# Introdução Brasil emerge nos anos 1990 a partir das reivindicações de movimentos sociais por uma educação de qualidade no Campo. Os cursos de Licenciatura em Educação do Campo (LEdoCs) foi uma de suas conquistas, tendo como proposta pedagógica articular as experiências educativas dos movimentos camponeses e os conhecimentos acadêmicos. Essa pesquisa utilizou entrevistas narrativas para auxiliar nessa articulação. Foram realizadas três entrevistas narrativas com uma estudante de uma LEdoC buscando aprofundar, esclarecer e contextualizar suas experiências educativas. O conhecimento emancipação foi o referencial analítico adotado caracterizado em suas dimensões ético-político-estético. A análise das narrativas evidenciou que a percepção do universo vivido foi ampliada e apropriada pela entrevistada; a narrativa favorece a emergência de manifestações do senso comum ético-políticoestético, fortalecendo as comunidades discursivas; os movimentos camponeses organizados retiram os sujeitos do campo de condições de abandono; a educação de qualidade pode fortalecer movimentos emancipatórios. ntre os anos 1950 e 1960, o Brasil foi palco de um amplo debate político em torno dos direitos dos trabalhadores do campo, da reforma agrária, do fortalecimento da cultura popular e da alfabetização de jovens e adultos do meio rural (PALUDO, 2001). Um dos projetos com maior repercussão nesse período foi construído por uma equipe coordenada por Paulo Freire, que teve sua experiência original no pequeno município de Angicos com um pequeno grupo de lavradores, utilizando os círculos de cultura. O sucesso teve como resultado a alfabetização de 300 trabalhadores, rurais e urbanos em 45 dias. O sucesso desse projeto orientou a construção de uma plataforma nacional de educação por parte do governo federal, com a previsão de alfabetizar 2 milhões de estudantes 2 (BRANDÃO, 2002). # E A proposta freiriana tinha por objetivo contrapor-se à educação tradicional, pautada na transmissão de conhecimento, propondo uma educação libertadora, ou seja, um método educativo "que implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo" (FREIRE, 2020, p. 93). Esse método pressupunha que uma educação libertadora deveria devolver aos sujeitos a palavra e a história. Para tanto, provocava leituras autênticas dos estudantes sobre o mundo, seu registro e sua elaboração sob a forma de material didático. Esse material deveria tornarse público, como forma de contrapor-se à versão hegemônica da história e à desigualdade social por ela alimentada (FREIRE, 1989). O projeto de alfabetização a ser desenvolvido nacionalmente, contudo, não se efetivou em função do golpe militar que, em 1964, instaurou o regime ditatorial no Brasil (BRANDÃO, 2002). Orientados por princípios teóricometodológicos afinados à proposta freiriana, as Comunidades Eclesiais de Base (CEB), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), os Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFAs) e outros movimentos ligados ao campo no Brasil tornaram-se focos de resistência ao processo de desconstrução dos movimentos sociais camponeses imposto pela ditadura militar na segunda metade dos anos 1960 e durante os anos 1970 (FREITAS, 2011). Este contexto fez com que os movimentos pela educação popular permanecessem em grande parte separados da escola formal, atuando na organização de comunidades camponesas e outros grupos socialmente marginalizados. Surgiram a partir desse movimento pela educação popular diversos grupos autônomos e organizados (BRANDÃO, 1983; BRANDÃO, 1999; WANDERLEY, 2010) que passaram a ser uma das principais referências para a psicologia social latino-americana nos anos 1980 e 1990 (LANE, 1981; LANE; CODO, 1984;CAMPOS, 1996;GUARESCHI, 2000). Segundo Oliveira (2008), um número significativo de Sindicatos de Trabalhadores Rurais vinculados à CONTAG foi constituído entre as décadas de 1970 e 1980 a partir das mobilizações de movimentos e organizações sociais camponesas, mobilizaram-se em espaços discursivos e deliberativos sobre os projetos para o âmbito local e, por vezes, regional e nacional. Setores progressistas da Igreja Católica, por meio da Comissão Pastoral da Terra, deram continuidade ao processo de mobilização camponês, apesar da repressão, gestando a criação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) (FERNANDES, 2000). A organização das comunidades favorecia a organização popular e sua compreensão do processo político. Tais processos, segundo os pressupostos freirianos, eram necessários para a superação da inexperiência democrática Brasileira (FREIRE, 1967). Com o processo de redemocratização vivido pelo Brasil a partir dos anos 1980, os movimentos camponeses, orientados pela perspectiva do Campo Democrático Popular (PALUDO, 2001), passam a exigir do Estado a criação de políticas voltadas para o campo, retomando a pauta da reforma agrária e de fortalecimento de uma agricultura familiar camponesa, esta última caracterizada principalmente pela gestão da terra, da produção e do trabalho pela própria família, proprietária de pequenas propriedades rurais (RICCI, 1999;FERNANDES, 2000). Sendo responsável pela produção de 52% dos alimentos produzidos e consumidos no país (KAGEYAMA et al, 2013), a agricultura familiar passa a ser o parâmetro jurídico de referência para o acesso a políticas públicas voltadas para seu fortalecimento, apesar das diferenças na sua concepção entre movimentos sociais e Estado 3 A partir de meados dos anos 1980 e principalmente nos anos 1990, as manifestações e ocupações realizadas por movimentos sociais camponeses, em especial o MST, demandavam atenção do Estado às políticas de reforma agrária que . São criados programas de financiamento para a agricultura familiar, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) nos anos 1990, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), em 2003 para a compra de produtos da agricultura familiar para populações em situação de vulnerabilidade, e é remodelado o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que exige que pelo menos 30% da alimentação escolar oferecida nas escolas públicas seja comprada da agricultura familiar. Esses dois últimos programas têm como característica incentivar agricultores que não eram organizados a se organizarem em cooperativas para acessá-los (COSTA, AMORIM JR & SILVA, 2015). precisaram ser retomadas (PEREIRA, 2009) e reorientadas a partir dos diálogos realizados entre estes atores (ROSA, 2009). Embora a reforma agrária e a criação de políticas públicas para os agricultores familiares sejam pautas historicamente reconhecidas como necessárias para o enfrentamento da desigualdade social no Brasil (SZMRECSANYI, 2007; GUANZIROLI, 2009, MAIA & BUANAIN, 2015) outras pautas orientaram as reivindicações dos movimentos sociais camponeses como saúde, educação, transporte e cultura à luz da recém implementada Constituição Federal de 1988. É neste contexto político e histórico que, ao final dos anos 1990, a Educação do Campo emerge como uma das principais bandeiras de lutas dos movimentos camponeses, exigindo não apenas o direito ao acesso a uma educação de qualidade pelos povos do campo em suas localidades, mas principalmente um outro modelo de educação, que articulasse as exigências curriculares e as demandas apresentadas pelos povos do campo, voltada para o desenvolvimento integral dos sujeitos do campo (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014; CALDART, 2000; CALDART, 2012). A luta pela Educação do Campo que emerge a partir desses movimentos não é, portanto, uma reivindicação apenas por escola. Caracterizada como um movimento, a Educação do Campo é uma construção coletiva de movimentos sociais do campo em diálogo com o Estado. Em diálogo com princípios da educação popular freiriana (ANTONIO & LUCINI, 2007), sua proposta tem por objetivo desenvolver na escola possibilidades de refletir para atuar sobre a realidade do campo, orientada por uma matriz mais inclusiva, ambiental e socialmente, com respeito à diversidade social e cultural (CALDART, 2009). Trata-se de um movimento sem precedentes na história da educação brasileira no que se refere ao processo participativo e democrático que a constituiu. O marco cronológico deste processo é a realização da primeira Conferência Nacional: Por uma Educação Básica do Campo (CNEC), realizada em 1998. Essa conferência reivindicava, principalmente, a participação dos movimentos na elaboração de uma Esse artigo é o resultado de uma pesquisa desenvolvida diante do desafio de fomentar estratégias formativas que cumprissem essa mediação entre conhecimentos populares e conhecimentos acadêmicos e curriculares no curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Viçosa (Licena). Orientados pela perspectiva de que a construção do conhecimento ocorre a partir de enunciados produzidos em uma perspectiva parcial, em um dado período histórico, com objetivos e contextos comunicacionais bem definidos (HARAWAY, 1995) foi desenvolvida uma pesquisa na qual considerou-se que os textos narrativos produzidos pelos estudantes da Licena teriam uma importante contribuição para a sistematização de experiências e produção de conhecimentos sobre a realidade camponesa. Ao mesmo tempo poderiam integrar-se às atividades pedagógicas desenvolvidas pelo curso e à sua grade curricular. Partiu-se da hipótese de que as narrativas camponesas poderiam ser utilizadas como conhecimento transversal para a formação de estudantes dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo ao favorecer os diálogos de experiências empíricas com os princípios fundamentais do movimento Educação do Campo. Para analisar a pertinência dessa hipótese foram realizadas entrevistas narrativas com uma estudante da Licena, utilizando como referência a proposta da Metodologia das Produções Narrativas (BALASCH; MONTENEGRO, 2003) e fundamentadas na perspectiva dos Conhecimentos Situados de Donna Haraway (1995). Nesta perspectiva, considera-se que todo indivíduo, ao narrar, parte de uma perspectiva parcial sobre as realidades em que vive, permitindo-lhe evidenciar as especificidades culturais, os processos educativos e as práticas sociais existentes