do controle dos corpos dos sujeitos, pontuando a exclusão social como forma de invisibilizar as contradições decorrentes do fracasso do modelo social em vigor -o capitalismo (BASAGLIA, 2011). Basaglia (2011) fundamenta que tais contrastes são vistos apenas como anomias -ou "doenças", ao invés de um produto direto da organização social; consequentemente, uma parcela dos sujeitos em sofrimento mental, impedidos pela sua situação de servir como mão de obra capitalista, se encontram à margem da sociedade, portanto excluídas. O autor acima referido destaca que na sociedade capitalista e concorrencial, os loucos constituem uma massa restante de força de trabalho que não é absorvida pelo capital, logo, se o indivíduo não é dócil e produtivo, não há espaço no coletivo para ele. Sem capacidade de caber dentro do tecido social, o que ocorre com esses sujeitos? É partindo deste questionamento que a escrita aqui proposta toma forma, com objetivo geral de tecer reflexões acerca da situação em que a pessoa em sofrimento mental e em situação de rua se encontram no Brasil. Partindo de um entendimento do modelo neoliberalista em vigência no país, as autoras apresentam algumas propostas do Estado em formato de políticas públicas voltadas para essa população que entraram em curso, principalmente nos últimos 20 anos no país, com amparo de produções teóricas de autores da psicologia e psicanálise. Bem como, buscam contribuir para as produções futuras, dentro de uma área que caminha a passos lentos frente a diversas desarticulações proferidas pelo próprio governo em suas últimas gestões. # II. # Sofrimento Como Produto Socioeconômico Sob a ótica do neoliberalismo, o sofrimento psíquico é tanto um produto como uma regulação do seu sistema, de tal forma que se estabelece para além de um modelo socioeconômico, instituído como uma forma de vida nos campos do trabalho, da linguagem e do desejo (SAFATLE, SILVA JUNIOR; DUNKER, 2021, p. 10). Assente a compreensão do neoliberalismo como modo de gerenciamento de uma política do sofrimento produzida por ele mesmo, podemos traçar um paralelo com as "Teses sobre a necessidade" de Theodor Adorno (2015), onde o filósofo fundamenta a necessidade como uma categoria social, que contém a pulsão, moção esta, tão mediada socialmente que sua dimensão natural ocorre a nível de produção social. Logo, a mediação social da necessidade, através do modelo capitalista, cai em contradição consigo mesma, no seio do contraste entre necessidade natural e produzida se encontra o risco de se instalar uma necessidade monopolizada, executada na força do neoliberalismo que molda os desejos dos sujeitos. A performatividade neoliberal atravessa os indivíduos de forma que eles modificam a si próprios, numa recodificação de suas identidades, legitimidades e modos de vida (SAFATLE, SILVA JUNIOR; DUNKER, 2021, p. 11). Portanto, segundo Adorno (2015, p. 233), a satisfação imediata da necessidade corresponde com o sofrimento da esmagadora maioria dos seres humanos, com base nesse sofrimento o neoliberalismo surge como seu estatuto social. Compreendemos, portanto, que o modelo socioeconômico vigente não só se configura como um modelo de governo mas também como uma gestão social das subjetividades, dessa forma, Safatle (2021) concretiza que "o sofrimento psíquico guarda uma dimensão de expressão de recusa e de revolta contra o sistema social de normas" (p. 35), a disciplinaridade proposta pelo neoliberalismo procura a anulação dessa revolta e para fazer valer seu planeamento toma para si as categorias clínicas responsáveis pela identificação do psiquismo dos sujeitos, chamadas pelo autor de 'tecnologias de intervenção na estrutura psíquica a partir de valores'. Estruturando-se como performances, ao invés de categorias psíquicas descritivas, consequentemente, quem não se adequa ou não cabe às normas do modelo é posto à margem da sociedade. Em Salgado e Fuentes-Rojas (2018, p. 251), temos que a presença de pessoas utilizando a rua como espaço de moradia e sobrevivência não se configura como um atributo da sociedade atual, mas representa a proliferação da pobreza e das desigualdades sociais, decorrentes do sistema econômico em vigor. Os autores abordam sobre o crescimento exponencial dessa população desde os anos 90, onde sob a ótica da exclusão social, se percebe um elo entre os fenômenos da migração e do desemprego com a utilização dos logradouros públicos como espaço de