# Considerations about Teacher Education from Teacher Narratives: Teaching Knowledge in Motion Considerações Sobre a Formação Docente a Partir de Narrativas de Professores: Saberes Docentes em Movimento Resumo-Apresentamos resultados de um estudo para contribuir com as reflexões e discussões acerca dos processos formativos para a atuação docente, no contexto pós pandemia. Para tanto realizamos uma pesquisa cujo corpus foi constituído por 13 cartas pedagógicas enviadas a um evento que aconteceu em junho de 2022, por professores que atuam em escolas e realizam estudos de pós-graduação strict sensu. Considerando a análise textual discursiva, foram identificadas categorias emergentes que representam os aspectos que surgiram para a formação docente. São eles: a formação como processo contínuo de investigação reflexiva, em parceria com seus pares, de forma corresponsável, tomando as suas experiências docentes como ponto de partida para o constante redimensionamento da prática educativa; a humanização do fazer docente, significando entender a subjetividade do sujeito docente que ao legitimizar sua humanidade, acolhe o aluno como sujeito em suas várias dimensões e a inclusão das tecnologias digitais como recursos que precisam ser integrados a prática docente de forma a constituírem novos possíveis na ação educativa. Ao articular esses achados com vozes de pesquisadores, tecemos uma escrita reflexiva explicitando saberes em movimento, destacando que a formação do professor não é um processo dado o priori, mas que vai emergindo a partir do cenário sociocultural e histórico da experiência humana. Palavras-Chave: formação docente; saberes docentes; devir da pandemia. Abstract-We present the results of a study to contribute to the reflections and discussions about the formative processes for teaching in the post-pandemic context. To this end, we conducted a piece of research, constituted by a corpus formed out of 13 pedagogical letters sent to an event that took place in June 2022, by teachers who work in schools and carry out strict sensu postgraduate studies. Considering the discursive textual analysis, emerging categories were identified that represent the aspects that emerged for teacher training. They are: training as a continuous process of reflective investigation, in partnership with their peers, in a coresponsible way, taking their teaching experiences as a starting point for the constant resizing of educational practice; the humanization of teaching practice, meaning understanding the subjectivity of the teaching subject that, by legitimizing his/her humanity, welcomes the student as a subject in his/her various dimensions, and the inclusion of digital technologies as resources that need to be integrated into teaching practice in order to constitute new possibilities in educational action. By articulating these findings with the voices of researchers, we weave a reflective writing, explaining knowledge in motion, highlighting that teacher training is not an a priori given process, but that emerges from the socio-cultural and historical scenario of human experience. Reforçamos que o cenário da pandemia reverberou na docência e na cultura escolar, evidenciando um contexto no qual os professores, alunos e familiares foram intensamente desafiados a longas jornadas de trabalho, gerando um cansaço excessivo, por vezes, com pouca apropriação tecnológica, esbarrando nos limites de cada um. Diversos aspectos podem ser destacados: como a escola e os sujeitos envolvidos se organizaram para seguir com suas atividades; como professores e alunos lidaram com as orientações referentes ao ensino remoto emergencial 1 instituído no período da pandemia, criando formas de desenvolver a prática educativa; como as famílias foram envolvidas no sentido de 1 O ensino remoto emergencial foi instituído por pareceres do Conselho Nacional de Educação, legislando sobre o ensino e a reorganização do calendário escolar para fins de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da pandemia da covid-19. # Keywords acompanharem seus filhos com a realização das tarefas e atividades propostas. O isolamento social e as demandas para lidar com esse contexto revelaram várias mazelas da vida escolar em seus diferentes