nos contextos sociais investigados. Em diálogo com essa concepção, utilizamos como referencial analítico a concepção de conhecimento-emancipação de Boaventura de Souza Santos (2011). O conhecimento-emancipação situase diante da crise do paradigma moderno como uma alternativa paradigmática ético-político-estética, construída a partir da produção de espaços discursivos geradores de novos sensos comuns: o senso comum ético, baseado no princípio de que a solidariedade parte das experiências subjetivas para a construção de uma ecologia de saberes; o senso comum estético, que como conhecimento interessado, parcial e situado reconhece a dimensão emocional do conhecimento e com ele as identidades emergentes; e o senso comum Em termos metodológicos, o artigo aborda um estudo de caso, para o qual foram realizadas três entrevistas narrativas com uma estudante da Licena com o intuito de aprofundar as experiências educativas vivenciadas por ela em seu território. Ao término de cada entrevista, a equipe de pesquisadores construía a narrativa e formulava questões à estudante para a realização de uma nova entrevista. A narrativa era apresentada a ela, que validava ou sugeria correções e acréscimos. Após a leitura da narrativa, as questões formuladas pelo grupo de pesquisa eram então apresentadas sob a forma de uma nova entrevista. Na primeira narrativa, as questões buscaram promover e ampliar as reflexões sobre sua trajetória de vida. Na segunda narrativa, as questões buscavam aprofundar aspectos relacionados aos contextos sociais em que a participante da pesquisa se insere e os processos de geração de conhecimentos vivenciados em seu território educativo. Na última narrativa, as questões ampliaram as discussões da narrativa anterior, aprofundando e problematizando quais eram as especificidades dos espaços de produção de conhecimento e dos sujeitos presentes no território educativo da participante da pesquisa. A partir das perspectivas apresentadas, o presente artigo buscou avaliar, a partir da análise da narrativa de uma estudante da Licena, as possíveis contribuições da MPN como atividade pedagógica para a sistematização de experiências discentes, a produção de conhecimentos concretos sobre o modo de vida camponês e a identificação neste modo de vida, de elementos ético emancipatórios característicos da transição paradigmática definida por Santos (2011) Como categoria analítica, será adotado o conceito de conhecimento-emancipatório de Boaventura de Souza Santos (2011). Nesta perspectiva, os efeitos predatórios do paradigma moderno sobre a pluralidade de conhecimento, de sujeitos e do ambiente impõem-lhe a necessidade de uma revisão. Santos (MPN) apresenta similaridade com esta perspectiva, caracterizando-se como uma opção teórico-política na produção do conhecimento. Orientada pela perspectiva dos Conhecimentos Situados, de Donna Haraway (1995), considera que todo conhecimento é parcial, pois contextualizado no tempo e no espaço e a partir de suas experiências. Nesse sentido, abdica de uma imparcialidade e de uma objetividade universal em prol de uma compreensão abrangente, densa e concreta. Segundo Haraway (1995), a objetividade deve ser compreendida como um construto histórico, entendido em suas bases materiais, interpretado por diferentes perspectivas, construindo-se nos embates e produzindo influências nas redes de relações em que se insere. Mas a utilização das narrativas como uma metodologia para a produção de conhecimento como testemunho de uma dimensão experiencial dos sujeitos é apenas parte desse processo, pois segundo Haraway (1995) (2011) considera que o sistema de regulação social do paradigma moderno enfraqueceu seu diálogo com a emancipação social e se apropriou, como forma de autolegitimação, da ciência e do direito. Propõe, portanto, como orientação para o processo de transição para um novo paradigma ético-políticoestético, a recuperação da emancipação social a partir de representações inacabadas da modernidade, ou seja, aquelas representações que embora fizessem parte do projeto moderno, foram desconsideradas no pensamento que se tornou hegemônico. Santos (2011) destaca duas: o princípio da comunidade, constituído pelos princípios ético-políticos da solidariedade e da participação; e o princípio estético-expressivo, orientado pelas ideias de prazer, de autoria e de artefactualidade. Santos (2011) considera ser possível construir um mapa emancipatório como referência para a identificação e articulação entre comunidades políticas progressistas. Por outro lado, propõe reinventar uma subjetividade individual e coletiva capaz e interessada em utilizar estas referências de forma emancipatória. Fomentar a vontade de lutar por alternativas, fomentar "subjetividades rebeldes" (SANTOS, 2007) é o desafio para uma nova psicologia, que desvele os silêncios e, ao mesmo tempo, as emergências emancipatórias (2011). A legitimação desses princípios, em substituição ao senso comum hegemônico, são a base necessária para a constituição de uma nova ética emancipatória, constituída por um novo senso comum ético, político e estético. O novo senso comum ético proposto orienta-se por relações de solidariedade, compreendidas como relações de responsabilidade e de cuidado entre os membros das comunidades políticas em torno do universo que as rodeia, no âmbito local ou global. Tratase de uma responsabilidade não individualista, na qual "indivíduo e coletividade devem ser considerados polos num continuum" (SANTOS, 2011, p.113) cientes de que são as ações coletivas responsáveis que permitirão o desenvolvimento socioambiental das comunidades. O novo senso comum político tem na participação um princípio básico e, assim como o princípio de solidariedade no novo senso comum ético, compõem a comunidade política. Pressupõe uma "repolitização global da vida coletiva" em reação ao esvaziamento da política no cotidiano da modernidade, considerando-se que essa expansão é uma condição emancipatória por permitir o confronto dos conhecimentos ausentes e emergentes com os monopólios de interpretação, apresentando alternativas a eles (SANTOS, 2007;SANTOS, 2011). Citando as Comunidades Eclesiais de Base, no Brasil, Santos (2011) caracteriza-as "comunidades amiba", nas quais a identidade é sempre "múltipla, inacabada, sempre em processo de reconstrução e reinvenção, uma identificação em curso" (SANTOS, 2011, p. 339). O novo senso comum estético guarda relação com as dimensões do prazer, da autoria e da artefactualidade discursiva. A ênfase no prazer pretende reconhecer sua capacidade mobilizadora para todas as dimensões da existência humana. O prazer mobilizado pelo conhecimento-emancipação está relacionado a uma proposta de reencantamento com o mundo a partir dos encontros e partilhas na discussão de alternativas ao modelo político, da construção de conhecimentos emancipatórios em diálogo com o outro, na troca de experiências em diversos âmbitos. O conceito de autoria, para Santos (2011), está relacionado à possibilidade de subjetividades que vivem à margem do sistema e à margem do conhecimento regulação, exercitarem a relação entre participação comunitária e ação autoral, ação criativa na forma de resolução dos conflitos ou proposição de alternativas aos desafios enfrentados na realidade. A artefactualidade discursiva refere-se a uma subjetividade capaz de reconhecer, explorar e querer explorar as potencialidades emancipatórias da transição paradigmática em direção à superação de sua condição marginal. Segundo Santos (2011), a artefactualidade discursiva, exatamente pelo distanciamento de seus sujeitos em relação aos centros hegemônicos, constitui um campo privilegiado para o desenvolvimento de uma "imaginação centrífuga, subversiva e blasfema" (SANTOS, 2011, p.358). Por estes motivos, Santos avalia que virão do Sul as experiências e, a partir do fortalecimento de comunidades discursivas, poderão emergir as epistemologias capazes de apresentar as alternativas ao modo hegemônico. Segundo ele, "as formas emancipatórias de sociabilidade emergentes nos diferentes espaços estruturais consolidam-se e expandem-se na medida em que se articulam umas com as outras em constelações de práticas e de conhecimentos emancipatórios" (SANTOS, 2011, p. # 335; (SANTOS; MENESES, 2010). Compreende-se, portanto, nesse artigo que o novo paradigma ético-político-estético proposto por Santos (2011) oferece um horizonte utópico sustentado em princípios similares aos apresentados por Haraway (1995), considerando as contribuições da Metodologia das Produções Narrativas na emergência e na reflexão sobre a emergência desse novo senso comum. Estas contribuições podem ser identificadas na capacidade heurística das narrativas de provocar, na especificidade metodológica dos encontros propostos entre entrevistador e entrevistado, lembranças e reflexões capazes de preservar e promover experiências de socialização alternativas ao modelo hegemônico de forma genuína, sem o crivo técnico-acadêmico e tampouco como acolhimento documental de narrativas, senão como referenciais discursivos para uma ecologia de saberes. Em outras palavras, a finalidade da investigação não é chegar a uma teoria universal, mas # Global Journal of Human Social Science -Year 2021 "abrir os espaços de compreensão e produção de significados, dando ênfase aos efeitos que se depreendem do conhecimento produzido" (GOIKOETXEA, 2014, p. 131). Neste artigo, o movimento de transição ao paradigma ético-político-estético proposto por Santos (2011) orienta a construção de parâmetros para a análise das contribuições da MPN ao ser implementada junto a uma estudante da Licena. Foram utilizados como parâmetros analíticos a presença das características do novo senso comum ético, político e estético a partir das narrativas da estudante entrevistada. # III. Sobre as Possibilidades Pedagógicas da Metodologia Das Produções Narrativas Com a Licena As produções narrativas, ao se orientarem pela produção situada de conhecimentos, (1) favorecem o reconhecimento de suas especificidades contextuais, (2) apresentam-se como metodologia dialógica na produção de conhecimento e (3) permitem ao investigador alterar sua posição