permanência e subsistência. Em meio a essa expressiva população, há aqueles que além de se instalarem na rua vivenciam problemas decorrentes de transtornos mentais, os considerados 'loucos de rua' são os sujeitos que não estão institucionalizados e que enfrentam condições de extrema pobreza, com vínculos familiares interrompidos ou fragilizados. Filho (1998) firma o termo humilhação social, a qual conhece em seu mecanismo pressupostos econômicos e também inconscientes, desta forma, a humilhação social deve ser proposta como um modelo de angústia disparado pelo grifo da desigualdade de classes. O autor também aponta que a humilhação crônica, sofrida por muito tempo pelos pobres e seus ancestrais, é um produto da desigualdade política, que indica a exclusão recorrente de uma classe inteira de sujeitos para fora do campo intersubjetivo, assim, a pessoa sofre e habita uma experiência comum. Retornando à Basaglia (2011), pontuamos que todo indivíduo classificado como louco é uma denúncia do modelo de sociabilidade, de um padrão normativo que não tolera o diverso, em vista disso, é possível observar um paralelo entre a humilhação socialmente compulsória e a exclusão dos loucos. Lembramos Freud e sua busca pelo cerne da angústia frente ao desconhecido em "O Infamiliar" (1919; 2019), que se entende como algo que sempre, nada se sabe, que remete ao que antes foi conhecido, de uma forma até íntima, mas pela suspensão desse conhecimento se torna angustiante, aterrorizante. A nova gramática social do sofrimento estabelecida pelo neoliberalismo parece ter criado uma multidão de infamiliares que (sobre) vivem frente ao não enquadramento das normas do modelo vigente. Apesar da problemática continuar atual, é impossível negar os benefícios originados pela Lei n. e de novos direitos para os sujeitos em sofrimento mental obteve um marco decisivo com a promulgação da Lei da Reforma Psiquiátrica brasileira, aprovada após doze anos de tramitação do projeto original, em 6 de abril de 2001, e apesar de não ter assegurado algumas das aspirações mais fundamentais do projeto original, como a extinção total dos manicômios, a lei significou um avanço considerável no modelo assistencial (AMARANTE, 2007). Como apontado em Lima e Guimarães (2019), a Reforma Psiquiátrica Brasileira (RPB) se apresenta como o grande marco da reorientação teórico-prática da loucura no Brasil. Nascida no interior do processo de conscientização sanitária, vem, desde os primeiros anos do movimento de Luta Antimanicomial até os dias atuais, promovendo incontestáveis avanços em todo território nacional e nos diversos âmbitos que conformam suas múltiplas facetas -teórico conceitual, jurídico-político, técnicoassistencial e sociocultural. # III. # Políticas Públicas O sofrimento psíquico do sujeito em situação de rua atravessa o campo subjetivo do transtorno, tendo em vista que a manutenção e promoção da saúde mental demanda aspectos que são, por diversos motivos, inviáveis para essa população, como: ter um sono reparador, boa alimentação, boa higiene, aproveitar momentos de tranquilidade, etc. Contudo, como nos mostra Rosa e Santana (2016, p. 50), uma pessoa em situação de rua vive constantemente sob tensão, insegurança e incerteza, pois se encontra exposta a um ambiente de extremo estresse, violência, exclusão, subsistência e falta de acesso à higiene básica. É explanado, também, a alta frequência do consumo de drogas, lícitas ou ilícitas, como ferramenta de defesa e fuga das adversidades, já que o efeito proporciona um momento de esquecimento dos seus problemas, como a fome. Destarte, a baixa autoestima é outra problemática presente em uma grande parcela da população em situação de rua; a autoestima diz respeito ao sujeito sentir-se bem consigo mesmo, sendo portanto uma importante ferramenta na promoção da saúde mental, contudo em relação a pessoas em situação de rua, a baixa autoestima está bastante relacionada a sentimentos de desesperança e frustração (ROSA; SANTANA, 2016, p. 51). Importante ressaltar o psicanalista Jorge Broide (2019) ao pontuar que a experiência do atendimento onde quer que a vida se dê mostra que os sujeitos falam onde haja escuta, seja ela no divã, em uma instituição, nas ruas ou debaixo de uma ponte, dessa forma destacamos a importância do investimento no campo da saúde mental voltado à garantia de direitos e bem estar da população em situação de rua. Partindo do objetivo de ampliar o acesso