# Questões de Método s Origens do Totalitarismo foi publicado em 1951. Este grande livro na verdade é constituído por três livros, cuja densidade conceitual e histórica pode ser lida independentemente dos demais. Ao mesmo tempo, os três livros são articulados, e a questão que passa então a ser objeto de discussão é como encadeá-los em um todo explicativo. E, enfim, se, do ponto de vista metodológico, há um princípio comum que unifica a perspectiva de Arendt nas OT. Dado os limites do presente texto, em relação à primeira tarefa, explorarei somente o livro 1 sobre o anti-semitismo. Já para a segunda, de que passo a me ocupar agora, tentarei discernir a questão do método que envolve a obra, procurando, em seguida, encontrar no livro 1 sua evidência explicativa. No Prefácio do livro nós encontramos as clássicas perguntas do historiador: "O que se passou? Por que isto se passou? Como isto foi possível?" (ARENDT, 2002a, p. 8). As perguntas do historiador ocorreram quando a Alemanha atinge o "ponto zero" da sua história, isto é, quando um novo 'regime de historicidade' passa a estar em "disputa". Esta noção de "regime de historicidade", que retomo de François Hartog (Hartog, 2014), recobre aspectos conceituais e históricos na obra de Arendt, e em alguns textos nós encontramos explicados a relevância metodológica desta perspectiva. Arendt envereda pela consideração do primado que o evento histórico tem para a historiografia: a história somente se mostra através dos seus momentos inaugurais, "de aceleração do agora". O que significa que a "novidade é o reino do historiador, que -ao contrário do cientista natural, que se interessa por factos regular e permanentemente recorrentes -se consagra a factos que ocorrem sempre uma só vez. Esta novidade pode ser distorcida se o historiador, invocando a causalidade, se pretender capaz de explicar os acontecimentos por meio de um encadeamento de causas que os teriam produzidos." (Arendt, 2001, p. 246) Reconhece, portanto, no evento histórico, uma singularidade que ultrapassa os fatores determinantes que o teriam condicionado, como evoca com recorrência, por exemplo, a disparidade entre a causa e os efeitos desencadeados da Primeira Guerra Mundial 1 Nós podemos agora tentar interrogar de que modo nomear este interregno situado entre o início do passado e o acontecimento final na obra as OT. Na obra que compõe o sugestivo título a este respeito, Entre o Passado e o Futuro, Arendt nomeia este intervalo . Esta recusa da ideia de causa não significa, todavia, que o acontecimento se encontre disperso na história. Isto é, ao mesmo tempo, Arendt considera que o evento histórico ilumina retrospectivamente o que ocorreu. "É o acontecimento que esclarece o seu próprio passado, e não pode nunca ser deduzido dele" (Idem, p. 246), de modo que o passado só chega plenamente a existência quando o acontecimento se produz. Trata-se de um método ex post fact de investigação: desde que o evento em questão é suficientemente importante para lançar luz sobre seu próprio passado, a história torna-se começo. (Idem, p. 246 ), de modo que somente então se estabelece uma história que pode ser narrada porque possui um início e um fim. Isto é, o próprio passado passa a ter um começo, de tal modo que um começo do passado que permanecia até então escondido aos olhos do historiador finalmente veio à luz. Enfim, o acontecimento se torna o fim, telos, deste começo recém descoberto pelo historiador. O acontecimento é o fim e o culminar de um processo que ocorreu, "um chegar no tempo", como diz Arendt. 1 1 Para a 1ª Guerra Mundial como divisor de águas do regime de historicidade contemporâneo, ver H. Arendt, Sobre a Revolução, São Paulo, Cia das Letras, 2011, pp. 35-47. Foi não somente a desintegração dos Impérios Continentais que veio à luz, como o Austro-húngaro e sua Monarquia Dual, mas também as Revoluções Alemãs, Húngara e Insurreição em Viena, derrotadas, e a Revolução Russa, vitoriosa, mas cuja conexão explosiva foi finalmente sucedida pela estabilização da Revolução em um só país, no famoso Outubro Alemão que não veio. A crença dos bolcheviques se defrontava com as fronteiras das trincheiras da própria guerra com a Alemanha, e quando sobreveio o declínio do II Império Alemão, "a socialdemocracia alemã não se entusiasmara com a ideia de uma revolução". Cf. Daniel Arãao Reis, A Revolução Russa -1917-1921 Por outro lado, indo além da poeira ideológica dos acontecimentos, uma perspectiva de "longa duração histórica" pode ser situada entre a Revolução e os Totalitarismos do século XX. Ou seja, os fios da obra são reatados do início ao fim se nós considerarmos a influência desencadeada pela Revolução Francesa e as Conquistas Napoleônicas nas formações nacionais retardatárias por meio do estudo das ideologias políticas no quadro da inserção da formação nacional alemã, e também russa, no contexto europeu. Entre os dois acontecimentos que assinalam a marcação histórica e conceitual das OT, nós temos um interregno histórico que corresponde ao problema Nacional na esfera ideológica. Duas pontas deste processo histórico são postas: de um lado o conceito revolucionário de igualdade criado pela Revolução Francesa, e, de outro, os Imperialismos Continentais que desencadearam a Primeira Guerra Mundial. Fatores de longa duração históricos que se encontram associados aos desdobramentos da Era da Revolução Francesa na Europa. Arendt não menciona jamais a ideia de atraso histórico em Marx, isto é, o descompasso comparativo das Nações Continentais relativamente ao Estado Nacional na França após a Revolução, ponto que já retomaremos. Todavia, sua narrativa acerca da longa duração histórica das ideologias políticas de matriz racista dos Impérios Europeus que colapsaram