inicial, adequando-se ao rumo das investigações no processo de interação com os participantes. A partir da interação entre pesquisador e narrador, a narrativa resultante apresenta-se como um texto com capacidade heurística, um texto elaborado e validado por pesquisador e narrador, com contribuições para os meios sociais dos participantes da pesquisa e para a comunidade científica (BALASCH; MONTENEGRO, 2003). Na pesquisa apresentada, considerou-se que a apropriação da Metodologia das Produções Narrativas pode contribuir para a formação de docentes que atuarão em escolas do campo ao efetivar um processo dialógico propiciado pelas entrevistas entre pesquisador e narrador, atualizando e problematizando a compreensão deste sobre sua própria trajetória, permitindo-lhe reorganizá-la e, por vezes, reconstituí-la ante esse processo reflexivo. Considerando-se que a MPN privilegia as narrativas de sujeitos com uma trajetória política, essa transformação/reorganização impacta em sua concepção e atuação, assim como influencia na concepção e agenda sociopolítica dos grupos a que pertencem e com os quais interagem, articulando contextos biográficos, históricos e sociais (MARTINEZ-GUZMAN; MONTENEGRO, 2014). Em outras palavras, esse processo discursivo fortalece as comunidades políticas em termos de registro e ampliação de sociabilidades alternativas. A partir desta perspectiva, a MPN foi adequada às atividades curriculares da Licena para provocar processos de rememoração, reflexão e aprendizagem, considerando que a produção dialógica de conhecimento na entrevista narrativa poderia ser replicada como atividade pedagógica na interação entre professor e estudante no desenvolvimento do Plano de Estudo Temático 5 A MPN foi desenvolvida junto a Melissa (PET). Na presente pesquisa, a MPN foi implementada na execução do PET da Licena, abordando a temática "Territórios Educativos: Produção de Conhecimento e Qualidade de Vida". # 6 # IV. Contribuições da Metodologia Das Produções Narrativas Para a Emergência do Novo Paradigma Ético-Político-Estético , uma estudante do terceiro período da Licena, sendo solicitado que narrasse sobre quais territórios educativos teriam sido os mais significativos em sua trajetória. A primeira entrevista narrativa tinha o objetivo de conhecer sua trajetória de vida, identificando as experiências que, segundo seu relato, tiveram maior importância sobre suas interpretações e rumos dos acontecimentos vividos. Estas experiências poderiam ser reconhecidas por meio da ênfase atribuída aos eventos ou desdobramentos provocados em sua trajetória. Após cada entrevista, a entrevistada redigia uma narrativa sobre os principais eventos presentes na entrevista e enviava para o grupo de pesquisadores. Esta narrativa era discutida pelo grupo de pesquisadores, que identificava os territórios educativos emergentes na narrativa de Melissa. A partir dessa discussão o grupo fazia observações e elaborava questões para ampliar e aprofundar na compreensão desses territórios e sua importância para a trajetória de Melissa. Além dessa orientação, as questões colocadas pelo grupo de pesquisa se orientavam por três critérios: (1) elucidação dialógica dos argumentos da estudante, (2) problematização das supostas contradições nos argumentos apresentados e (3) aprofundamento em torno de afirmações generalistas, ideológicas e/ou pouco claras. A partir dessas questões eram realizadas novas entrevistas que ampliavam os territórios educativos, seus participantes e situações relacionadas; ou aprofundavam em termos de detalhamento das narrativas nos territórios anteriormente mencionados. Com isso, esperava-se situar a narrativa em um dado contexto e apresentar os elementos semióticosmateriais constituintes desses territórios educativos. As narrativas produzidas entre Melissa e a equipe pesquisadora serão organizadas para evidenciar 5 O Projeto de Estudo Temático (PET) é uma atividade de pesquisa proposta pelos educadores da Licena para ser desenvolvida pelos estudantes do curso durante o Tempo Comunidade com o objetivo de aprofundar no conhecimento sobre uma temática a partir do levantamento de informações em seus territórios de origem. 6 Todos os nomes são fictícios para preservar a identidade da fonte. duas intenções da MPN na pesquisa. Por um lado, evidenciar como as sucessivas entrevistas, como espaço dialógico, permitiram expandir o universo vivido pela entrevistada e sua apropriação. Por outro, evidenciar o universo vivido da entrevistada e nele a presença do senso comum ético-político-estético na forma como Melissa, como integrante de movimentos sociais dialoga com seu meio. Assim, espera-se avaliar se a MPN pode contribuir para a emergência dessas epistemologias específicas que norteiam as práticas contra-hegemônicas dos movimentos camponeses e assim fortalecer as comunidades discursivas. Nesse sentido, as narrativas de Melissa em sua interação com a equipe de pesquisa trouxeram uma pluralidade de experiências relativas ao modo de vida camponês, delineado a partir de um envolvimento crescente com grupos sociais politicamente organizados, construídos em diferentes momentos: na condição de meeiros 7 V. # Modo de Vida Camponês e Suas Vicissitudes sem autonomia no desenvolvimento de sua produção agrícola; na conquista da terra e sua autonomia político-produtiva; no engajamento com movimentos sociais camponeses e étnico-raciais; nas diferentes experiências escolares enquanto camponesa; no processo de construção de uma identidade étnico-político-social; e na experiência universitária em um curso de Licenciatura em Educação do Campo, criado a partir das políticas de Educação do Campo, em sua articulação com movimentos sociais camponeses. Todos estes espaços foram considerados como Territórios Educativos referenciais em sua trajetória, alcançando assim a temática principal do PET. Essas vivências evidenciaram dois princípios fundamentais do movimento da Educação do Campo: a importância dos movimentos camponeses organizados para a emancipação dos sujeitos do campo, frequentemente encontrados em condições adversas no meio rural brasileiro; e a importância da educação de qualidade para fortalecer movimentos emancipatórios. Tais vivências serão caracterizadas a seguir. Na primeira entrevista realizada, Melissa narra sobre sua infância na roça, destacando uma infância "alegre e divertida" à qual associa a construção dos próprios brinquedos e brincadeiras em espaço aberto. A ênfase à essas brincadeiras durante a infância revela 7 Meeiros são trabalhadores rurais que estabelecem com o proprietário da terra um contrato de parceria a partir do qual deverá desenvolver atividades agrícolas em troca da cessão de metade da produção agrícola. Os movimentos camponeses compreendem que a terra tem uma função social e que deveria pertencer a quem nela trabalha. As parcerias são compreendidas, portanto, como uma forma de exploração de trabalho camponês. uma atribuição de valor a este modo de vida infantil no campo. Contudo, em seis páginas de sua primeira narrativa, utiliza apenas um parágrafo para descrevê-la. Nasci e fui criada na roça, quando pequena morávamos em uma propriedade que não era nossa, morávamos como meeiros, onde plantávamos na terra do patrão e o que colhíamos era dividido entre nós e ele. Minha infância foi uma infância muito alegre e divertida, como era filha única estava sempre brincando com meus primos e com os amigos que moravam por perto. Lembro bem de quando juntávamos penas, um pouco de pedrinhas pequenas, uma caixa de fósforos e algumas palhas de milho e construíamos a nossa peteca para poder brincar. Fazíamos também bola de meia para brincarmos de queimada, além disso, gostava de brincar de pique bandeira e pique esconde (MELISSA, 2018). O fato de ter se apresentado como "filha de agricultores familiares" e em seguida enfatizar sua origem na roça e a condição de meeiros despertou interesse na equipe de pesquisadores sobre como ela compreendia sua identidade a partir de sua experiência concreta. Assim, na segunda entrevista realizada, foi solicitado a Melissa que narrasse um pouco mais sobre como era a vida da família neste período, enquanto eram meeiros. Em sua segunda narrativa, portanto, ela amplia o texto. Nossa vida era bem simples: como morávamos de meeiros tudo o que produzíamos era dividido com o patrão. Meus pais trabalhavam e produziam na propriedade do dono. Lembro que era difícil pois a casa em que morávamos precisava sempre de reformas, mas o patrão nunca fazia nada, sempre tínhamos que dar um jeitinho para arrumar o que precisava. Recordo que meu pai tinha que plantar somente o que o patrão permitia, pois como o café era a principal fonte de renda, o patrão priorizava a plantação do café. E com isso meu pai não tinha liberdade de plantar o que ele queria e nem da forma como ele gostaria. Lembro também que meu pai cuidava das lavouras de café e reclamava muito, pois o patrão pedia que ele pulverizasse a lavoura com os fertilizantes, mas tudo isso sem a devida proteção e além disso meu pai nunca foi a favor de usar agrotóxicos nas plantações, mas como ele não era o proprietário ele precisava fazer o que o patrão pedia. Nossa maior vontade era de ter nossa propriedade, nossa casa própria e fazer nossas plantações do nosso jeito (MELISSA, 2018). A narrativa de Melissa, portanto, apresenta um detalhamento das condições de vida de sua família na condição de meeiros, revelando não apenas a falta de autonomia no trabalho de seus pais e o descaso com as condições de vida da família, mas um claro sentimento de injustiça em relação à exploração do trabalho de sua família por não possuírem a terra, materializado na repetição da denominação de "patrão". Estes elementos revelaram também um aspecto identitário em seu posicionamento, evidenciado na crítica ao uso de agrotóxico e de produzir "do nosso jeito", que no parágrafo vai caracterizar como "orgânico". Essa escolha está Year 2021 relacionada a uma preocupação com a terra e com a saúde da família, aspectos geralmente associados ao modo de vida da agricultura familiar camponesa. A mudança radical na trajetória familiar ocorre quando a família de Melissa compra um