níveis de ensino. Surgiram dificuldades relacionadas ao acesso a material digitalizado para desenvolver os estudos, resultado da falta de equipamentos adequados ou de rede wireless. Fatores emocionais advindos de anseios e medos, dúvidas, preocupações e insegurança muitas vezes, impediram que as práticas escolares fossem realizadas de forma adequada. O contexto vivido careceu de muita força de vontade de todos os envolvidos para dar conta do que ia surgindo. Assim, diferentes formas de reorganizar a dinâmica pedagógica surgiram, fazendo uso dos recursos tecnológicos digitais disponíveis da melhor maneira possível, tanto para aproximar professores e alunos, isolados e impedidos de estarem de forma presencial no contexto escolar, como para compartilhar material didático para o desenvolvimento da prática pedagógica. Gatti (2020), ao escrever sobre a reconfiguração dos modelos educacionais no póspandemia, discorre sobre o fato de que as atividades escolares, em geral, sempre estiveram sustentadas na convivência social, ou seja, na presencialidade, sendo assim, o cenário da pandemia foi bastante perturbador para alunos, professores e gestores, os quais se viram diante de um isolamento que os levou a repensar ou a reorganizar as práticas desenvolvidas. Dessa maneira, vários enfrentamentos aconteceram para viver a escola durante a pandemia, ao mesmo tempo que muito se aprendeu e muito se revelou em termos de necessidade de estudos e de redimensionamentos para o voltar à escola no pós-pandemia, a fim de que fosse possível estarmos juntos e retomássemos a vida escolar a partir do que aprendemos e do que foi desenvolvido durante a pandemia. As transformações realizadas nas escolas, nesse período no qual o ensino remoto emergencial aconteceu, demandou por momentos de reflexão e de discussão, a fim de que os professores pudessem desenvolver as suas aulas, superando as dificuldades e os desafios que surgiam. Oliveira, Corrêa e Morés (2020) se referindo a isso apresentam resultados de um estudo sobre uma experiência vivenciada em uma escola da educação básica durante a pandemia da covid-19, levando em conta as recomendações do ensino remoto emergencial. Os autores destacam os desafios enfrentados pelos docentes, em especial em integrar as tecnologias em sua prática, revelando fragilidades em sua formação. Também evidenciam que não é suficiente apenas saber usar os recursos tecnológicos, mas é preciso ir além dele, ou seja, investir em uma formação docente que contemple a relação com o humano, o diálogo, a emancipação, a autonomia e as tecnologias relacionadas com essa dimensão" (OLIVEIRA; CORRÊA; MORÉS, 2022, p. 12). Desse modo autores como Schlemmer, Oliveira e Menezes (2021) e Sacramento Soares e Maschio (2017) enfatizam que apenas incluir recursos digitais nas práticas pedagógicas não é suficiente para que a aprendizagem seja desenvolvida, recomendando que é necessário reorganizar e refletir sobre práticas e dinâmicas pedagógicas com potencial de desencadear a aprendizagem, onde a mediação do professor junto ao aluno que utiliza a tecnologia possa acontecer, de forma que este compreenda e atribua sentidos às tarefas e práticas realizadas. Seguindo com essas reflexões, trazemos as contribuições de Basso e Pierozan (2021), que realizaram um estudo envolvendo professores de escolas de educação básica do estado do Rio Grande do Sul, analisando os desafios da escola, suas incertezas e demandas no período do isolamento social. As autoras destacam a importância da família, dos professores e dos gestores, os quais, juntos e comprometidos, foram facilitadores do desenvolvimento da ação escolar nesse período. Assim, a prática educativa passou a ser uma tarefa compartilhada entre escola e família. A experiência vivida, conforme destacam Basso e Pierozan (2021), nesse tempo, foi atípica, revelando vários elementos importantes de serem implementados e aprofundados para o período pós-pandemia: o acolhimento mútuo e a questão da parceria não só entre professor e aluno, como também entre professores, alunos, gestores e família. O planejamento pedagógico precisou e precisa ser repensado considerando as tecnologias digitais, de forma que ela possa auxiliar e potencializar o desenvolvimento da aprendizagem. Sobre