à atenção psicossocial da população, promover a vinculação dos sujeitos -e suas famílias -com transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas aos pontos de atenção; garantir a articulação e integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, com qualificação do cuidado por meio do acolhimento, acompanhamento contínuo e da atenção às urgências, a portaria n. 3.088 de 23 de dezembro de 2011, instituiu a Rede Atenção Psicossocial (Raps). Novamente Amarante (2007), nos mostra que a Rede é constituída por diversos componentes, os quais abrangem nas suas especificidades os dispositivos de fluxo do funcionamento, como: atenção básica em saúde; atenção psicossocial especializada; atenção de urgência e emergência; atenção residencial de caráter transitório; atenção hospitalar; estratégias de desinstitucionalização; e reabilitação psicossocial. No campo das políticas públicas e referente à responsabilização do Estado frente à garantia de direitos de seus cidadãos, Borysow e Furtado (2013) apontam sobre a incumbência proporcionada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Os autores discorrem que com o advento do SUS a partir da Lei nº 8080, de 1990, a atenção à saúde passou a ser direito de todo o cidadão brasileiro, e o acesso da população aos serviços públicos de saúde foi universalizado pelo Estado. Além disso, o SUS estabelece como diretriz a equidade, de modo a garantir que o acesso aos serviços contemple as diferenças e desigualdades econômica, social, cultural e de gênero. No que diz respeito às pessoas em sofrimento mental, a garantia de acolhimento e tratamento é objeto da rede de serviços descentralizados e territorializados, como por exemplo, os Centros de Atenção Psicossociais (CAPS). Em vista da garantia do acesso da população em situação de rua aos serviços de saúde, em 2011 -no governo da ex-presidenta Dilma Rousseff -a Política Nacional de Atenção Básica instituiu as equipes de estratégia do Consultório na Rua. O Ministério da Saúde atribui três modalidades para as eCR's, dependendo da sua formação; de maneira geral é prevista a possibilidade de algumas configurações de equipes com os seguintes profissionais: enfermeiro, médico, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, agente social, técnico ou auxiliar de enfermagem, técnico em saúde bucal, cirurgião dentista, profissional de educação física e profissional com formação em arte e educação. No ano de 2020, a prefeitura de Belém, no estado do Pará, lançou mão do Protocolo do Programa de Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde do Município de Belém, onde aponta que "na atenção em Saúde Mental, a linha de cuidado visa organizar os serviços de saúde para que o usuário seja acompanhado nos vários níveis de atenção, de forma holística, garantindo o direito de acesso à saúde para além da saúde mental" (p. 6). Também aborda sobre a estratégia do Consultório na Rua (p. 12), dentro dos dispositivos de saúde no programa de saúde mental, onde: A eCR integra o componente Atenção Básica da Rede de Atenção Psicossocial e desenvolvem ações de Atenção Primária, seguindo os fundamentos e as diretrizes definidos na Política Nacional de Atenção Básica. A eCR é multiprofissional, com os serviços direcionados exclusivamente para a população em situação de rua, considerada a situação de maior vulnerabilidade social, sendo estas pessoas usuárias ou não de álcool, crack e outras drogas. A eCR desempenha suas atividades in loco, de forma itinerante. Essa estratégia de cuidado foi desenvolvida levando em consideração a dificuldade dessa população em acessar os pontos de atenção dentro da rede de forma padrão. A eCR desenvolve ações compartilhadas e integradas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) e, quando necessário, também com as equipes dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dos serviços de Urgência e Emergência e de outros pontos de atenção, de acordo com a necessidade do usuário. Dentre as atividades da eCR está a busca ativa e o cuidado dos usuários em acompanhamento. Como apontado por Rosa e Santana (2018, p. 502), o Consultório na Rua promove o deslocamento tanto dos profissionais como da própria estrutura de assistência para fora dos serviços de saúde e das estratégias de cuidado restritas a um ambiente hospitalocêntrico e domiciliar. É explanado, também, como a ocorrência dos Consultórios na Rua deve-se à competência e insistência