pedaço de terra em outra comunidade do mesmo município. Passei doze (12) anos da minha infância morando na comunidade Três Coqueiros. Depois desses doze anos de muito trabalho meus pais compraram um pedaço de terra em outra comunidade, chamada Córrego do Funil, também localizada na cidade de Simonésia. Nessa propriedade construímos nossa casa e nos mudamos. Nossa vida melhorou muito, hoje temos nossa própria terra, plantamos do nosso jeito orgânico, respeitando a terra e a nossa saúde, construímos novas amizades, temos uma boa relação com nossos vizinhos, temos uma casa boa para morar, do jeito que sempre planejamos. Decidimos mudar de comunidade pelo fato de que precisávamos ter nossa própria propriedade e nossa casa própria. E naquela época meu pai conseguiu negociar um preço acessível à terra em que moramos hoje, que é localizada na comunidade do Funil (MELISSA, 2018). Além dos desafios encontrados na escola nova também havia aqueles de estar morando em uma comunidade nova! Pois eram vizinhos novos, não tinha mais os amigos por perto e nem os familiares. Era como se tivesse que começar tudo de novo, novas relações, novas amizades, novas rotinas. Aos poucos eu e meus pais fomos nos adaptando à propriedade e à vizinhança, fomos construindo novas amizades, estruturando nossa propriedade e tudo foi se ajeitando. (MELISSA, 2018). Com o passar dos dias fomos plantando na terra, construindo nossa horta para a despesa da casa, criando os animais, plantando árvores frutíferas e nativas, plantas medicinais e ornamentais e com o tempo a propriedade foi se tornando o espelho da nossa dedicação e esforço (MELISSA, 2018). Sua narrativa revela o entusiasmo da mudança e o profundo sentimento de liberdade e realização propiciado pela conquista da terra e pela autonomia de trabalhar conforme seus princípios e crenças. Após as discussões e análises realizadas pela equipe de pesquisadores sobre o trecho da narrativa apresentado anteriormente, diversas questões surgiram, uma vez que este era um novo ponto de partida na trajetória de Melissa: Quais eram as novas rotinas? Como era a mudança de não proprietário para proprietário? Qual o impacto sobre a qualidade de vida da família? Tendo em vista os questionamentos realizados, Melissa acrescenta à sua segunda narrativa o trecho abaixo. A narrativa de Melissa, embora já apresentasse os pressupostos da nova narrativa, reforça sua relação identitária com o movimento camponês e acrescenta elementos históricos relevantes que caracterizam o acesso às políticas públicas para a agricultura familiar e sua importância para a sobrevivência e autonomia dos povos do campo. Em outras palavras, a narrativa ganha concretude ante à evidencia do impacto das políticas públicas que a família de Melissa teve acesso. Neste aspecto, é importante destacar que a vida no campo não é só terra, mas luta por melhores condições de vida. A historicidade dessa narrativa e sua relevância torna-se ainda mais evidente quando se considera que no atual governo o PAA foi extinto e são votados projetos de lei, a exemplo da PL 2.392/2020 sobre o PNAE que propõe a flexibilização da compra da compra de alimentos proveniente da agricultura familiar. Esta dimensão identitária, no caso de Melissa, se fortalece no entrelaçamento dos Territórios Educativos: a família, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Simonésia e os Movimentos Sociais: Meus pais me educaram me mostrando o valor da boa relação familiar, do respeito com os outros e comigo mesma. Sempre tivemos uma abertura muito grande para tratarmos de qualquer assunto, o que foi essencial para que tivéssemos uma boa relação. Sempre fui mais ligada com minha mãe, onde foi construída além da relação de mãe e filha, uma amizade incondicional. Minha mãe sempre foi meu suporte para a vida e também sempre esteve ao meu lado me apoiando com os estudos e me mostrando a importância de ter um trabalho e ser uma pessoa independente (MELISSA, 2018). Desde muito nova, senti muita a falta da presença da minha mãe, pois ela trabalhava no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Simonésia, começou participando das atividades que eram desenvolvidas com as mulheres pelo diretório de mulheres do Sindicato depois se associou e compôs o diretório de mulheres, com isso começou a participar dos movimentos sociais como, a Marcha Mundial das Joanas, Movimento dos Atingidos por Barragens, além é claro do Movimento Sindical. Então, com isso, fui crescendo e vendo a vida de militância dela e aprendendo também a importância dessa luta. Com o passar do tempo ela ocupou a cadeira de presidência do Sindicato, tornando a primeira mulher a ser presidente do mesmo. Nesse período, ela é eleita para tomar posse do diretório estadual de mulheres na CUT-MG (Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais), com isso a militância dela nos movimentos sociais se torna cada vez mais forte. Fazendo com que eu e meu pai também ingressássemos nessa luta, nos tornando então sócios do Sindicato e militantes dos movimentos sociais. A partir daí comecei também a andar com minhas próprias pernas e participar das ações dos movimentos de mulheres, dos agricultores familiares entre outros (MELISSA, 2018). Este trecho da narrativa de Melissa sobre sua família apresenta uma trajetória educativa construída nas relações estabelecidas nestes territórios onde os pais atuavam, independentemente de sua pouca escolaridade. A escolarização, as relações de respeito, a causa das mulheres, a militância são princípios que, segundo ela, norteiam seus passos. No histórico das atividades do Programa Extensionista Teia, desenvolvido na Universidade Federal de Viçosa (UFV), do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata de Minas Gerais (CTA-ZM) e do movimento agroecológico da UFV, os STRs têm uma participação constante e ativa nas discussões sobre a Educação do Campo, a agroecologia e a Agricultura Familiar (MARLIERE, 2018), incluindo o STR de Simonésia. O processo de construção destes conhecimentos está em curso há longa data na articulação entre essas instituições, alimentando práticas emancipatórias em seus territórios e movimentos pelas transformações sociais populares. A própria Licena, na qual Melissa passa a estudar, é um projeto resultante dessa construção conjunta entre universidade e movimentos sociais camponeses, consolidando e aprofundando uma perspectiva identitária e técnica em diálogo com o paradigma ético-político-estético de Santos (2011). A trajetória de Melissa também está relacionada a este histórico. Algumas questões colocadas nas duas entrevistas subsequentes trouxeram novos elementos à narrativa, ampliando a descrição do contexto de construção da trajetória familiar na militância junto aos movimentos sociais. Mas minha mãe já me levava a alguns encontros de mulheres que ela participava. A partir disso o Sindicato fez algumas parcerias com outros movimentos sociais, como o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) e MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens). Com isso minha mãe se faz presente nas lutas desses movimentos e começa a inserir eu e meu pai nessas ações, a partir de então é que começamos a participar dos movimentos sociais. Como minha mãe sempre me incentivou a aceitar e assumir meu cabelo afro, ela me insere no movimento negro, o qual faço parte até hoje. E é a partir da inserção da minha mãe no sindicato que minha família começa a vida nos movimentos sociais (MELISSA, 2018). Então, com isso, fui crescendo e vendo a vida de militância dela e aprendendo também a importância dessa luta. A partir das lutas vivenciadas nos movimentos sociais tivemos a oportunidade de estar sempre lutando pelos nossos direitos e pelo direito do outro. Tivemos oportunidade de sermos sujeitos ativos na busca de uma sociedade mais justa. Foi na luta com os movimentos sociais que aprendemos a sermos sujeitos pensantes e críticos. Que aprendi a me aceitar enquanto mulher, agricultora, negra e a fazer as pessoas me respeitarem como eu sou e não querer mudar meu jeito para caber nos padrões forçados da sociedade. Foi a partir dos movimentos sociais que eu e meus pais aprendemos a ser seres humanos melhores, a nos preocuparmos com os outros, a cobrar aquilo que nos é de direito. Posso dizer que os movimentos sociais foi a A última narrativa detalha o percurso da mãe junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais, a organização familiar e a constituição de sua própria identidade. Ao território educativo constituído na interlocução destes espaços atribui características distintivas em relação a "padrões forçados da sociedade", como a solidariedade e a militância em torno de direitos. Essa militância e seus respectivos direitos estão desenhados segundo o imbricamento das dimensões identitárias mobilizadas em seu percurso: a identidade de mulher agricultora negra. Observa-se, em uma primeira mirada sobre a narrativa de Melissa, a presença do princípio ético, orientado pela perspectiva do cuidado com o outro caracterizada pela solidariedade; político, pela participação ativa na defesa de direitos; e estético, caracterizado pelas dimensões da autoria e artefactualidade discursiva na constituição de territórios educativos nos quais grupos minoritários desenvolvem e se apropriam de estratégias de organização e formação. Outras dimensões de sua narrativa auxiliarão no reconhecimento desses princípios, como será visto a seguir. Em relação à sua escolaridade, Melissa tem uma trajetória peculiar em relação aos depoimentos de outras estudantes da Licena (SANTOS; SILVA, 2019; SANTOS; SILVA, 2020), pois apresenta uma formação contínua e sem grandes percalços, tendo iniciado seus estudos aos seis anos de idade. Demonstra que a escolarização é um valor familiar, que ela assume com "paixão". Estudante de sala multisseriada na escola da comunidade onde nasceu, apresenta uma visão crítica sobre a qualidade do ensino e das condições materiais. Não obstante, suas memórias são positivas sobre as relações estabelecidas com aos demais estudantes, caracterizadas pelo companheirismo, cuidado e proteção. Tais relações, além do pressuposto do interesse e curiosidade