esse aspecto, elas citam Nóvoa (2020, p. 8), que afirma: "As melhores respostas, em todo o mundo, foram dadas por professores que, em colaboração uns com os outros e com as famílias, conseguiram pôr de pé estratégias pedagógicas significativas para este tempo tão difícil". Diante disso, Maturana e D'Avila (2021) nos instigam a tomarmos a situação que vivemos e que nos desafiou como oportunidade para "uma compreensão reflexiva", ampliando nossa visão para criarmos novas formas de ser e de estar em todos nossos espaços de convivência. Diante dessas considerações, destacamos a relevância de investir em estudos e pesquisas que acolham a formação de professores num cenário reflexivo, que promova o diálogo, a interação, a problematização, a troca entre pares, a socialização de experiências, incentivando e contribuindo para que o professor invista em sua formação. Nóvoa (2021, n.p) recomenda que 2 : "O melhor que nós temos a fazer é reconhecer que no mundo -e também na resposta à pandemia -há milhares de professores, experiências e realidades educativas que precisam de ser pensadas, escritas e partilhadas para criar uma nova realidade educativa". Sendo assim, nosso objetivo com o texto é contribuir com as reflexões e discussões acerca dos processos formativos para a atuação docente no contexto pós-pandemia e, para tanto, apresentamos um estudo, cujo objeto de pesquisa são cartas pedagógicas enviadas a um evento que aconteceu em junho de 2022. # II. # Delineamento Metodológico O estudo que apresentamos gerou dados para constituir o corpus de pesquisa, tendo como base cartas pedagógicas submetidas por professores a um evento realizado no mês de junho de 2022, numa Universidade Comunitária do Nordeste do Rio Grande do Sul, no Brasil. O evento foi denominado Educação e Pandemia(s)/Pós-Pandemia(s): Territorialidades nos saberes e produção de sentidos 3 . Para submeter cartas ao evento deveria ser escolhido um tema dentre vários propostos, conforme orientações para submissão. Carta pedagógica é um gênero textual proposto por Paulo Freire. Dotta e Garcia (2022) fazem referência a essa inspiração freireana, discorrendo que Freire (2000) argumenta que uma carta pedagógica poderia ser utilizada como instrumento por "professoras e professores que, chamados à reflexão pelos desafios em sua prática docente, encontrassem nelas elementos capazes de ajudá-los na elaboração de suas respostas", (FREIRE, 2000, p. 29). Sendo assim, ao escrever cartas pedagógicas, os autores estão exercitando, por meio de uma narrativa crítica e reflexiva, sua forma de perceber e de entender seu contexto de atuação. Dessa forma e considerando a carta pedagógica um importante legado do pensamento freireano, a escolhemos como experiência reflexiva sobre a temática educação e formação docente em um cenário de pandemia/pós-pandemia, para constituir nosso corpus de estudo. Mais especificamente escolhemos as cartas aceitas pela mesa temática 3: Educação, pandemia(s) e formação docente, cuja ementa era: O cenário da pandemia afetou a vida 2 Em entrevista dada a revista Online Educação sobre a temática "Aprendizagem precisa considerar o sentir". Disponível em: https:// revistaeducacao.com.br/2021/06/25/antonio-novoaaprendizagem-se ntir/. Acesso em: 26 set. 2022. 3 EDUCAÇÃO E PANDEMIA(S)/PÃ?"S-PANDEMIA(S): TERRITORIALI -DADES NOS SABERES E PRODUÇÃO DE SENTIDOS. Caxias do Sul: UCS, 2022. Disponível em: https://www.ucs.br/site/eventos/educacaoe-pandemias-pos-pandemias-territorialidades-nos-saberes-e-produ cao-de-sentidos/. Acesso em: 26 set. 2022. Neste estudo, estamos considerando docente e professor como termos sinônimos. planetária, trazendo consequências para as práticas educativas e para a formação docente. A presente mesa acolhe narrativas que evidenciavam estudos, pesquisas e reflexões sobre a formação docente e suas relações com a educação básica e educação superior no cenário da pandemia e pós-pandemia. Assim, o corpus de pesquisa foi constituído por 13 cartas, cujos autores são professores que atuam na rede pública e privada de ensino e que realizam estudos junto a um Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação 4 . São elas: Carta 1: A formação continuada e da mobilização dos saberes dos docentes dos anos