dos profissionais em construir formas de cuidado, muitas vezes transpondo as barreiras institucionais do próprio sistema de saúde e da ausência de articulação setorial entre as políticas públicas. A estratégia representa um significativo campo de resistência e politicidade; a prática do cuidado das eCR's reconhece os determinantes sociais, bem como o potencial transformador dos vínculos quando ocorrem na dimensão do engenho e arte do cuidar (ROSA; SANTANA, 2018, p. 502). Entretanto, este campo da saúde voltado à população em situação de vulnerabilidade social vem sofrendo uma gigantesca desarticulação desde o impeachment sofrido pela presidenta Dilma Rousseff, os governos que se sucederam iniciaram o desmonte da rede de saúde mental de forma sistemática. Uma reportagem da Folha de São Paulo mostra que no ano de 2020, o presidente em exercício, Jair Bolsonaro, aprovou um aumento de 95% no repasse de recursos federais para Comunidades Terapêuticas, sendo 74% destas de matriz religiosa. Ao mesmo tempo em que o atual governo sistematiza o desmonte no campo de saúde mental, apresentando um projeto que pretende desativar cerca de 100 portarias na política de SM, como apontado pelo psicanalista Christian Dunker em sua coluna no site da UOL, a necropolítica governamental de forma proposital diminui a responsabilização do Estado frente a seus cidadãos e cria mais violências. Amarante (2007) ressalta que as atuais chamadas Comunidades Terapêuticas (CT's), estruturadas como 'fazendas', de tratamento de dependência a álcool e outras drogas, possui na sua maioria caráter religioso -especialmente de matriz cristã -e buscam ganhar legitimidade social e científica. Em Farias e Passos (2018), temos um detalhamento de como as CT's se configuram, enquadrando-as num campo de práticas higienistas e eugenistas, que defendem a abstinência como forma de tratamento para os sujeitos; indo na contramão da atual política sobre drogas que se fundamenta na estratégia de redução de danos, fundada como um dispositivo democrático de cuidado. O modelo de tratamento ofertado nas Comunidades Terapêuticas se baseia em três pilares fundamentais: o trabalho, a disciplina e a espiritualidade. Um modelo que versa bastante com o paradigma da hospitalização biomédica, pautado no pressuposto de que o paciente portador de um distúrbio que lhe rouba a razão é um sujeito insano (considerado como irresponsável civil pela legislação). Destarte, é uma configuração similar às instituições carcerárias, correcionais, que se fundam na vigilância, no controle e na disciplina dos corpos, assim como se ajusta em um funcionamento punitivo e repressor (AMARANTE, 2007). Não coincidentemente, o modelo também apresenta similaridades com as instituições asilares criticadas por Basaglia (1985), ao discorrer que os hospitais psiquiátricos nunca serviram aos loucos mas tão somente aos "sãos", tendo como função apenas separar os produtivos dos improdutivos, os muros servem para excluir e isolar os sujeitos, a loucura, a fim de que não invadam o espaço dos sãos. Assim, se posta o paralelo com o distanciamento físico das Comunidades Terapêuticas, que em sua maioria são em locais afastados de centros urbanos, estabelecendo a segregação de maneira orgânica. Nesses espaços, os usuários acolhidos são cooptados a seguir a fé imposta pela instituição, além de exercer atividades não remuneradas de manutenção dos espaços de convívio, por vezes substituindo a presença de profissionais para tais funções. Isto porque a maioria das Comunidades Terapêuticas acreditam na "laborterapia", no sentido de dignificação do homem através do trabalho (FARIAS; PASSOS, 2018). Batista (2015) estabeleceu em seu trabalho um elo entre as análises foucaultianas e marxistas sobre os sujeitos; partindo do seu ponto de vista, podemos pontuar uma simetria entre a lógica do trabalho para as CT's com a crítica estabelecida entre os autores, a julgar que as relações de poder têm uma incidência direta sobre o corpo, que se encontra totalmente atolado em uma dimensão política, e este acometimento político sobre o Volume XXI Issue XIII Version I 54 ( ) Recorremos a Freud, quando em seu discurso no V Congresso Psicanalítico Internacional, no ano de 1918, proclamou: "É possível prever que a consciência da sociedade irá se despertar, e fará com que se lembre de que o pobre deve ter tanto direito à assistência para sua mente quanto dispõe agora do auxílio oferecido