com a Primeira Guerra Mundial, divisor de águas do regime de historicidade contemporâneo, introduz metodologicamente este ponto de vista, ponto de vista este que opera em diferentes regimes discursivos e ideológicos na obra. Se não estivermos equivocados, esta ênfase na análise do Totalitarismo a partir das Ideologias de "longa duração" dos Impérios Continentais Atrasados após a Revolução Francesa, coloca as OT na mesma perspectiva dos trabalhos de Gramsci sobre a "revolução passiva" e a "via prussiana" nas Nações que foram modernizadas pelo alto por meio da aliança entre os Intelectuais e o Estado diante de uma sociedade civil fraca. Ambos os autores põem ênfase no peso das sedimentações ideológicas do passado político europeu por meio de uma espécie de sociologia histórica e comparativa entre diferentes Nações, valorizando na esfera ideológica o meio de explicação das origens dos fascismos contemporâneos das Nações que sofreram o abalo da Revolução Francesa. Para o filósofo italiano, na "Alemanha, como a Itália, foi a sede de uma instituição e de uma ideologia universalista, supranacional (Sacro Império Romano da Nação Alemã), e forneceu uma certa quantidade de quadros à cosmópole medieval, depauperando as próprias energias internas e provocando lutas que desviavam dos problemas da organização nacional e mantinham a desagregação territorial da Idade Média. O desenvolvimento industrial ocorreu sob um invólucro semifeudal, que durou até novembro de 1918, e os junker mantiveram uma supremacia político-intelectual bem maior do que a mantida pelo mesmo grupo inglês. Eles foram os intelectual tradicionais dos industriais alemães, mas com privilégios especiais e com uma forte consciência de ser um grupo social independente, baseada no fato de que detinham um notável poder econômico sobre a terra, mais 'produtiva' do que na Inglaterra. Os junkers prussianos asemelham-se a uma casta sacerdotalmilitar, que possui um quase monopólio das funções diretivo-organizativas na sociedade política, mas que dispõe ao mesmo tempo de uma base econômica própria e não depende exclusivamente da liberalidade do grupo econômico dominante. Além disso, diferentemente dos nobres agrários ingleses, os junkers constituíram a oficialidade de um grande exército permanente, o que lhes fornecia sólidos quadros organizativos, favoráveis à conservação do espírito de grupo e do monopólio político." (Gramsci, 2010, p. 29). Tanto quanto Arendt, Gramsci põe em evidência na Alemanha e na Itália (sede do papado, unificação tardia, desagregação territorial, etc) a existência de uma Ideologia Universal, espécie de sobrevivência política que ganhou novos esteios com as guerras napoleônicas e o fim do I Império após a Revolução Francesa. Para Gramsci foram os junkers que mantiveram a hegemonia político intelectual na Alemanha, intelectuais tradicionais dos Industriais Alemães após a Unificação, espécie de casta sacerdotal e militar que possui base econômica e que dispunha de funções diretivas na sociedade. Em Arendt, os contornos desta ideologia política são forjados com o fim do I Império durante as invasões napoleônicas, espécie de antítese da herança do Estado-Nação Moderno fundado pela Revolução Francesa. É no pangermanismo que nossa autora apreende a história dos fantasmas políticos alemães. Na "Alemanha, o pensamento racial se desenvolveu somente após a derrota do velho Exército Prussiano diante de Napoleão. Seu desenvolvimento decorreu dos patriotas prussianos e do romantismo político muito mais do que da Nobreza e de seus porta-vozes. Diferente do movimento racial francês que visava a desencadear a guerra civil e a fazer explodir a Nação, o pensamento racial alemão foi inventado por meio de um esforço para unir o povo contra toda dominação estrangeira. Seus autores não procuravam aliados além das fronteiras; eles queriam revelar no povo a consciência de uma origem comum." 4 Este pensamento racial nascido como Reação à Revolução após a Revolução Francesa depois da derrota do I Império Alemão, será reconsiderado dentro de um outro "regime de historicidade" nos capítulos seguintes das OT. Isto é, no registro histórico da reconstituição da ideologia dos Imperialismos Continentais no Pan-eslavismo e no Pan-germanismo nos quais nós podemos encontrar as origens tanto do Nazismo quanto do Estalinismo. Arendt encontrará após 1871, portanto, após o II Império Alemão, no pangermanismo e do pan-eslavismo as duas ideologias que deram origem aos movimentos de massa das nacionalidades que visavam sua integração nos Impérios Continentais em expansão. O que significa que, se considerarmos as OT sob esta perspectiva de conjunto nas quais as formações nacionais alemãs e russa vem à luz, é muito mais no conceito de Imperialismo enquanto nexo entre espaço geográfico e relações de poder que nós encontramos a chave explicativa de Arendt para o desenvolvimento histórico que gerou os Totalitarismos Contemporâneos. Certo, entre o Imperialismo e o Totalitarismo nós encontramos uma distinção terminológica, já que, por exemplo, o Imperialismo Clássico resultante da exportação de capital supérfluo e mão de obra supérflua não gerou um modo totalitário de governo nestes países. Todavia, sem o Pangermanismo e o Panesvalismo nós não podemos compreender o surgimento do III Reich e do Stalinismo. Tudo se passa como se após a decadência destes dois Impérios após a Primeira Guerra Mundial, a conjuntura social e política que deu nascimento a estas duas Ideologias reacionárias houvesse se reproduzido em toda a atmosfera do Entre-Guerras. Em resumo, considerado no seu conjunto, a estrutura comparativa França-Alemanha funciona como um contraponto que organiza não somente o conjunto da obra naquilo que concerne a gênese