iniciais do ensino fundamental; Carta 2: A travessia e a abertura ao outro: o diálogo como experiência formativa; Carta 3: formação de professores para além da universidade; Carta 4: Formação permanente de professores: a pandemia e os círculos dialógicos investigativos-formativos; Carta 5: repensar a escola e seus atores no período pós-pandêmico: um dever de todos; Carta 6: a formação continuada de educadores no contexto da educação infantil; Carta 7: Um convite a pensar os processos formativos; Carta 8: Reflexões sobre formação continuada, um exercício de curiosidade; Carta 9: Macrocomponente curricular "núcleo articulador"; Carta 10: Sobre a formação continuada de professores: carta ao(à) jovem docente, para que a esperança não seja substituída pela acomodação; Carta 11: potência da formação docente em contexto na educação infantil; Carta 12: Um olhar sobre a formação de professores; Carta 13: Movimentos sensíveis na formação docente. A análise do corpus foi inspirada na análise textual discursiva de Moraes e Galiazzi (2016), em que as categorias emergentes foram identificadas a partir de uma leitura atenta das narrativas expressas nas cartas, de forma a captar a percepção dos autores acerca dos aspectos que eles destacaram como relevantes para a formação docente, considerando as demandas e desafios da pandemia. Dessa leitura surgiram unidades de análise que foram base para a identificação das categorias emergentes: Processo contínuo de investigação reflexiva sobre a ação docente; Aspectos humanos da formação docente; Reflexão acerca do currículo e das mudanças culturais. para a formação docente, na perspectiva das narrativas dos professores autores das cartas pedagógicas. 5 A categoria Processo contínuo de investigação reflexiva sobre a ação docente, contempla narrativas que se referem a formação como um processo contínuo, baseado na reflexão sobre a ação docente em parceria com seus pares, em diálogo e compartilhando suas vivências, reflexões e questionamentos se co-responsabilizando por seu processo formativo. E considerando as experiências advindas das práticas desenvolvidas em sua atuação, como fonte de pesquisa e de reflexão, de forma que as ações da formação precisam ser criadas em parceria com os interessados. Algumas narrativas que representam essa categoria. "incentivar os professores a refletirem sobre sua própria prática e, a partir disso, oportunizar para que eles possam assumir a responsabilidade sobre a própria formação continuada, percebendo-se como protagonistas do processo" (Carta 1). "a formação é travessia que se faz na própria ação de atravessar sendo que o diálogo é sempre possibilidade de experiência formativa" (Carta 3). "assumir um lugar de pertencimento frente aos próprios processos formativos, pois estes abarcam uma dimensão importante para a existência de uma prática pedagógica contextualizada e com intencionalidade, de maneira que o professor participe de forma ativa e crítica em um processo de mudança e transformação do seu próprio contexto" (Carta7). As narrativas relacionadas a essa categoria evocam, dentre outros aspectos, a corresponsabilidade docente. Desse modo, cabe trazer o que Freire (1996, p. 103) diz, quando ele enfatiza que "o professor que não leva a sério sua formação, que não estude, que não se esforce para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua classe". Esse educador evidencia a responsabilidade do professor em ser sujeito de seu processo de formação e assim, como nas narrativas, em especial na Carta 4, as vozes dos professores-autores das cartas estão de acordo com essa premissa freireana. Ainda em relação a essa categoria, citamos as ideias de Nóvoa (2020), discorrendo que as ações dos professores -em colaboração uns com os outros e com as famílias -foram decisivas para que as ações pedagógicas tivessem continuidade no período tão desafiador da pandemia. Sendo assim, podemos inferir que agir em colaboração mútua e em parceria é um caminho para desenvolver formação docente como um processo contínuo. As considerações acerca da formação, expressas nessa categoria, podem ser articuladas aos círculos de cultura freireanos, que são de natureza dialógica e investigativo-formativo. São concebidos como roda de pessoas, no