em relação aos estudantes mais velhos, são típicas das turmas multisseriadas. Aos seis anos de idade entrei na escola, uma escolinha da minha comunidade mesmo [...] chamada Escola Municipal João Faustino Alves Costa. A partir daí começou minha paixão pelos estudos, pois desde muito cedo minha mãe sempre falava da importância dos estudos para poder conquistar uma boa profissão. Era uma escola de estrutura pequena, mantida pela prefeitura local. Hoje consigo ver que o ensino era precário, mas naquela época era muito criança e não tinha visão crítica das coisas. Lembro que as turmas eram multisseriadas, onde em uma sala tínhamos três turmas de séries diferentes, em minha sala havia alunos da 2ª, 3ª e 4ª série, e somente uma professora em sala de aula. Recordo-me que a professora dividia o quadro em três para aplicar a matéria e ficávamos curiosos com as atividades passadas para os alunos das outras séries. Mas em meio tanto tumultuado havia também muito companheirismo entre os alunos, onde um ajudava o outro com as matérias e também com cuidado e proteção mesmo, pois éramos de idades diferentes, então sempre Year 2021 havia aquele amiguinho mais velho que cuidava do mais novo (MELISSA, 2018). Após avaliação do trecho referente à trajetória escolar pela equipe de pesquisa, surgiram algumas questões a partir desta primeira narrativa: quais os aspectos positivos e negativos vivenciados nessa escola? Como era a vivência entre você e os demais estudantes? E entre você e a professora? Quais outras lembranças você tem desse período? As vivências em uma sala do campo multisseriada contribuíram para a sua vida e formação em geral? O que você quis dizer quando relatou que o ensino da escola da comunidade era precário? Como você avalia essa precariedade? Hoje, a partir da sua experiência, como você avalia a formação desenvolvida nessa escola? Você acha que é necessário mudar práticas pedagógicas desenvolvidas em turmas multisseriadas? Continuando sua reflexão sobre a qualidade da educação nas escolas do campo, Melissa retoma as vantagens e os desafios das salas multisseriadas. A realidade da sala multisseriada alcança 60% das escolas do campo no Brasil (BRASIL, 2017). Como no Brasil, muitos países adotam as salas multisseriadas como uma opção economicamente viável para sua manutenção junto a pequenas comunidades (PARENTE, 2014). Contudo, diferentemente de outros países, a formação de professores para atuação em salas multisseriadas é muito limitada, sendo um dos desafios impostos ao movimento pela Educação do Campo. Em estudo realizado por Lage (2016) em escolas do campo de um município de médio porte no qual constava um curso de Pedagogia, nenhuma das pedagogas que atuavam nas onze escolas localizadas no meio rural haviam estudado sobre a educação do campo, quanto mais sobre atuação em salas multisseriadas. A adoção das salas multisseriadas, portanto, é orientada exclusivamente pela racionalidade econômica, sem a devida contrapartida para garantir uma educação de qualidade (AMARAL, 2021). Nesse sentido, a narrativa de Melissa apresenta-se como importante referência para discutir essa estratégia pedagógica, evidenciando, na articulação entre suas experiências e os aprendizados na Licena, as contribuições e os limites para a finalidade educativa. Hoje consigo ver que o ensino era precário, mas naquela época era muito criança e não tinha visão crítica das coisas. Digo isso pelo fato de que hoje consigo ver que o que era passado no ensino fundamental 1 não foi uma base suficiente para que eu pudesse aproveitar quando fiz a transferência de escola, pois a grade curricular da escola da cidade era mais aprofundada do que eu havia aprendido no fundamental 1 na escola do campo. Penso que as disciplinas aplicadas na escola [...] João Faustino Alves Costa eram trabalhadas de forma superficial e não tão aprofundada quanto nas escolas das cidades. Enquanto educanda da Licena, vejo que as metodologias usadas na escola eram como na maioria das escolas convencionais, onde o detentor do saber era o professor e o aluno é aquele que não é visto como um sujeito de muitos saberes, que está em sala de aula não para questionar, mas sim para ouvir e decorar todo o conteúdo que é aplicado em sala de aula, como cita Paulo Freire, uma Educação Bancária como na maioria das escolas convencionais. Penso que seja necessárias sim, mudanças nas práticas adotadas em turmas multisseriadas, pois os alunos ficam perdidos no conteúdo que é aplicado, o que atrapalha no seu desenvolvimento enquanto sujeito que busca aprimorar os seus conhecimentos, afetando também ou mesmo futuramente, quando inserido numa escola que tem como base a educação bancária e que exige do aluno um bom rendimento escolar. Além também de influenciar na visão do aluno em relação aos estudos, pois quando ele está nas turmas multisseriadas corre um grande risco do aluno perder o interesse nos estudos, pois ele não recebe a atenção necessária do professor para que ele tenha maior entendimento dos temas trabalhados em sala de aula, pelo fato de que o professor precisa se dividir para dar conta de passar todo o conteúdo necessário para todas as turmas, consequentemente o conteúdo abordado não é devidamente aplicado interferindo no conhecimento dos alunos. Além disso, tem também a sobrecarga dos professores que mediam as salas multisseriadas, pois há todo um desgaste psicológico e físico do profissional. O que também implica na saúde do mesmo [...]. A vivência a entre os estudantes era de companheirismo pelo fato de que, por haver estudantes de séries superiores à dos outros, muitos conteúdos que eram passados para alguns alunos os outros estudantes já tinham conhecimento daquele determinado conteúdo e ajudavam os educandos a entenderem o que era passado pela professora. O que era benéfico também para a própria professora, pois ela tinha o apoio dos estudantes mais velhos para que o conteúdo aplicado fosse mais bem entendido pelos alunos. As vivências em uma sala multisseriadas sem dúvidas contribuíram para minha formação enquanto pessoa, pois com isso foi possível compreender e respeitar as limitações de cada um, víamos de perto e aprendemos que era necessário o companheirismo entre os alunos, pois apesar de tudo, não era fácil ter em uma sala alunos de três séries diferentes, dividindo o mesmo quadro e com apenas uma professora. (MELISSA, 2018). Sua narrativa evidencia que a sala multisseriada não era uma estratégia pedagógica, mas uma condição com a qual a professora abordava utilizava práticas pedagógicas tradicionais, com prejuízo para o acesso aos conteúdos curriculares. Nessa condição, emergiam estratégias improvisadas de ajuda mútua entre os estudantes, o que Melissa reconhece como parte significativa de seu processo formativo, mas de maneira fortuita. Essa condição é compreendida por Melissa como uma sobrecarga de trabalho para o professor que assume simultaneamente três turmas. A ausência de formação e de acompanhamento docente dificultam a construção de estratégias de trabalho que maximizassem os aprendizados e diminuíssem o trabalho docente ao adotar uma lógica não-seriada. Hoje vejo que as escolas do campo são menos valorizadas do que as urbanas, fato que comprova isso é que nas escolas urbanas que estudei não vi nenhuma turma multisseriadas, mas na escola do campo sim, isso devido à falta de professores na escola, pois em uma escola que havia cinco turmas havia apenas duas ou três professoras. Mas apesar das dificuldades foi muito bom ter vivenciado essas experiências na escola do campo, pois ali construí muitas amizades, não sofria nenhum preconceito por ser quem eu era e por morar no campo. Aprendi a respeitar as diferenças e limitações de cada um, aprendi também a dar sempre o meu melhor nos estudos. Já nas escolas da cidade os problemas também existiam, pois tive que me adaptar a um ensino diferente do que era passado na escola do campo, as metas exigidas na escola da cidade também eram maiores. Diferente do campo, nas escolas urbanas se os alunos não alcançassem a média das notas ele seria reprovado, então isso também foi uma realidade nova que tive que me adaptar. Quando me inseri na escola da cidade senti muita falta do companheirismo que tínhamos na escola do campo, pois na cidade os alunos eram mais individualistas. Senti falta também das brincadeiras, pois as brincadeiras dos alunos da cidade eram diferentes das que costumava brincar quando estudava na escola do campo, como por exemplo, pique bandeira, queimada, pique esconde, etc. E na escola da cidade as brincadeiras não eram essas, os alunos sempre brincavam com os brinquedos que já tinham na escola, como futebol na quadra, escorregador, etc. (MELISSA, 2018). As questões colocadas para Melissa na segunda entrevista, provocaram reflexões que exigiram dela um esforço para a geração de uma síntese que não perdesse a densidade de informações trazidas por suas experiências. Nesse sentido, o confronto entre as escolas do campo e as escolas urbanas apresentam-se como contrapontos na experiência de Melissa em termos das condições escolares e oportunidades oferecidas aos estudantes. Em sua narrativa, Melissa ressalta que os mecanismos adotados pela escola urbana não favorecem a apropriação, pelos estudantes do campo, dos conteúdos curriculares. Por outro lado, as relações estabelecidas entre os estudantes de diferentes idades e pertencentes a uma mesma comunidade diferenciam-se significativamente do posicionamento mais individualista dos estudantes das escolas do meio urbano. A referência ao vivido presente na narrativa de Melissa evita a leitura dicotômica que romantiza a escola do campo e critica a escola urbana. Orientando-se por suas experiências, permitiu-se sintetizar aspectos considerados lacunares em sua formação enquanto estudante de escola precarizada no campo, a partir do que pôde vivenciar apenas quando foi para uma escola urbana; por outro lado, lembra-se dos aspectos positivos de suas experiências escolares no campo e sua influência sobre aspectos de sua identidade camponesa ou de estudante. A análise apresentada por Melissa apresenta sinergia com os princípios fundamentais do movimento da