explicativa das origens do Totalitarismos, na medida em que inscreve a relação Alemanha e Rússia dentre de uma gênese histórica e ideológica particular enquanto duas Nações que sofreram o abalo da França Pós-Revolucionária, quanto nos permite contestar o método de homologias comparativas entre os dois regimes sob a pluma do conceito de "forma de governo", como será o caso no capítulo IV do livro 3. (Arendt, 2002) Nesta ótica, os termos nos quais se põe a comparação entre o Nazismo e o Estalinismo a partir do conceito de forma de governo se modifica, como em IT 5 . Raça e Classe não são mais as "Ideologias Totalitárias" que são colocadas em relação de correspondência, fundamento a partir do qual Arendt pôde comparar os conceitos de luta de classes e luta de raças quando apreende o Totalitarismo como forma de governo no capítulo IT (Arendt, 2002, p. 287). A "Ideologia Totalitária" se chama Racismo: "Bem mais que o pensamento de classe, é o pensamento racial que não cessou de planar como uma sombra embaixo do desenvolvimento do concerto das nações europeias, para se tornar finalmente a arma terrível de destruição das nações. Do ponto de vista histórico, os racistas detém um registro de patriotismo pior que aqueles que sustentam todas as outros ideologias em conjunto, e eles foram os únicos a negar incessantemente o grande princípio sobre o qual foram edificados as organizações nacionais dos povos: o princípio de igualdade e solidariedade de todos os povos, garantido pela ideia de humanidade." (Arendt, 2002a, p. 80) Arendt reconstrói a ideologia da Raça com o objetivo de mostrar sua conjugação histórica ulterior com o Imperialismo Continental dos Estados Atrasados, e a "ideologia da luta de classes" mencionada no capítulo IV do livro 3 corresponde não a Marx, mas ao Paneslavismo, uma mudança de perspectiva evidente entre a gênese explicativa da obra e seu ulterior resumo explicativo sob a pluma do conceito de forma de governo. Por fim, esta inscrição das Ideologias Totalitárias nas Ideologias Racistas dos Estados Nações atrasados no contexto da França Pós-Revolucionária 6 É o caso de verificarmos agora como esta perspectiva acerca dos fantasmas políticos alemães, para Marx, funciona na explicação de Arendt sobre a , do ponto de vista da reconstrução metodológica da obra, nos permite rearticular a história conceitual de Arendt com a tese acerca do anacronismo alemão do jovem Marx Pensando bem, a discussão sobre as ambiguidades da emancipação do Judeus em relação 9 Marx afirma em A Questão Judaica: "A cisão do homem em público e privado, o deslocamento da religião do Estado para a sociedade burguesa, não constitui um estágio, e sim a realização plena da emancipação política, a qual, portanto, não anula nem busca anular a religiosidade real do homem." op. cit. pp. Se compreendo bem Arendt, a dupla consciência do judeu recobre esta cisão em contexto de atraso, onde os limites da distinção são esfumados. H. Arendt, op. cit. p. P. Gilroy desenvolve esta análise da dupla consciência no estudo dos negros no período pós-emancipatório da escravidão nos EUA a partir de Du Bois, cujo resumo segue: "Todos sentem alguma vez sua dualidade -um lado americano, um lado negro; duas almas, dois pensamentos, dois esforços inconciliáveis; dois ideais em guerra em um só corpo escuro, cuja forca tenaz é apenas o que a impede de se dilacerar." Atlântico Negro, Modernidade e dupla consciência, SP, Ed. 34, p. 248. ao Estado retoma a discussão de Marx sobre os limites da emancipação política dos Judeus, e de toda emancipação política em geral, do mesmo modo que os capítulos consagrados a discriminação dos Judeus na sociedade discute os limites de toda emancipação social advinda pelo privilégio. Esta associação entre os dois autores é importante, porque a análise de Arendt sobre "a questão judaica" passa a funcionar como uma "prolongação" da hipótese de Marx da situação do judeu no contexto de "atraso" 10 Em primeiro lugar, para a questão judaica, a questão comum concerne a crítica da emancipação dos judeus na Alemanha, onde a chave explicativa da questão judaica é a considerada tomando em conta a relação do judeu com o Estado, como já salientado. Na Alemanha o Estado ainda não se emancipou politicamente, é um Estado "atrasado", carregado pelos vestígios do ancien regime europeu encarnados no I Reich "Alemão". Trata-se de um Estado que ainda não se emancipou politicamente, incapaz de tratar o judeu como cidadão. (Marx, 2010, p. 35) A análise comparativa de Marx é retomada por Arendt, em um primeiro plano, no entendimento do significado da emancipação política dos Judeus na Revolução Francesa. "Era necessário abolir as restrições aos direitos dos Judeus e a seus privilégios ao mesmo tempo que as outras liberdades e direitos particulares." (Arendt, 2002c, p. 33) Esta emancipação é acompanhada pelo desenvolvimento de um Estado independente, acima das classes sociais, capaz de assegurar a unidade nacional. Só que para o desenvolvimento do Estado-Nação, o crédito Judeu foi fundamental, praticados já em grande escala pelos Judeus para Nobreza. De modo que o Judeu do Crédito passou a desfrutar de privilégios do Estado em razão da dívida pública adquirida pelo Estado. O que significa que a emancipação política dos Judeus plenamente acordada no século XIX foi ambígua porque, de um lado, ela se inscrevia na estrutura . Naturalmente que identificá-los sob a perspectiva de uma prolongação da análise de Arendt daquela de Marx não significa que estejamos apagando a irredutibilidade de cada ponto de vista histórico acerca da questão judaica na Alemanha, mas somente chamando atenção para aquilo que há de comum entre as duas análises, e como, sob o fundo desta aproximação, os fios histórico-políticos