caso de professores, que discutem de maneira heterárquica, articulando seus saberes e em cooperação para analisar uma realidade vivida com consciência crítica e transformadora (FREIRE, 1996). A categoria "aspecto humano da formação docente" diz respeito às narrativas que discorrem sobre a importância de contemplar, na formação, saberes relacionados à dimensão humana e à singularidade do professor e dos atores do processo educativo. Diz respeito à subjetividade do professor que viveu em tempos de pandemia com diferentes desafios e demandas e precisou cuidar de si, em sua forma de ser e de estar na prática pedagógica. As narrativas dessa categoria evidenciam a necessidade de discutir, de refletir e de trazer para a formação aspectos que emergiram nesse período de isolamento e de instigação: as crenças e bases teóricas nas quais são embasadas as práticas desenvolvidas; as dificuldades e os anseios que permeiam a vida escolar e as experiências que trazem sentido e significado para a vida. São narrativas que evocam o olhar para si e para a forma de ser de cada um, questionando suas certezas e buscando novos caminhos. Alguns recortes dessas narrativas: "Sem esse olhar para si, sem essa análise pessoal com um olhar para seu fazer pedagógico, fica difícil enxergar qual caminho seguir, quais investimentos fazer em suas capacitações continuadas, quais habilidades precisa aprimorar ou procurar desenvolver" (Carta 13). "Formação como movimento constante e inacabado [...] de relação intersubjetiva que se estabelece imprescindivelmente na abertura ao diálogo" (Carta 2). "Trago, aqui, um convite, para que todos possamos reformular nossas perguntas, a fim de buscar e pesquisálas, mesmo que, e principalmente, de forma autônoma. É gratificante sentir-se capaz e necessário a você mesmo!" (Carta 8). "O primeiro nó se refere à concepção epistemológica [...] o segundo nó se amplia para as tecnologias ainda discutidas no âmbito do dispositivo técnico, do trabalho, da ferramenta [...]o terceiro nó é o entendimento de si como produtor (e subjetivados) de discursos ainda presos nos pressupostos do mundo dado, nos desafiando para dizer a verdade sobre nós mesmos". (Carta 13). "Destaco a importância de humanizar as relações, de dar espaço e ouvir os professores, fornecer apoio e suporte emocional. O professor precisa estar bem para poder desempenhar seu papel e também ouvir e dar apoio aos alunos" (Carta 13). As narrativas relacionadas a essa categoria evocam aspectos que dizem respeito à subjetividade do professor, daquilo que o constitui: suas crenças, seus anseios, seus desejos como ser humano que escolheu atuar no contexto da prática educativa. Sob essa perspectiva, Sacramento Soares (2018) considera que o sujeito docente se constitui no fluir de suas operações, enquanto experiencia suas práticas docentes, "no seu viver docente", no qual sua estrutura é constantemente transformada, de modo congruente com suas interações, consigo e com seu entorno. Com isso, o ambiente de atuação docente e a dinâmica pedagógica formam uma circunstância para se refletir sobre o fazer: dessa maneira, em interações recorrentes, os professores, em seu entorno, vão se constituindo enquanto vivem suas experiências. Experiências no sentido daquilo que toca e transforma o sujeito, sendo assim, mecanismos de subjetivação (BONDIA, 2002). Desde esse ponto de vista, o professor como sujeito da experiência é aquele que se observa e que se deixa tocar pelo que observa, assim como que se envolve, busca entender e lidar com aquilo que o toca. É um sujeito que se deixa transformar pelo que experiencia. Nesse sentido, enfatizamos a relevância da formação docente acolher o humano, as dimensões pessoais que fazem sentido à pessoa do professor, articulando os aspectos humanos da formação docente com as dimensões de vida pessoal e profissional. Os estudos de Nóvoa (2009, p. 38) tem corroborado com esse viés, enfatizando que "[...]que o professor é a pessoa, e que a pessoa é o professor. Que é impossível separar as dimensões pessoais e profissionais. Que ensinamos aquilo que somos e que, naquilo que somos, se encontra muito daquilo que ensinamos". Neste contexto formativo permite-se que o professor olhe para si, para seu processo formativo, articulando