Educação do Campo, a saber a importância da educação de qualidade, a garantia de escolas presentes nas comunidades camponesas para garantir um ensino contextualizado e que preserve e fortaleça laços identitários. Mas nas escolas da cidade também foi possível construir novas amizades, as quais muitas ainda permanecem até os dias atuais, pude vivenciar experiências novas, pois foi a partir das escolas urbanas que tive meu primeiro contato com as novas tecnologias, o que foi uma oportunidade nova para conhecer outros horizontes, pois a partir dessas tecnologias foi possível inserir no mundo virtual, além de fazer as provas online do governo. E também passei a ter oportunidade de usar outros meios de estudo, através de pesquisas. Tive contato também com salas de informática, o que não existia nas escolas do campo, também foi na escola urbana que tive meu primeiro contato com uma biblioteca, o que também não tínhamos na escola do campo. O que a partir daí pude abranger mais a minha carga de conhecimento, pois adorava ler livros, o que influenciou muito na minha formação de visão de mundo. Como na escola do campo não havia biblioteca, os livros que tínhamos acesso eram os livros didáticos usados pelos professores e alguns livros extras que os professores achavam importante e levavam para que fizéssemos a leitura. Já na escola da cidade tive esse contato com a biblioteca, onde havia muitos livros de livre acesso, sempre que tínhamos horários livres, aproveitava para pegar algum livro para ler e algumas vezes a professora de Português aplicava a aula dentro da biblioteca para que conhecêssemos novos autores e para que pudéssemos praticar a leitura (MELISSA, 2018). Novamente a referência ao vivido na narrativa de Melissa apresenta a precariedade material das escolas do campo e a importância de uma infraestrutura básica para garantir a seus estudantes uma formação escolar adequada, uma possibilidade real de apropriação dos conteúdos civilizatórios para uma compreensão e participação instruída na sociedade. Por outro lado, evidencia que a constituição de uma identidade camponesa pode conviver com os espaços e sujeitos urbanos, superando uma perspectiva tradicionalista e conservadora que dicotomiza artificialmente essa relação. Apesar das peculiaridades do modo vida camponês em sua relação com a terra, seu diálogo com o urbano tem sido uma marca em seu cotidiano, seja pelo trânsito entre estes espaços, na escola ou no acesso ao mercado e serviços, seja pela presença de filhos jovens que vivem nas cidades e com os quais mantêm contato. A descrição de Melissa sobre sua chegada na escola urbana revela a ambiguidade entre o entusiasmo e o desencanto. Preconceito com sujeitos do campo e defasagem escolar são desafios que ela enfrentará. Essa escola localizada também era municipal [...]. Ali conheci um mundo novo, pois a estrutura da escola era muito maior, havia quadra para educação física, área de lazer para poder brincar, escorregador e tudo mais! Tinha um refeitório muito grande, a comida era diferente, havia também muitos professores para respectivas matérias e havia também muitas matérias, o que não tínhamos na escola rural. Era tudo novo até mesmo os desafios. Afinal, ao chegar à escola logo já fui rotulada como a menina negra da roça. O que para alguns alunos não era visto como uma coisa boa, mas para o bem da maioria, também tinha aqueles que isso não fazia diferença. O ensino em relação a primeira escola era diferenciado e a forma de avaliação era mais dura, tínhamos que alcançar a média senão éramos reprovados. Mas apesar de tudo, construí ali muitas amizades o que foi essencial para enfrentar toda aquela novidade que era estudar em uma escola localizada na cidade (MELISSA, 2018). Na segunda entrevista, buscamos saber mais sobre os desafios enfrentados por Melissa nessa escola, especialmente relacionados ao preconceito mencionado por ela e sobre as dificuldades em relação às experiências escolares e conteúdos curriculares. Em sua narrativa, Melissa destaca que As dificuldades vivenciadas ao me inserir em uma escola urbana foram muitas, pois os estudantes oriundos do campo eram vistos por muitos alunos como pessoas que vivem no atraso, ignorantes, que não sabem "falar direito". E isso pesava muito, pois era preciso provar todos os dias que isso não era verdade, que eu tinha a mesma capacidade que um aluno da cidade tinha. Recordo que em muitas situações em que lidava com questões que não estavam sob meu domínio, esse preconceito sobressaía. Muitas vezes devido ao período chuvoso, precisava ir para a escola a pé e chegava com os pés sujos de barro e logo na entrada da escola isso já era motivo de chacota para alguns alunos, além de alguns serviçais nos tratarem com indiferença, pelo fato de que nos julgavam por sujar a escola. Além disso, ao entrar em sala de aula, alguns alunos faziam piadas pelo fato de ter ido para escola a pé e chegado atrasada na aula. As dificuldades no período chuvoso eram muitas, pois tínhamos que nos esforçar muito durante o ano para alcançar a média do total das notas, pois sabíamos que quando chegasse o período de chuvas teríamos dificuldades para chegar à escola e isso atrapalharia no nosso aprendizado, pois muitas vezes chegávamos atrasados e em algumas semanas não conseguíamos ir à escola. Então era necessária uma dedicação maior aos estudos antes do período chuvoso (MELISSA, 2018). Também neste trecho, a descrição dos fatos ocorridos na escola evidencia a importância das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das Escolas do Campo 8 para uma educação igualitária, que reconheça o direito de uma educação de qualidade nas comunidades, que sejam respeitadas as diferenças culturais, que sejam abordadas temáticas contextualizadas, e que sejam acessíveis. Outra questão apontada por Melissa e que apresenta uma bandeira da Educação do Campo é a adequação do calendário escolar das escolas do campo, seja pelo período das colheitas, em que os estudantes ajudam suas famílias, ou em função do período das chuvas que, em função das condições precárias das estradas, impede a chegada dos estudantes às escolas No Ensino Médio, a escola que já era rigorosa torna-se ainda mais rígida. Segundo Melissa Aos quatorze, quinze anos mudei mais uma vez de escola, pois já ia fazer o ensino médio e na escola que estudava só havia o fundamental 2 (de 5ª a 8ª série), então transferi de escola, [...]. Não perdi muitas amizades, pois muitos dos amigos que estudavam comigo também foram transferidos para poderem cursar o ensino médio. Mas também conheci um mundo novo, pois o ensino nessa nova escola era mais rígido, foi onde passei a estudar as ciências da natureza (Biologia, Física e Química), novos professores, nova estrutura de escola. E também novos desafios, pois ali também havia a resistência de alguns alunos em relação àqueles alunos oriundos do campo, além disso, esse período foi o que eu passei a assumir o meu cabelo afro, então também tinha o preconceito de alguns estudantes em relação a isso. Mas, também havia as coisas boas de estudar ali, o ensino era melhor, pois se tinha um aprofundamento maior nas matérias aplicadas, também gostava de estudar as novas ciências, mais especificamente a Física e a Química. E também tinha uma relação mais amiga com os professores das respectivas matérias. Depois de quatro anos concluí o ensino médio e concorri ao ENEM. Foi onde através da indicação de uma amiga me matriculei no Licena e fui aprovada (MELISSA, 2018). Sobre a trajetória de Melissa no Ensino Médio, as perguntas dirigidas a ela buscavam esclarecer a forma como a família acompanhou esta etapa de sua escolarização, as diferenças entre as escolas, o tratamento recebido na escola e a trajetória escolar dos amigos. Em sua narrativa, Melissa apresenta, portanto, uma ampliação da narrativa anterior. Minha família me influenciou muito nesse período de transferência de escola. Viam que essa transferência era necessária e importante, pois eles sempre motivaram os meus estudos e me mostraram o quão importante era concluí-los. Mas eles também vivenciaram as minhas dificuldades ao entrar na escola [escola do Ensino Médio], pois foi o período em que assumo meu cabelo afro o que acarretou muitos constrangimentos vividos ali. Mas vivenciando essas situações tive todo o apoio dos familiares, pois eles sabiam que era preciso esse apoio, pois essa etapa de autorreconhecimento e de aceitação era de suma importância. Além disso, concluir o ensino médio era o principal objetivo para que eu pudesse me inserir na vida acadêmica. [...] tenho a percepção de que o ensino lá era mais rígido, pois muitas regras que na escola [dos anos finais do Ensino Fundamental] não eram cumpridas na [escola do Ensino Médio] era exigido que fosses cumpridas. E foi [na escola do Ensino Médio] que passei a estudar as ciências da natureza (Biologia, Física e Química), novos professores, nova estrutura de escola. [...] minha mãe sempre me incentivou a gostar do meu cabelo do jeito que ele era. Mas como muitos colegas de escola sempre faziam brincadeiras em relação ao meu cabelo, eu nunca tive vontade de assumir, pois meu cabelo sempre foi motivo de piadas racistas. Mas depois de entrar no movimento negro, o FOMENE (Fórum Mineiro de Entidades Negras de Minas Gerais), que é um grupo de entidades organizadas, com o intuito de combater as diversas formas de racismo e fortalecer a população negra [...] fui vendo as pessoas com os cabelos assumidos naturais e fui aprendendo que era preciso nos aceitar e nos reconhecer. Depois de muitas atividades no movimento e de muito incentivo tanto da minha mãe quanto de amigas que também faziam parte do movimento eu finalmente decidi assumir meu cabelo afro e enfrentar os comentários racistas e as piadas que faziam por ter cabelo afro (MELISSA, 2018). Na segunda narrativa, Melissa demonstra que o rigor escolar é considerado para ela um desafio importante que, seguindo as orientações de seus pais, apenas o sucesso escolar pode abrir-lhe possibilidades. Esta afirmação pode ser comum para sujeitos em condição de pobreza em relação a um sistema educacional tradicional, mas para Melissa, a partir de sua trajetória