que articulam os demais livros das OT são melhor compreendidos. política e jurídica de um corpo político que funcionava a partir da igualdade política e jurídica. Mas de outro lado, esta emancipação foi acompanhada de privilégios específicos acordados aos Judeus ricos. Significou, portanto, a igualdade e o privilégio, a destruição da antiga comunidade judia, e, ao mesmo tempo, a conservação dos Judeus enquanto grupo fora da sociedade pela relações de privilégio com o Estado. Na sua argumentação, Arendt estende esta situação ambígua dos judeus ao conjunto da sociedade, isto é, os limites da emancipação política dos judeus são os limites da emancipação política da sociedade moderna: "A igualdade de condições, no sentido onde os Jacobinos a entenderam durante a Revolução Francesa, somente se tornou uma realidade na América, enquanto que na Europa foi substituída imediatamente por uma igualdade da pura forma, a igualdade diante da lei." (Arendt, 2002c, p. 35) A proximidade com a análise de Marx em Sobre a questão judaica é evidente, pois referencia esta insuficiência da emancipação política nas desigualdades sociais das sociedades burguesas. "As inultrapassáveis desigualdades sociais, e o fato que um indivíduo, sobre o continente Europeu, e até a Primeira Guerra Mundial, pertencia a uma classe quase pelo direito de nascimento, era incompatível com a igualdade política." (Arendt, 2002c, p. 36). Contudo, a inscrição do Judeu na divisão entre Estado e sociedade civil burguesa é somente metodológica, porque factualmente os Judeus não pertencem à estrutura de classes das sociedades modernas com seu desenvolvimento capitalista, pois são um grupo à parte. Nas OT, Arendt explica que os judeus se definem como judeus, e não pela sua relação com outras classes da sociedade, e a proteção social que eles receberam decorre da sua relação com o Estado e os serviços que os impediam de aceder ao sistema de classes. Daí sua condição similar à da Nobreza, classe por excelência expressão do atraso. E daí também o porque da autora tratar do problema da emancipação social dos Judeus tomando em conta a esfera ideológica da Bildung, dada sua hegemonia sob o impacto da cultura da aufklarung na "miséria alemã". Esta relação de privilégio com o Estado se exponenciou após a Revolução Francesa, de modo que no século XVIII nas principais centros capitalistas europeus os judeus foram emancipados ao mesmo tempo que se tornaram os grandes credores do Estado 11 11 Esta marcação da história dos Judeus na Revolução Francesa é importante também porque em relação a ela Arendt apreende a ausência de emancipação política dos Judeus nos países atrasados socialmente e onde os judeus não eram um grupo capaz de 13 Nas condições de atraso político, em que a Nação ainda não é definida, importando somente a esfera da cultura e da hegemonia intelectual, vicejou um discurso anti-semita em resposta ao Édito de 1812 dos "reformadores" proveniente de uma aristocracia que passou a atacar os Judeus como grupo privilegiado. Decorre, portanto, da Reação no contexto das guerras napoleônicas, quando as revoluções pelo alto procuravam dar luz a uma nova hegemonia cultural após o abalo representado pela Revolução. Isto é, na explicação de Arendt, cujo parentesco com a de Gramsci me parece crucial, a origem do anti-semitismo moderno como ideologia política deve ser creditada na Aristocracia, que passou a atacar abertamente o Estado Nacional que tratava todos em condição de igualdade. O ataque dirigido ao Estado se voltada ao Judeu ao mesmo tempo; conjuntamente, os valores de classe Isto é, nesta Prússia influenciada pelo espírito das Luzes, em que pese os limites da emancipação, ao judeu era reconhecido as melhores condições de vida e de instrução em um Estado de uma administração burocrática que não tolerava mais privilégios e distinções. Volume XXI Issue XII Version I A média eram rejeitados ao mesmo tempo que o discurso dos reformadores. No contexto da Reação após o Congresso de Viena, a Santa Aliança tonifica a nobreza prussiana que passa a emplacar uma discriminação contra os Judeus, cujo apogeu será a introdução da distinção entre Judeus aceitos e aqueles que não o eram. O relevo cristão do Estado, analisa Arendt, associado ao Congresso de Viena que verteu à Prússia as províncias habitadas por massas judaicas de pobres, nunca conseguiu tratar com igualdade os judeus. Caridoso com os Judeus ricos, o Estado cristão podia discriminar socialmente a inteligência judaica e as massas judaicas. Isto é, seguindo o nexo histórico de Arendt, o anti-semitismo é essencialmente um fenômeno da aristocracia que se opôs à formação de um Estado Nação na Alemanha que pudesse tratar com igualdade os Judeus. Não é outra a referência de Arendt senão a de Friedrich Engels, que observou que "um dia que os protagonistas do anti-semitismo de sua época eram os aristocratas, a ralé pequeno-burguesa desencadeada jogando o papel do coração. Nós podemos dizer também, continua Arendt, que foi assim na Alemanha, com os cristão-sociais da Austria e os anti-dreyfus francês. Em cada caso, a aristocracia levava um luta desesperada e procurava a se aliar às forças conservadoras da Igreja: a Igreja católica na Austria e na França, a Igreja protestante na Alemanha, sob o pretexto de combater o liberalismo com as armas do cristinianismo." (Arendt, 2002c, p. 76) O terreno da agitação dos discursos antisemitas adquiriu status de ideologia política quando dos movimentos pangermanistas que mobilizaram a opinião pública contra o Império Austro-Húngaro, pois reinvindicavam a união da nacionalidade alemã sob base do extermínio dos judeus e dos eslavos. E uma nova marcação histórica é posta: não mais o Edito de 1812 no contexto da ocupação napoleônica, mas após a fundação do Reich Alemão e o krach financeiro de 1873, quando os slogans anti-semitas se tornaram moeda corrente nas regiões atrasadas, até se tornarem uma ideologia política de alcance universal quando a condição de miséria das províncias alemãs se expandiu às grandes cidades com a crise do entre-guerras 14 . Os discursos anti-semitas proliferaram em condições de atraso radical, o que prova, agora seguindo o raciocínio sociológico de Nobert Elias, que os códigos dos príncipes e das classes aristocráticas que afirmavam a característica desigual se sobrepuseram ao igualitarismo proveniente da Revolução Francesa. 