as dimensões de vida com saberes da docência que congregam o processo educativo. A categoria "reflexão acerca do currículo e das mudanças culturais" remete a narrativas que instigam a refletir sobre o cenário sociocultural em que se vive para pensar na ação docente. Ou seja, levar em conta os movimentos socioculturais e seus desafios, suas demandas e suas instigações para redimensionar a ação docente, num caminho em que o professor é protagonista e agente que observa e percebe o território onde atua para além da escola e do currículo. Algumas narrativas falam sobre a importância do protagonismo discente, no sentido de ser levado em conta, na formação docente, suas trajetórias e saberes. Eis alguns excertos das cartas: "O grande desafio docente é apreender as relações e os sentidos atribuídos aos percursos protagonizados no cotidiano dessa nova estrutura curricular, por meio do diálogo e de uma escuta sensível em torno das experiências narradas pelos estudantes" (carta 9). "E quando olhamos para algumas redes e escolas, conseguimos reforçar essa esperança e vislumbrar os primeiros movimentos. Às vezes é no varejo das relações, nas trocas de ideias, experiências e afetos que o círculo vicioso é rompido" (carta 10). "Uma formação que permita e acolha o esperançar, do professor, do coletivo de docentes, das redes e escolas que os constituem, para assim, alavancar proposições, romper com vivências instituídas no cotidiano docente" (carta 10). "[...] fragilidades pelas quais o sistema de ensino já passava e que vieram à tona com mais evidência, como a necessidade de práticas mais condizentes com a sociedade tecnológica e a fragilidade dos profissionais em apropriar-se desses recursos e utilizá-los como suporte para o ensino e aprendizagem" (carta 11). "que a formação indague sobre relações com os lugares e com as pessoas [...], é olhar para as aprendizagens dos sujeitos, e compreender que esse percurso não é linear, tampouco igualitário, mas que é movimento, é sentido, refletido e participativo" (carta 7). As narrativas desta categoria estão relacionadas ao que Gatti, 2020, se refere ao escrever sobre as reconfigurações dos espaços pedagógicos, no devir da pandemia. A autora assim se expressa: Esquecer o que estivemos sendo chamados a repensar nesse período pandêmico será um retrocesso muito indesejável para o futuro da vida. Tudo nos chama a repensar a educação fragmentária, de caráter apenas cognitivo, e, para muitos jovens e adolescentes, sem sentido, que oferecemos. Domínio de conhecimentos imbricados com valores de vida é o vetor saudável a preservar para novos tempos (GATTI, 2020, p. 14). Assim e atendendo ao convite da autora, carecemos levar em conta as lições aprendidas no tempo de isolamento, incluindo aspectos relacionados ao redimensionamento curricular e de tempo e de espaço na ação educativa. Além disso, acolher os alunos e professores para que eles possam relatar e refletir sobre as dificuldades, as angústias e os anseios que viveram nesse tempo, bem nos ajustes e formatos criados para lidar com o que aconteceu. Com esse viés, destacamos que nessa categoria fica enfatizada a necessidade de a formação acolher aspectos humanos e sociais. Nóvoa (2009, p. 31), por sua vez, recomenda que a formação precisa considerar o "compromisso social", enfatizando que essa abordagem permite ao docente ser protagonista do seu processo formativo, alavancando o diálogo e a escuta entre os atores da sociedade, valorizando o coletivo com vistas ao compromisso social docente. # IV. # Considerações e Recomendações: Saberes em Movimento Para a Formação Docente Num Processo Contínuo e Reflexivo As reflexões expressas nesta escrita contemplam considerações sobre a formação docente a partir das narrativas advindas das cartas pedagógicas escritas por docentes e estudantes vinculados a grupos de pesquisa, da educação básica e da pós-graduação. Esse movimento de escrita possibilita um espaço para pensar, pesquisar e socializar experiências e saberes vivenciados junto à educação básica, acolhendo diálogos, escutas, pronunciamentos e problematizações advindas do tempo presente, momento em que também estamos sendo afetados pela pandemia e que continua demandando repensar a prática docente. Destacamos