militante e popular, a educação formal é vista como uma oportunidade de conquistar sua independência profissional, articulada à identidade construída em sua trajetória de "mulher negra agricultora". Não se trata, portanto, de uma leitura individualista e meritocrática calcada no esforço pessoal. Melissa demonstra ter clareza da importância do princípio da escola de qualidade no campo para o desenvolvimento de suas capacidades de inserção, leitura e ação sobre o mundo vivido. Este trecho da narrativa evidencia que, essa dimensão formativa de Melissa busca dialogar com seu processo identitário em duas frentes: a militância e o conhecimento formal/acadêmico. Mais uma vez o paradigma éticopolítico-estético revela o modo peculiar dessa comunidade discursiva, agora ao pensar a educação na realização de um projeto de sociedade. Embora a narrativa da militância a partir de uma construção própria -ou seja, para além da participação junto à sua mãe -possa ser entendida como um território educativo autônomo, sua emergência no espaço escolar pode significar a ampliação de contatos e desenvolvimento de uma postura. Assim, se nos anos iniciais do Ensino Fundamental ela percebeu situações de preconceito com sua condição camponesa e negra e contemporizava, buscando sobressair-se por seu rendimento na escola, a assunção de sua identidade é a assunção da militância no espaço escolar do Ensino Médio. Afirmar-se como sujeito de conhecimento e como sujeito de direitos. Por isso, o ingresso na Licena é tão comemorado pela família e por ela, pois é a possibilidade de viabilizar a integração de diferentes experiências, militantes, populares e acadêmicas. O desempenho de Melissa na realização de sua narrativa permite também verificar que uma trajetória escolar em melhores condições favorece o desempenho acadêmico dos sujeitos do campo que acessam a universidade. As narrativas evidenciam, a partir deste estudo de caso, a precariedade e a potencialidade da educação do campo. A precariedade por tudo o que foi narrado sobre as escolas do campo em termos de estrutura e de formação de seus profissionais, o tratamento atribuído aos estudantes, preconceituoso na exata proporção de seu pertencimento a grupos minoritários. O direito à educação para Melissa potencializa suas ações enquanto sujeito oriundo das camadas populares e dos movimentos sociais. Sujeitos que trazem uma experiência capaz de reler e reorganizar os espaços formativos. Sua experiência traz referências à vocação ontológica do ser humano de "ser mais", conforme descreve Paulo Freire (2020) ao considerar que cada sujeito pode produzir conhecimentos, partindo de diferentes lugares e experiências, e que encontra na proposta pedagógica da Licena o amparo para o desenvolvimento de sua capacidade expressiva, construtiva e de sistematização. A pergunta que se pretende responder na próxima seção desse artigo é se a MPN pode ser considerada uma atividade pedagógica que traz contribuições para a Licena na realização desta proposta. # VI. Contribuições da Metodologia Das Produções Narrativas Como Atividade Pedagógica Para o Desenvolvimento de Uma Ética Emancipatória Ao término da exposição e algumas análises da narrativa de Melissa, essa seção do artigo avalia as possíveis contribuições da MPN como atividade pedagógica da Licena no que se refere à sistematização de suas experiências como sujeito, à produção de conhecimentos concretos sobre o modo de vida camponês e à identificação, neste modo de vida, de elementos do novo paradigma ético-políticoestético definido por Santos (2011). Tendo em vista tais objetivos, quando foram finalizadas as entrevistas narrativas, foi realizada uma entrevista semiestruturada com Melissa com o objetivo de avaliar a MPN como instrumento pedagógico e suas contribuições para ela como estudante da Licena. # ( G ) Global Journal of Human Social Science -Year 2021 comparações com hoje, que a gente não para pra fazer, a narrativa me possibilitou isso. E eu avalio como bom, foi muito bom, eu consegui buscar novos frutos. É possibilidades mesmo no dia a dia que a gente não para pra pensar como foi, e de como a gente vivencia. [Isso] ajuda a gente no aprendizado, na carga de aprendizagem da gente. [...] Tipo assim, a gente vai vivendo os dias da gente, e como a vida é muito corriqueira, né, igual, a minha participação nos movimentos sociais, eu nunca tinha parado pra em como isso contribui como um sujeito, perante a sociedade, de transformação [?] o quê que a vida nos movimentos sociais me proporcionou, de carga de aprendizagem, de lidar com as pessoas, de ter um pensamento crítico perante qualquer assunto que costuma ser dado pra gente, a gente para pra pensar "não, é assim, mas pode ser diferente?". Eu acho que é mais nessa visão crítica do mundo mesmo. [...] [A narrativa contribuiu] visando a educação do campo que também tá relacionada a isso, que busca aprofundar e olhar pro campo não como um lugar de atraso, mas como um lugar que a gente pode sim ter uma vida digna, porque a sociedade diz que não? eu vejo que a narrativa me mostrou isso, sabe. Olhar pro campo com esse olhar, que não é o atrasado, como a sociedade mostra, como é padronizado, que é sim um lugar de produção de conhecimento. [...] acho até que poderia ser também uma ferramenta de pesquisa da Licena, em algumas disciplinas. Acho que é muito similar ao PET também que é essa pesquisa mais profunda que a gente faz (MELISSA, 2018). As respostas de Melissa avaliam que a MPN traz contribuições para a releitura de sua trajetória de vida, identificando momentos e aspectos considerados relevantes para suas escolhas e seu aprendizado para a temática proposta pela entrevista. A reflexão produzida pelas narrativas ofereceu para Melissa indicadores relevantes quanto a seu percurso e identidade, possibilitando analisar sua inserção e seus propósitos em relação à forma como a sociedade se organiza e se impõe a seus integrantes. Identifica esse processo a uma visão crítica, uma leitura crítica na qual lê o mundo e pensa as possibilidades para fazê-lo diferente, com especial ênfase à sua condição de integrante de movimentos sociais. Neste movimento subjetivo revisita e ressignifica os princípios da Educação do Campo, reconhecendo-os em sua trajetória e reconhecendo-se como integrante de uma comunidade discursiva responsável por redesenhar para a sociedade sua compreensão sobre o que é o campo, não como lugar de "atraso", mas como "lugar de produção de conhecimento". As narrativas de Melissa trazem a experiência de um movimento social camponês que organizado que busca fazer frente às formas de regulação social orientados pelo paradigma moderno no qual o rural ocupa um lugar periférico e anacrônico. As experiências de Melissa evidenciadas por suas narrativas permitem compreender os efeitos desse paradigma sobre as comunidades camponesas no que diz respeito às lutas não apenas por direito, mas para a efetiva construção de condições dignas de vida por meio do acesso à terra e a uma educação de qualidade. Este movimento se organiza em frentes diversas para a realização de uma emancipação social por meio de um projeto de Campo e de sociedade ao qual se integra e se orienta a Educação do Campo. Vê-se, portanto, que a identidade de Melissa como mulher negra camponesa constitui-se na participação ativa com as comunidades discursivas que integra. O ato subjetivo de identificar-se -claramente uma subjetividade rebelde (SANTOS, 2007) -está estreitamente relacionado ao princípio solidário de envolver-se e transformar pela participação, pela produção e compartilhamento de um projeto emancipatório. A participação nos movimentos sociais de mulheres, da negritude, de camponeses estão presentes na forma de organização familiar, na sua participação como estudante secundarista, na participação de movimentos que constroem e viabilizam políticas públicas -como foi a criação da própria Licena -e inauguram formas autorais, discursivas e prazerosas de produção de conhecimento e de outros modos de vida. As narrativas de Melissa, portanto, demonstram que está em marcha o que Santos (2011) Apesar dos diálogos entre universidades e movimentos sociais camponeses na criação desses cursos, a construção desse processo formativo vem colocando muitos desafios para as universidades. O principal deles é que a matriz curricular dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo se utilize de metodologias que reconheçam a complexidade inerente aos contextos sócio-históricos de seus alunos (MOLINA, 2017). O presente artigo apresenta o resultado de uma pesquisa que utiliza a Metodologia das Produções Narrativas (MPN) como uma atividade pedagógica complementar ao Plano de Estudos Temáticos. O Plano de Estudos Temáticos é uma atividade curricular orientada por uma pesquisa desenvolvida pelos estudantes da Licena sobre um determinado tema relevante para sua formação, no caso em questão, a identificação dos territórios educativos em sua comunidade. A hipótese é que a MPN, ao realizar entrevistas narrativas com estudantes sobre temas relativos à sua trajetória de vida, poderia auxiliá-los no processo de reflexão sobre suas trajetórias camponesas e assim identificar aspectos concretos que permitam construir interpretações e o encadeamento de eventos micro e macro históricopolíticos. As entrevistas realizadas com uma estudante da Licena, Melissa, tiveram como referencial analítico o conhecimento-emancipação proposto por Santos (2011), compreendido como conhecimento produzido por movimentos sociais que, na oposição ao modo de produção capitalista, apresentam interpretações possíveis para um processo de transição paradigmática do pensamento moderno para um pensamento pósmoderno. Essas interpretações estão orientadas para a construção de um novo senso comum ético, político e estético, que têm como princípios fundamentais a solidariedade, a participação e o engajamento autoral. As narrativas produzidas por Melissa e a equipe pesquisadora tinham por objetivo evidenciar como as sucessivas entrevistas, como espaço dialógico, permitiriam expandir a compreensão do universo vivido pela entrevistada e sua apropriação; e evidenciar se a MPN pode