pela cirurgia a fim de salvar sua vida; de que as neuroses ameaçam a saúde pública não menos do que a tuberculose, e tampouco podem ser deixadas aos cuidados impotentes de membros individuais da comunidade." (2019, p. 9) Assim, o pai da psicanálise se propôs a apontar para o que aqui reforçamos: o sofrimento não é oriundo exclusivamente da natureza humana, mas também e em grande parte, é imposto pelo status econômico e posição social dos sujeitos. Consequentemente, como levantado por Danto (2019), praticar a psicanálise se fundamenta como um comprometimento no discurso político, de forma consciente ou não. O neoliberalismo se utiliza da articulação de conflitos do sistema neurótico para impor as narrativas do seu modelo sintomático, como justificar o tratamento de estrangeiros e manipulações trabalhistas, com o intuito de produzir novos montantes para uma mão de obra barata (DUNKER, 2019, p. 186). Com base nessa análise podemos estabelecer um paralelo com o estudo de Salgado e Fuentes-Rojas (2018, p. 251), citado anteriormente, quando foi apresentado um significativo aumento da população em situação de rua decorrente de uma elevada onda de migração e desemprego, com efeitos diretos no psiquismo dos sujeitos e na sua liberdade, haja vista que "controlar a gramática do sofrimento é um dos eixos fundamentais do poder" (SAFATLE, SILVA JUNIOR; DUNKER, 2021, p. 13). Voltamos, enfim, à proposta de humilhação social descrita por Filho (1998, p. 4), que compreende uma angústia a níveis freudianos e marxistas, numa sociedade em que toda aquisição, seja simbólica ou material, foi transformada em moeda pela lógica de mercado do neoliberalismo que dá conta da reprodução social de diversos traços descritos por Marx sobre o capital. Analiticamente, considera-se as consequências da angústia a nível das pulsões, onde o desejo, como visto anteriormente, se desdobra em um emaranhado de imposições sociais performativas, numa espiral de mutilação social sem fim. # IV. # Considerações Finais O presente artigo consistiu em discutir sobre a saúde mental da população em situação de rua, respaldado sob pesquisa bibliográfica de autores das áreas afins, tendo como ponto de partida o modelo socioeconômico atual e suas consequências nos âmbitos sociais e subjetivos dos sujeitos, percorrendo de forma breve sobre a instauração das políticas públicas brasileiras, bem como o desmonte que o campo da saúde mental vem sofrendo nos últimos anos pelas gestões governamentais. Propondo-se servir como uma ferramenta de enriquecimento para a literatura, como forma de fomentar ainda mais a discussão frente aos conteúdos explorados. Resta evidente, a importância de pensar o campo da saúde mental e atenção psicossocial não como um modelo ou sistema fechado, mas sim como um processo; um processo que é social e complexo. É possível notar os avanços conquistados pela Política de Saúde Mental no país e como os serviços ofertados pelo SUS através da Rede de Atenção Psicossocial têm a capacidade de dar o suporte necessário aos usuários, desde que gerida seguindo os preceitos da Reforma Psiquiátrica simpática ao usuário e não ao capital, com discurso manicomial, higienista e eugenista. Volume XXI Issue XIII Version I © 2021 Global JournalsSaúde Mental e População em Situação de Rua: Um Recorte do Sobreviver à Margem no Brasil Year 2021 A * TheodorWAdorno 1903 -1969 * Saúde Mental e Atenção Psicossocial./Paulo Amarante. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz PauloAmarante 2007 * A Instituição negada: relato de um hospital psiquiátrico / coordenado por Franco Basaglia; tradução de Heloisa Jahn FrancoBasaglia 1985 Edições Graal Rio de Janeiro * Escritos Selecionados em Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica FrancoBasaglia 10 outubro 2011 Garamond; 1ª edição * JL CBatista Luta De Classes E Estratégia: Sujeitos De Marx E Foucault Diante DoDe Confronto 2015 Universidade Federal do Paraná, Dissertação de Mestrado. Curitiba * Acesso e Intersetorialidade: o acompanhamento de pessoas em situação de rua com transtorno mental grave IgorBorysow Da Costa JuarezFurtado Pereira Physis Revista de Saúde Coletiva 2013 Rio de Janeiro, 23 [1 * Nacional para a População em Situação de Rua PolíticaBrasil 2009 053 de 23 de dezembro de * JorgeBroide Prefácio In: DANTO, Elizabeth. Ann. As Clínicas públicas de Freud: psicanálise e justiça social --1. 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