os aspectos que emergem a partir das narrativas dos professores para a formação docente, que dizem respeito à formação como: processo contínuo de investigação reflexiva, em parceria com seus pares, de forma corresponsável, tomando as suas experiências docentes como objeto de pesquisa e de redimensão da prática educativa, no sentido de se constituírem professores-pesquisadores, que tomam sua prática como objeto de investigação; ao docente como sujeito que questiona suas certezas, observa as demandas e os desafios do contexto sociocultural vigente como ponto de partida para reinvenção da prática docente e do plano curricular; à humanização do fazer docente, significando entender a subjetividade do sujeito docente que, ao legitimizar sua humanidade, acolhe o aluno como sujeito em suas várias dimensões e a inclusão das tecnologias digitais, buscando integrar esses recursos à prática docente, de forma a constituírem novos possíveis na ação educativa. A seguir apresentamos uma nuvem de palavras que sistematiza essas ideias mobilizadas no decorrer da análise do corpus de pesquisa, contemplando aspectos relacionados a formação docente, a luz das narrativas de professores. Seguindo nessa escrita e articulando os aspectos que emergiram na análise, expressos na nuvem, trazemos vozes de alguns pesquisadores que discutem saberes relacionados a formação docente. Tardif (2002, p.14) referenda em seus estudos que "o saber dos professores não é um conjunto de conteúdos cognitivos definidos de uma vez por todas, mas um processo de construção ao longo de uma carreira profissional no qual o professor aprende progressivamente [...]". Em suas considerações esse autor recomenda que a formação precisa mobilizar os docentes a fim deles pensarem sobre a sua formação como algo para além da certificação. Instigando-os a uma constante busca pelo aprender, conhecer, criar e mobilizar saberes que contribuem com o compromisso social e científico da docência. Sob esse ponto de vista, em seu percurso formativo, o docente carece construir e movimentar saberes num processo contínuo de investigação reflexiva sobre sua atuação, em acoplamento com seu contexto social, sua trajetória de vida, suas experiências pessoais e profissionais. Sendo assim, os espaços de formação carecem ser ambientes de convivência para refletir e discutir com seus pares acerca de sua forma de ser e de fazer no cenário escolar, de forma que a escuta sensível possa operar transformações nos modos de ser dos docentes. Transformações essas que possibilitem a emergência de uma nova cultura sobre o entendimento do que seja atuar como professor e criar ambientes de aprendizagem em coparceria e legitimidade com seus alunos (MATURANA; REZEPKA, 2000). Com esse viés, Santos (2021, p. 317) enfatiza a necessidade de democratizar as relações da universidade com a sociedade, inferindo que "A universidade produz conhecimento válido, que é tanto mais precioso quanto melhor souber dialogar com os outros saberes que circulam na sociedade". (p. 317). De modo a oportunizar a integração, a ruptura com os distanciamentos e barreiras, incentivando o diálogo com os saberes que circulam na sociedade inerentes ao aspecto humano da formação docente, da reflexão acerca do currículo e das mudanças culturais presentes nos processos de formação docente. Propiciando assim um processo formativo voltado para a autonomia profissional e para um protagonismo docente. Moraes, 2008, destaca que a formação docente carece levar em conta a importância de o sujeito professor desenvolver saberes para além da didática, considerando saberes relacionados à imprevisibilidade e bifurcações do território onde atua, o domínio de ação do sujeito estudante e as transformações sociais. Isso significa mapear constantemente o contexto em que realiza sua ação docente, como observador implicado que vai criando e recriando sua prática, num movimento reflexivo e recursivo, numa causalidade circular, em que cada ação atua retroalimentando e/ou modificando o contexto. Para entender isso o professor precisa ir além de suas crenças e concepções baseadas na causalidade linear e na previsibilidade determinística. Precisa atuar com uma escuta sensível atenta aos processos de seus alunos, olhando-os