identificar a emergência do senso comum ético-político-estético como universo vivido de Melissa e, assim, vir a fortalecer as comunidades discursivas enquanto prática educativa. Verificou-se que as narrativas de Melissa em sua interação com a equipe de pesquisa trouxeram uma pluralidade de experiências relativas ao modo de vida camponês, delineado a partir de um envolvimento crescente com movimentos sociais camponeses politicamente organizados. Sua narrativa parte de uma condição adversa na qual apresenta a si e sua família enquanto meeiros, sem autonomia no desenvolvimento de sua produção agrícola; o próximo passo foi a compra da terra e sua autonomia político-produtiva; a partir desse momento, relata o engajamento com movimentos sociais camponeses e étnico-raciais; suas experiências escolares também traz características coincidentes com os desafios enfrentados pela população camponesa, iniciando seus estudos em situações de precariedade, mas orientada por uma perspectiva comunitária e solidária; deslocando-se para uma escola urbana, na qual verifica as limitações de seu processo formativo e os preconceitos em relação à sua condição camponesa; a articulação entre sua identidade camponesa, militância política e estudante engajada, que vê na educação sua única possibilidade de sucesso profissional. Sua trajetória estudantilmilitante se desenvolve na Licena, espaço educacional no qual essa articulação é fomentada. A narrativa de Melissa apresenta de forma concreta e complexa o universo vivido por sujeitos do campo, evidenciando a importância de princípios defendidos pela Educação do Campo. Destacara-se, portanto, a importância dos movimentos camponeses organizados para a emancipação dos sujeitos do campo, frequentemente encontrados em condições adversas no meio rural brasileiro em função da dificuldade de acesso à terra e sua autonomia produtiva; a importância de uma educação de qualidade para ampliar as possibilidades de escolha de sujeitos do campo; as formas organizativas para além do paradigma moderno como possibilidades para a construção de vivências emancipatórias. Enquanto atividade educativa, a utilização da MPN contribuiu para o objetivo temático do PET, sendo que todos os espaços apresentados por Melissa foram caracterizados como Territórios Educativos referenciais em sua trajetória, permitindo-lhe explicitá-los, refletir e aprofundar sobre os mesmos, segundo seu próprio relato. Como atividade pedagógica, portanto, a Metodologia das Produções Narrativas está de acordo com a discussão sobre o lugar da educação na contemporaneidade, superando a falsa dicotomia entre o acesso ao conhecimento universal, as experiências subjetivas e o conhecimento silenciado de grupos minoritários. A superação dessa dicotomia está pressuposta não apenas nos princípios da narrativa, mas na teoria dos conhecimentos situados e, principalmente, na ética emancipatória de Santos (2011) ao fortalecer as experiências e necessidades dos alunos e de sua comunidade como possibilidade para o desenvolvimento dos sujeitos e de comunidades discursivas. A Teoria dos Conhecimentos Situados radicaliza esse pressuposto ao legitimar o existente, inserindo-o nos espaços dialógicos e sintetizando-o a partir do contato com outros saberes existentes. A partir dessas perspectivas, as produções narrativas do sujeito assumem esse movimento ao historicizar, ou seja, ao reconhecer as forças motrizes de seu contexto histórico, seus rumos e sujeitos. Contudo, pensar a Metodologia de Produções Narrativas como atividade pedagógica não pressupõe que ela deva ser utilizada isoladamente. A produção de narrativas com estudantes do campo poderia oferecer farto material sobre o contexto camponês, permitindo conhecê-lo em profundidade. Há práticas pedagógicas propostas pelas Licenciaturas em Educação do Campo calcadas no compartilhamento de experiências -como a Colocação em Comum -e no debate sobre as mesmas. As narrativas, como material sistematizado, poderia ser potencializado na sua articulação com estas práticas. Com isso, estariam mais aptos a propor ações para as melhorias que se fizerem necessárias nos territórios em que vivem, cumprindo um dos objetivos da Educação do Campo. No início dos anos 1980, Paulo Freire defende importância da criação de bibliotecas populares para o desenvolvimento de uma posição crítico-democrático de seus sujeitos, destacando os povos camponeses. Segundo ele, a construção de um acervo a partir do levantamento das histórias locais passariam a fazer parte daquelas comunidades, permitindo a seus sujeitos compreenderem a forma como se organizam as relações de poder e de transformação nos processos históricos. Serem sujeitos, não objetos da pesquisa. À medida que as pesquisas se ampliassem Nesse sentido, espera-se ainda que as narrativas possam se tornar material acessível e frutífero não apenas para as comunidades de onde partiram seus sujeitos, mas também para a formação de futuros professores para as escolas do campo. metodológicas e participativas orientadas pelosprincípios da educação popular, por outro, sãodesafiadas a desenvolver estratégias para mediaros processos de aprendizagem no diálogo entreconhecimentospopulareseconhecimentosacadêmicos e curriculares.Year 2021O Procampo, no entanto, não garantia acontinuidade destes cursos após o períodoestabelecido pelos editais, o que viria acontecersomente com o lançamento da Política Nacional deEducação do Campo (Pronacampo). A partir dasdiscussões com o GT, o Pronacampo estabeleceu ameta de formar 45 mil educadores do campo nos trêsprimeiros anos de sua vigência. Cabia às Instituições deEnsino Superior que aderiram ao programa definirem onúmero de vagas a serem oferecidas após esteperíodo. As vagas disponibilizadas para esses cursosdeveriam ser ocupadas prioritariamente por professoresdo campo e/ou integrantes dos movimentos sociais docampo (MOLINA; ANTUNES-ROCHA, 2014).A proposta das Licenciaturas em Educação doCampo orienta-se pela formação docente referenciadaPolítica Públicanaspráticaseducativasdesenvolvidaspelosespecífica para os povos do campo para dar suporte emovimentos camponeses, construindo um vínculo maisgarantir a formação de educadores que atuavam noorgânico entre as atividades escolares e as situações ecampo. A partir das reivindicações dos movimentos edemandas vividas por seus sujeitos concretosorganizações sociais camponesas vinculadas ao(CALDART, 2000). Essas licenciaturas são desafiadas,movimento da Educação do Campo, em 1998, éportanto, a construir este diálogo, de forma a garantir oinstituído o Programa Nacional de Educação naacesso aos conhecimentos formais necessários aosReforma Agrária (Pronera), destinado a ações deprofessores que atuarão nas escolas do campo, poreducação formal junto aos assentados da Reformaoutro, não desperdiçar as experiências produzidas peloAgrária (ESMERALDO et al, 2017). Além do Pronera, foimovimento da Educação do Campo e seus sujeitosinstituído, em 2005, o Projovem -Saberes da Terra,(SANTOS, 2007). Nesse sentido, se por um lado asdestinado à oferta de qualificação profissional eLicenciaturas em Educação do Campo se encontramescolarização aos jovens agricultores familiares de 18 aem um momento histórico importante, a partir da29 anos que não concluíram o Ensino Fundamentalconvivência com um acúmulo de experiências(SANTOS, 2017). Sua perspectiva, fundada na proposta de umaautoetnografia performativa (DENZIN, 2003), considera-e mesmo propõe -que as narrativas do entrevistadornão se separam das apresentadas pelos entrevistados,situando-se entre testemunhos e interpretações a partirde um dado momento histórico. Segundo ele, oautoetnógrafo performativo luta por colocar a cultura emmovimento, atribuindo-lhe dinamismo, ação e agência(DENZIN, 2003).A Metodologia das Produções Narrativas 4II.A Metodologia da ProduçãoNarrativa na Transição Para o NovoParadigma Ético-Político-EstéticoAs narrativas são instrumentos de pesquisaque ganharam destaque desde o início dos anos 1990emcorrentesteóricasquebuscavamumaprofundamento na realidade vivida por sujeitos,priorizando, portanto, estudos longitudinais. SegundoDenzin (2014), as narrativas apresentaram-se comouma alternativa metodológica promissora aospesquisadores frente às limitações atribuídas àaplicação do modelo das ciências naturais para asciências humanas. Segundo ele, as narrativas são umapossibilidade para demonstrar a intertextualidade entreo sujeito e a sociedade, considerando que o que sepode saber sobre a sociedade são as históriascontadas por seus integrantes e suas experiênciaspartilhadas nas narrativas. Enquanto o Estado pensava uma regulação jurídica para caracterizar a Agricultura Familiar em torno do tamanho da propriedade, a gestão produtiva e seu papel prioritário na economia familiar, os movimentos sociais camponeses viam para além desse público alvo, um projeto político e societário alternativo à perspectiva agroindustrial no campo. A MPN foi criada pelo Grupo Fractalidades en Investigación Social, da Universidade Autónoma de Barcelona, como metodologia de pesquisa para levantar e fortalecer trajetórias de feministas e mulheres migrantes no contexto espanhol. A Metodologia das Produções Narrativas na Formação de Educadores do Campo: Educação Emancipatória na Construção de Um Novo Paradigma Ético-Político-Estético © 2021 Global Journals A Metodologia das Produções Narrativas na Formação de Educadores do Campo: Educação Emancipatória na Construção de Um Novo Paradigma Ético-Político-Estético © 2021 Global Journals A Metodologia das Produções Narrativas na Formação de Educadores do Campo: Educação Emancipatória na Construção de Um Novo Paradigma Ético-Político-Estético * Escolas rurais do município de Viçosa-Minas Gerais: Memórias, políticas e práticas ArleneAmaral PaulaDe Lopes Rio de Janeiro, PPGE/UFRJ, 2021. (Tese de doutorado * Antonio & Lucini E Aprender Na Educação DoEnsinar Campo Processos Históricos E Pedagógicos Em Relação, In Cad. Cedes, Campinas essos Históricos E Pedagógicos Em Relação, In Cad. Cedes, Campinas 2007 27 * Una propuesta metodológica desde la epistemología de los conocimientos situados. 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