15 V. Bildung Judaica e as Dificuldades da # Emancipação Social Esta apreensão do anti-semitismo nas regiões atrasadas, mas no entanto iluminadas pelos reformadores que aspiravam a emancipação política dos judeus, tudo no espírito das Luzes e da educação do gênero humano, serve igualmente de baliza teórica à crítica de Arendt da emancipação social dos judeus. Neste ponto, Arendt desenvolve o conceito de emancipação social com um vigor teórico que ultrapassa A Questão Judaica de Marx, mesmo que, insisto, os pressupostos de Marx sejam constantemente repostos pela autora, como a distinção entre Estado e sociedade civil, enfim, a discussão sobre a ausência de direitos humanos dos judeus na Alemanha. O cenário de Arendt para apreender esta descrição da situação social dos judeus é Berlim, capital de um Estado atrasado, onde os judeus gozavam dos direitos humanos, mesmo que ao preço de severas restrições às massas judaicas. Nathan, O sábio, de Lessing, torna-se emblemático a este respeito, pois proclama os direitos humanos para os judeus por meio da Revolução Francesa, verdadeiro libelo em favor da tolerância religiosa. (Arendt, p. 188, EJ) Do paradoxo da igualdade e do privilégio diante do Estado, isto é, do reconhecimento da igualdade diante da lei em um Estado separado da sociedade civil, e do privilégio ao capital financeiro que tornava possível a abstração Estado, Arendt vai questionar as insuficiências da emancipação social do judeus. A forma política é posta em questão pelo conteúdo social. O nó do argumento é que a assmilação do judeus à sociedade foi conferida aos judeus na qualidade de indivíduos excepcionais em relação as massas judaicas. O que significa que em face da igualdade econômica, política e jurídica dos judeus a sociedade reagiu sob base do fato de que a assimilação dos judeus, o reconhecimento da sua igualdade social somente fosse concedido a casos excepcionais. Estabelecer relações com a sociedade significava "ser e não ser-judeu", isto é, renunciar uma religião discriminada socialmente, e se fazer aceitar na qualidade "excepcional" de um indivíduo extremamente educado, resultado que seria encarnado pelos intelectuais judeus. Um fenômeno de dupla consciência torna-se aqui manifesto, expressão da renúncia pública do judaísmo e sua exacerbação na esfera privada, expressão esta da própria cisão do homem na sociedade burguesa, entre indivíduo privado e cidadão. Nesta tessitura social os partidários da emancipação dos judeus consideravam que seria através da educação que os judeus seriam integrados na sociedade, raciocínio idêntico para os não-judeus. Se a emancipação dos judeus ocorreu através da emancipação política do Estado, traduzindo a emancipação política do Estado da religião, na explicação de Marx, sua emancipação social traduziria ao mesmo tempo a emancipação da sociedade inteira, na explicação de Arendt. Sobre este último ponto, é o caso de evocarmos o raciocínio sociológico de Nobert Elias, para quem o homem da Bildung correspondia a classe média em ascensão através da educação humanista, para quem a cultura representa a retirada e a liberdade das pressões do Estado que conferia a posição de segunda classe a cidadãos comparado a nobreza que negava à classe média o acesso as posições de liderança no Estado e suas responsabilidades, ao poder e prestígio associado a estas posições 16 . Este dilema da classe média, que, modernizando-se culturalmente através da educação, ao mesmo tempo permanecia atolada ainda no atraso alemão que perduraria ainda até o século XIX e XX, uma oposição que recobre desde o século XVIII a distinção entre cultura e civilização, na análise clássica de Elias, entre a classe média educada com seu sentido de acabamento e realização, e a civilização como símbolo dos príncipes e cortes das classes elevadas. Para os judeus, retornando ao livro 1 das OT, a sociedade exigia do judeu que ele se educasse o suficiente para não assemelhar-se aos judeus ordinários, ao mesmo tempo que somente os aceitava em razão da qualidade exótica dos judeus. Neste cenário de atraso a burguesia era incapaz de prover a cultura no sentido de uma formação (Bildung), não sendo gratuita a razão pela qual o romance de Goethe Wilhelm Meister tornou-se a expressão da educação do judeu e da educação do alemão de classe média: o herói do romance é formado por aristocratas e atores, e a educação equivalia a transformar o burguês no aristocrata. O que significava na verdade que os Junkers prussianos que não se interessavam de maneira alguma à cultura, empregavam na educação dos seus filhos preceptores burgueses geniais e mortos de fome vivendo na estreiteza de uma sociedade atrasada (Arantes, 2003). Educada por aristocratas e atores, as classes médias deveriam ser capazes de apresentar e representar sua personalidade. (Arendt, 2002c, p. 112 e pp. 226-227.) Para os judeus e a classe média, tal era a condição da sua aceitação social, a capacidade de expressar sua personalidade, e de jogar seu próprio papel, razão pela qual Arendt vai consagrar uma importante discussão sobre o salão de Berlim como protótipo deste modo de