como sujeitos em formação e que carecem ser acolhidos em suas várias necessidades. Nesse caminho a autora nos convida a estar atento às bases epistemológicas que inspiram o fazer docente, que por sua vez está ancorado em suas concepções teóricas. Ela recomenda que essas concepções precisam ser revisitadas de forma contínua a fim de que o professor possa lidar com as emergências, as incertezas e a causalidade circular que caracterizam a realidade. As vozes dos autores que tecem conosco esta escrita reflexiva, a partir das narrativas que tomamos como objeto de estudo, evidenciam que a docência vai sendo constituída no fluir das demandas e desafios, onde o docente ilumina sua prática com reflexão articulada a saberes e ao olhar de pesquisador, em que as questões que emergem no dia a dia do contexto de atuação é que vão norteando e inspirando o professor no sentido de ele criar sua ação pedagógica. Refletindo sobre as lições do vírus, Morin (2020, p. 31) nos convida a "mudar de via", tendo o pensamento complexo como estratégia, dizendo que "as ações não obedecem às intenções de quem decidiu realizá-las, mas as retroalimentações do meio em que ocorrem". Esse emérito pesquisador nos incita a percebermos a importância de sabermos que estamos juntos enquanto humanidade e que podemos cocriar caminhos novos. Ensejamos que as tessituras que tecemos, tendo como inspiração as narrativas dos professores nas cartas pedagógicas, objeto de nosso estudo, sejam inspiradoras para as discussões relacionadas à concepção do processo de prática formativa docente. Para finalizar e sabendo que essa reflexão é um fluxo contínuo, lembramos que o devir da pandemia nos convoca a transformações diante dos desafios e demandas advindos das experiências que foram vividas no isolamento pandêmico. Ainda, ressaltamos que a formação do professor não é um processo dado a priori, é algo em processo, que vai emergindo a partir do cenário sociocultural e histórico da experiência humana. ![Considerations about Teacher Education from Teacher Narratives: Teaching Knowledge in Motion](image-2.png "G") 2022Boitempo, 2021.17. SCHLEMMER,Eliane;OLIVEIRA,Lisiane;MENEZES, Acesso em:20 set. 2022.19. SACRAMENTO SOARES, Eliana Maria; MASCHIO,Elaine Cátia Falcade. Práticas, representações emediação: o uso dos laptops educacionais e asintervençõesdocentesnoprocessodeaprendizagem da educação básica. Foi organizado um e-book com a publicação das cartas aceitas para o Evento. Ele está em processo de editoração junto a editora da instituição organizadora.© 2022 Global JournalsVolume XXII Issue X Version I 3 ( ) Neste estudo, estamos considerando docente e professor como termos sinônimos. © 2022 Global Journals * Desafios da gestão escolar: tempos de incertezas na escola pública. Monografia. Especialização em Gestão Escolar -Universidade Federal da Fronteira Sul. Campus de Erechim CrislaineV ;Basso SandraS HPierozan 2021. 26 jun. 2022 * Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação JorgeBondia Larrosa 2002 19 S.L. * CarlaLuzDotta Salaibb * Cartas pedagógicas: uma inspiração freireana EliseteEnirGarcia Bernardi jan. 2022 Santa Cruz do Sul Reflexão e Ação * Pedagogia da autonomia PauloFreire Saberes necessários à prática docente. 4. ed. São Paulo: Paz e Terra 1996 * Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos PauloFreire 2000 UNESP São Paulo * Possível reconfiguração dos modelos educacionais pós-pandemia. Estudos Avançados, v. 34, n. 100 BAGatti 2020 * Formação humana e capacitação Humberto;Maturana SimaNisisRezepka De 2000 Vozes Petrópolis, Rio de Janeiro * Una invitacion a crear un futuro de colaboratión HMaturana XD'avila La Revolución Reflexiva 2021 Editorial Planeta Chilena S. A.: Previdencia Santiago do Chile * Ecologia de saberes: complexidade MariaMoraes Cândida 2008 Antakarana/Willis Harman House São Paulo transdisciplinaridade e educação. Novos fundamentos para iluminar novas práticas educacionais * Moraes ;Roque MariaGaliazzi Do Carmo Análise textual discursiva. Ijuí: Ed. Unijuí 2016 * É hora de mudarmos de via. As lições do coronavírus EdgarMorin 2020 Tradução de Ivone Castilho Benedetti. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil * Os professores depois da pandemia António;Nóvoa YaraAlvim Cristina