expressão do talento e da personalidade. (Arendt, 2002c, p. 113) 17 16 N. Elias, "History of Culture and 'Political History", op. cit. p. 127. . Designa os 17 Arendt põe o Wilhelm Meister de Goethe como exemplo de educação das classes médias, onde o jovem burguês é educado por aristocratas e atos. O jovem deve ser capaz de representar sua personalidade, e finalmente passar do estado de filho de burguês para aquele de aristocrata. op. cit. p. 112, reproduzindo assim, para seguir a análise de Benjamin, as condições de atraso em um país incapaz de encontrar uma burguesia que liderasse uma real tempos modernos de Berlim como sociedade burguesa, onde um lugar de conversação sobre temas literários e políticos vai passar a funcionar como expressão da cultura do moderno na Berlim do Segundo Império 18 Isto é, sobre os dilemas da emancipação social dos judeus, e também da sociedade alemã em geral, Arendt pensa a questão judaica tomando como referência o conceito de Bildung (formação), processo tipicamente alemão. . Era a sociabilidade na forma da arte, em que a sociabilidade repousa sobre as personalidades que exalam uma cultura subjetiva, no qual os indivíduos somente contam pelo que eles são espiritualmente, e onde o dinheiro não penetra na sociabilidade, espécie de último reduto da cultura face a uma sociedade civil burguesa em desenvolvimento. (idem) 19 mudança. Esta condição caracteriza o judeu e as classes médias na Alemanha, onde a educação era vista como forma de emancipação numa sociedade atrasada e não-nacional. A virada deste paradigma da Ilustração, "uma verdadeira virada", (Arendt, 2002c, p. 113), como diz Arendt, adveio com a derrota da Prússia em 1808 diante do Império Napoleônico, que concede aos judeus direitos cívicos mas não políticos aos judeus após os Tratados de Paz, tratados que na verdade legalizavam a condição de privilégio usufruída pelos judeus de Berlim, e cuja extensão com os editos de emancipação em 1812, seria finalmente sucedida pela sua revogação após a queda de Napoleão, quando a extensão dos direitos cívicos aos judeus pobres seria alcançada. Além da referência de Lucaks já evocada para as análises do Wilhelm Meister de Goethe como obra que retrata o conflito do herói com a realidade social na época do classicismo alemão, uma contradição cuja reconciliação se faz por tortuosos caminhos, (Lucaks, 2000, p. 139), ver ainda W. Benjamin, Ensaios Reunidos: Escritos sobre Goethe, São Paulo, Ed. 34, 2018, onde Os anos de aprendizado de Wilhelm Meistter, é cararcterizado pela "permanência hesitante de Goethe nos vestíbulos do Idealismo, no humanismo alemão, que ele transpôe mais tarde na direção de um humanismo ecumênico. O ideal dos Anos de aprendizado -a formação -e o meio social do herói -os comediantes -estão na verdade intimamente interligados, são ambos expoentes daquele domínio intelectual especificamente alemão da 'bela aparência', que não tinha muito a dizer à burguesia ocidental em processo de ascensão ao poder." pp. 158-159. 18 Para uma relação das personalidades que frequentavam os Salões de Berlim, assim como uma exposição de G. Simmel sobre os mesmos, ver L. Waizbort, As Aventuras de Georg Simmel, SP, Ed. 34, 2000, pp. 446-448. Entre os quais destaca-se naturalmente o Salão de Rahel, analisado por Arendt (Arendt, 2002c, p. 113). Sua formulação lapidar encontra-se em Rahel Vanhagem -a vida de uma judia alemã na época do romantismo, RJ, Relume Dumará, 2004. Um comentário desta obra com sua devida articulação com os trabalhos de Arendt sobre o classicismo alemão, "A questão judaica, sob a sua forma moderna, é contemporânea da Aufklarung", como diz Arendt, (Arendt, 2007, p. 117) pode ser encontrado em Paulo Arantes, "Uma irresistível vocação para cultivar a própria personalidade" (Parte I), Trans/Form/Ação, São Paulo, 26(1): 7-51, 2003 p. 9-13, que, de resto, possui comentários esclarecedores sobre os Anos de aprendizado. Na esfera da sociedade civil, a 19 19 L. Dumont remete o cerne desta relação aos contornos da formação alemã, onde o intelectual vira as costas para a sociedade civil, e, ao mesmo tempo, na sua vida interior, ele se pensa como um indivíduo e consagra todos os cuidados ao desenvolvimento da sua personalidade. O ideal da Bildung corresponde a este processo, antes de tudo dual, pois, antes de tudo, corresponde a um processo ideológico onde a sobrevivência do ideal de comunidade é Volume XXI Issue XII Version I 8 ( ) hegemonia cultural era o modelo da Bildung, contraface de um Estado dominado pelo código dos príncipes. O retorno ao classicismo alemão como era da Revolução Burguesa na Alemanha, como já foi identificado na pluma de Lukacs e Benjamin, oferece a matéria através da qual Arendt pensa os dilemas da emancipação social pela Bildung nas condições de miséria nacional. Quanto ao salão como símbolo desta configuração cultural, ele chegará ao fim em Berlim com a 1ª Guerra Mundial, assinalando a decadência da época clássica do individualismo e do "Bildungsbergertum" e o nascimento de uma sociedade de massas. E chegado a este ponto do livro 1 das OT 20 , já se mostra necessário recompor a base material e política nas quais proliferou aquele anti-semitismo que se tornou ideologia corrente após o surgimento do II Império e a crise de 1873 nas regiões de atraso alemão. (op. cit) Isto é, sem a compreensão da conjunção do surgimento do anti-semitismo como ideologia política e o nascimento dos movimentos imperialistas que sacudiram o logo liquidado Império Austro-Húngaro, a explicação não seria completa, pois pretende, justamente, dar conta dos aspectos ideológicos e político desta mudança histórica. Desta tarefa se ocupará o livro Imperialismo, livro 2 das OT, desenvolvendo para a análise do imperialismo alemão o pangermanismo como ideologia política, movimentos ideológico que deu nascimento ao III Reich, e cuja origem remonta às guerras Napoleônicas. Arendt confere um peso às ideologias políticas na época pós-Revolucionária cujo paralelo com Gramsci acerca do Ressurgimento Italiano é notável, (op. Cit). Para o caso da "ideologia alemã", este contorno político resulta da sobrevivência do Sacro Império Romano-Germânico, e sua reativação em condições modernas. Na pluma de Arendt, com o pangermanismo o patriota alemão reativa o sonho de domínio universal da Europa pela escravização das raças judias, espécie de ideologia do atraso em épocas de imperialismo. 21 acompanhada do imperativo da obediência, e, de outro lado, o desenvolvimento interior de uma personalidade cultivada, traço característico dos intelectuais, principalmente os judeus. Fórmula típica da ideologia alemã, como explica Dumont, relacionada com a reação alemã aos desenvolvimentos da Luzes. A Revolução foi aceita somente no espírito, como atesta o famoso opusculo de Kant sobre o Iluminismo. Cf. Homo aequalis, II, L'idéologia allemande -France-Allemagne et retour, Paris, Gallimard, 1991, pp. 36-37. 20 Deixarei de lado o capítulo consagrado ao caso Dreyfus, último do livro 1, visto que estou somente interessado em restituir o nexo histórico entre França e Alemanha na marcação conceitual e histórica do livro 1. 21 Na importante obra Écrits juifs, op. cit, Arendt considera os destinos dos judeus no mundo contemporâneo analisando o conflito árabeisraelense com o propósito de mostrar a reversão perversa dos judeus com os árabes sob a batuta sucessiva do Imperialismo inglês e americano com a fundação do Estado de Israel. Sua duríssima Mas aqui nós já adentramos na descrição do livro 2, cuja medula expositiva em torno da questão dos "fantasmas alemães" (Marx, 2002) fica para um próximo texto. O regime de historicidade recoberto pela análise de Arendt é o mesmo do livro 1, isto é, vai da Revolução Francesa até a 1º Guerra Mundial, sem deixar de passar pela referência de 1871 como data não somente do surgimento do anti-semitismo como ideologia política, mas também como base da superestrutura do anti-semitismo. A preocupação da autora será com o nexo da economia e da violência em escala mundial, fundamento material e político que serviu de base mundial para a proliferação dos discursos anti-semitas em escala mundial. Como vimos, o anti-semitismo como ideologia foi a sombra da modernização alemã, pois nasceu nas regiões da miséria alemã em resposta ao discurso da Revolução, até tornar-se moeda corrente quando esta condição se generalizou para o continente europeu. Mas voltando ao raciocínio acerca da antíteseentre a Revolução Francesa e os TotalitarismosImperialistas do século XX, entre esses dois extremos,nós temos nas OT um espaço histórico composto dediferentes extratos do tempo que o acontecimentorevolucionário deu surgimento, espécie de coexistêncianaformadacontemporaneidadedonão-contemporâneo. O livro começa tratando daemancipação dos Judeus a partir da RevoluçãoFrancesa em 1792, e o seu fim com a comparaçãohistórico-política entre o III Reich e a URSS com a qualse encerra o capítulo IV do livro 3. Olhando para oconjunto, Arendt expõe diferentes extratos dos temposmodernos: capítulos sobre a história do judaísmo, casoDreyfus na França, análises marxistas sobre oImperialismo francês, inglês e continental, retomadasda psicologia do homem de massas, etc. Isto é, emprincípio, nós não podemos alinhavar a obra entre umcomeço e um fim segundo uma continuidadehomogênea. questão judaica na Alemanha no livro 1 das OT,exposição que farei tomando a discussão do jovemMarx sobre a questão judaica como referênciaexplicativa. Os espectros alemães como reminiscênciaspolíticas do passado alemão tem uma funçãometodológica importante no modo como Arendt expõea questão judaica no contexto pós-Revolucionário, emcontinuo diálogo, ao mesmo tempo, como a ênfaseposta por Gramsci no Estado e nos intelectuais comoagentes das superestruturas ideológicas das nações deformação tardia, como é o caso da Alemã. (Viana,2002) Razão pela qual a reconstituição paciente do livro1 acaba nos levando para o classicismo alemão comoYear 2021Era da Revolução Burguesa na Alemanha. Resumindo, esta ênfase metodológica posta na ideia de anacronismo alemão pela marcação comparativa das Nações atrasadas relativamente à4Revolução Francesa, assim como o destaque para o âmbito ideológico na explicação do surgimento doVolume XXI Issue XII Version I ) ( Global Journal of Human Social Science -. O texto sobre o qual nós nos apoiamos é a Introdução à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel: "porque o statu quo alemão é o acabamento confessado do antigo regime, e o antigo regime é o defeito escondido do Estado moderno. O combate contra o presente político alemão, é o combate contra o passado dos povos modernos, e as reminiscências deste passado vêm sempre a atormentá-los. É instrutivo para eles de ver o antigo regime, que neles viveu sua tragédia, jogar sua comédia enquanto fantasma alemão." (Marx, 2000, p. 10)Nacional-Socialismo e do Bolchevismo, acompanha o livro OT do início ao fim 7 II. Antisemitismo Como Ideologia do Atraso . Dados os limites desta exposição, vejamos apenas o livro 1 das OT. O ponto de partida de Arendt é a definição do anti-semitismo como ideologia política que se cristalizou após a fundação do II Reich e a virada intelectual e moral sucedida pela recusa da cultura humanista do classicismo alemão e o predomínio do militarismo prussiano 8 . Olhando para o sumário do livro I, Arendt mobiliza a distinção entre emancipação política e emancipação social dos judeus, procurando compreender o anti-semitismo como ideologia política a partir da relação dos judeus com o Estado e a Sociedade, descrição história ao mesmo tempo política e social. A perspectiva não deixa de lembrar "Sobre a questão judaica" do jovem Marx, não somente pelo interesse no estudo da situação dos judeus no contexto do "atraso alemão", nos seus aspectos políticos, sociais e culturais, mas também por Arendt discutir metodologicamente a questão judaica partindo da Revolução Francesa e da Declaração dos Direitos6 7 Financeiro através do qual o Estado Nação sedesenvolveu, espécie de simbiose entre a alta finançaque sempre acompanhou o desenvolvimento capitalistanas grandes cidades, e o Estado Nação 12 . Comopensar o Império Austro-Húngaro sem o crédito judaico,que permitia que os judeus gozassem de liberdadescivis em Viena? Esta associação do capital financeirojudeu com o desenvolvimento do Estado é fundamentalna análise de Arendt, e sem esta consideração nós nãocompreendemos o porque o anti-semitismo se tornouuma ideologia política contraposta ao universalismo dasLuzes, e, como que uma Reação plantada no seuinterior.IV.Surgimento do Anti-SemitismoPois é assim que Arendt apreende o nexohistórico conceitual do anti-semitismo com a. Arendt identifica no Crédito Judeu o Capital A propósito dos nacionalistas conservadores na Alemanha, contrário ao espírito do humanismo clássico, ver Nobert Elias, The Germans -Power Struggles and the Development of Habitus in the Nineteenth and Twenthieth Centuries, New York, Colombia University Press, 1196, pp. 14-15 Nas palavras de Arendt, "a luta de raças pela dominação do mundo, a luta de classes pela tomada do poder político em diferentes países." (Arendt, 2002, p. 298). © 2021 Global Journals Volume XXI Issue XII Version I 3 ( ) Método e Questão Judaica em Hannah Arendt © 2021 Global JournalsMétodo e Questão Judaica em Hannah Arendt Sobre o estudo dos judeus em situação de atraso social e político, a referência é Marx em A Questão Judaica, novamente, pela razão evidente que situa o problema da emancipação no contexto pósrevolucionário, tanto quanto Arendt. Nossa autora expõe esta perspectiva de análise dos judeus como grupo social dividido entre os privilégios da corte, os judeus de gueto e o desprezo pelos intelectuais da Bildung alemã claramente nos Ecrits Juifs, op. cit. p. 189, como já assinalado.© 2021 Global Journals Volume XXI Issue XII Version I 5 ( ) Recapitulando Marx em A Questão Judaica: "A letra de câmbio é o deus real do judeu. Seu deus não passa de uma letra de câmbio ilusória."(Marx, 2012, p. 58)13 Para o surgimento do II Reich, ponto de inflexão na curva do antisemitismo, ver a análise clássica de Engels, já mencionada. Op. Cit. Para a mudança de ideologia representada pelo II Império, assim como sobre a formação do II Reich como retomada do "vieux rêve" de um Império Universal, ver La reforme intellecuelle et morale, Paris, Ed.Complexe, 1990, pp. 132-142. No resumo de Arendt: "Dans les années 1870, la question juive ne fait plus l'objet d'un débat, mais forme plutôt le point de cristallisation d'un mouvement politique dont le mot d'ordre est l'antisémitisme." "L'Antisémitisme", In Écrits Juifs, Paris, Fayard, 2002, p.165.15 A análise de Elias encontras-se em "Digression on Nationalism", In The Germans -Power Struggles and the Development of Habitus in the Nineteenth and Twentieth Centururies, op. cit, p. 155. * La vie de l'esprit. La pensée. Le vouloir 2013 PUF Paris * ____________ Rosa Luxemburgo Homens em Tempos Sombrios. S: Cia das Letras Rosa Luxemburgo -1871-1921. 1998 * Ensaios Reunidos: Escritos sobre Goethe WBenjamin 2018 34 São Paulo * Héritage de Notre Temps EBloch 1985 Paris Critique de la Politique * Socialisme ou barbárie -o conteúdo do socialismo CCastoriadis 1983 Seuil Paris * SP: Atica IDeutscher Política 1982 * LDumont Homo Aequalis LIi 'idéologia Allemande -France-Allemagne Retour Gallimard Paris 1991 * The Germans -Power Struggles and the Development of Habitus in the Nineteenth and Twenthieth Centuries NobertElias 1996 Colombia University Press New York * Le rôle de la violence dans l'histoire FEngels 1962 Ed. Sociales Paris * A Revolução se o Terror -o debate dos historiadores do século XIX FFuret A Revolução em Debate. SP: Edusc 2001 * Modernidade e dupla consciência PaulGilroy Negro SP: Ed 34 2001 * Os anos de aprendizado de Wilhelm Meistter WGoethe SP: Ed 34 2006 * RKoselleck Extratos Tempo RJ: Contraponto 2012 * A Invenção Democrática -os limites da dominação totalitária. SP: Brasiliense CLefort 1983 * VILenin Imperialismo fase superior do capitalismo. SP: Centauro 2010 * The Politics of combined and Uneven development -the Theory of Revolution Permanent MLowy 1991 London * A Teoria do Romance GLucaks RJ: Duas Cidades 2000 * O pensamento conservador KMannheim K. MANNHEIM, SP, Ática 1998 * Necropolítica -Biopoder, soberania, Estado de exceção, política da morte KMarx SP: N-1 Ed 2018 Introduction à la crítique de la philosophie du droit de Hegel, Trad * ErnstNolte Nº 25 1989 * A Revolução Russa -1917-1921. SP: Brasiliense DanielReis Arãao 1989 * Revoluções Russa e o socialismo soviético. São Paulo: Unesp ________________ As RENAN, E. La Réforme intellectuelle et morale. Paris: Ed. Complexe 2003. 1990 33 * Fascism as a Mass-Movement ARosenberg Historical Materialism 20 1934. 2012 * ESaid Questão Da Palestina São Paulo 2012 Unesp * The Rule the Law under Siege. Selected essays of Franz Neumann and Otto Kirchheimer WEScheuerman 1984 University Of California Press London, New York * BSouvarine UrssLe Cauchemar Dans La 2001 Poche Paris * A revolução passiva -Iberismo e americanismo no Brasil LuizVianna Werneck RJ: Revan 2004 * The Least of All Possible Evils: Humanitarian Violence from Arendt to Gaza AWeyzmann 2012 Verson, London