# I. Objetivos sta pesquisa tem como objetivo o estudo do caráter filosófico contido na retórica dentro do contexto da filosofia antiga, especialmente a obra homônima de Aristóteles, apoiando-se principalmente na tese do Estagirita de que a retórica pertence à dialética, sendo, dessa forma, a base para a construção do conhecimento na Grécia antiga. a) Objetivos específicos i. Investigar as ligações entre a retórica, a dialética e a lógica, e, por conseguinte, sua importância na produção do conhecimento; ii. Demonstrar como a retórica possuía um papel fundamental na construção do pensamento filosófico na Grécia antiga; iii. Investigar o caráter fundamentalmente filosófico da retórica; iv. Analisar os termos chaves da obra Retórica, como dialética, silogismo, entimema, lógica, arte e persuasão na língua grega clássica. II. Justificativa da Inserção do Projeto em Uma Das Linhas De pesquisa do Programa O presente projeto se justifica na inserção da linha de pesquisa de filosofia antiga e medieval, pois trata-se de um dos problemas filosóficos mais influentes na Grécia antiga-e assim se mantendo também na Idade Média-, e que, a partir da contribuição de Aristóteles, a discussão sobre a retórica adquiriu um novo nível de desenvolvimento, justamente por considerar a retórica uma contraparte da dialética. Ademais, os estudos do Estagirita dentro da Retórica dialogam com a tradição filosófica anterior a ele, notadamente os sofistas -ainda que de modo crítico. Não obstante, o tema apresentado por este trabalho se mostra relevante no sentido de contribuir na exploração de uma das teses centrais da Retórica: o estudo dessa arte enquanto meio para se chegar à verdade, e, em última instância, o bem, já que este é superior ao seu oposto. Visto que a filosofia nasceu de uma pretensão de explicar o todo, o referido filósofo foi um dos estudiosos que mais contribuiu para este ramo do conhecimento, logo, o presente tema se justifica na medida em que propõe um estudo dentro de um dos pontos centrais neste marco na técnica retórica que a obra homônima representa. # III. # Apresentação da Hipótese de Trabalho O filósofo Aristóteles, logo no início do livro da Retórica, estabelece que ela pertenceà dialética, e, com isso, ambas se utilizam da mesma estrutura lógica. A abertura do mesmo livro assim se apresenta (ARISTÃ?"TELES 2011, 1, 1354a 1-6) 1 : # ? A retórica é a contraparte da dialética. Ambas igualmente dizem respeito a estas coisas que se situam, mais ou menos, no horizonte geral de todos os indivíduos, sem ser do domínio de uma ciência determinada. Assim, todos, de uma maneira ou de outra, servem-se de ambas; de fato, em uma certa medida, todos procuram discutir e sustentar teses, realizar a própria defesa e a acusação dos outros. Desse modo, Aristóteles (Ret, 1, 1354a 11-12) conclui em seguida que a retórica, dada a sua função, assemelha-se à uma arte -dentro da acepção grega, isto é, uma técnica (em grego ). Nesse ponto, vale mencionar a profundidade e importância desse conceito dentro filosofia antiga, pois, tal como ensina Reale (2014, p. 247), tal palavra implica simultaneamente conhecimento universal e aplicação prática, com predominância do primeiro sobre o segundo. Na mesma linha de raciocínio, na obra Paideia de Jaeger (1973, II, p. 192), é dedicado um espaço para argumentar sobre a dimensão e o peso da palavra grega , afirmando que tal conceito abrange um arco de significado tão amplo que não se traduz propriamente nas línguas modernas com a palavra arte. Além disso, o termo em grego exprime uma atividade que não se apoia somente sobre uma prática rotineira, mas sobre regras gerais e sobre conhecimentos precisos, a tal ponto que a palavra grega se distingue da ciência apenas no sentido de que a é direcionada para a prática. # ??? ??? ??? ??? ?? ? ??? Assim, compreendida a profundidade do termo arte na filosofia antiga e levando em consideração que a retórica é uma parte da dialética, o Estagirita extrai o problema filosófico que envolve toda a obra da Retórica, qual seja, os modos de persuasão sobre quaisquer argumentos. Em suas próprias palavras (Ret, 2, 1355b 26-35): Pode-se definir a retórica como a faculdade de observar, em cada caso, o que este encerra de próprio para criar a persuasão. Nenhuma outra arte possui tal função. Toda outra arte poderia instruir e persuadir acerca do que lhe é próprio, por exemplo: a medicina, sobre o que é saudável; a geometria, acerca das propriedades das grandezas; a aritmética, a respeito dos números; o mesmo aplicando-se às outras ciências. Quanto à retórica, todavia, vemo-la como o poder, diante de quase qualquer questão que nos é apresentada, de observar e descobrir o que é adequado para persuadir. E esta é a razão por que a retórica não aplica suas regras a nenhum gênero particular e definido. Com base nisso, resta a questão: quais os liames que se pode estabelecer entre a retórica, a dialética, a lógica, e, por conseguinte, a filosofia? Tal como sustenta Berti (1998, p.171), tanto a retórica quanto dialética é dotada da mesma estrutura lógica, ou seja, compartilham do mesmo modo de argumentar, aplicando seus respectivos procedimentos a diversos tipos de conteúdo, e isso resulta do fato de que ambas se tratam de procedimentos praticáveis por todos, além de servirem-se de procedimentos análogos. A constatação feita pelo professor italiano revela, desse modo, o cerne do problema filosófico que perpassa toda a obra: o estudo da arte retórica, a partir de sua estrutura lógica, voltada para a persuasão. De modo mais detalhado, Reale (2013, p.164-165) ensina que a retórica apresenta analogias com a lógica sob o aspecto formal, significando que as estruturas do pensamento e do raciocínio, em particular a dialética, estão presentes na retórica; já quanto ao conteúdo, essa arte se assemelha à ética e à política. Nesse ponto, vale igualmente a contribuição da professora Chauí (2002, p. 480), pois ela aponta que a retórica é uma arte indispensável nos discursos públicos. Além disso, os métodos de persuasão desenvolvidos ao longo da obra apresentam analogias com os silogismos, isto é, o paralelismo entre entimemas e silogismo. Isso é o que Aristóteles (Ret, 1, 1355a 9-14) expõe na seguinte passagem: O entimema é um tipo de silogismo, e o exame indiscriminado dos silogismos de todos os tipos é tarefa da dialética -ou da dialética como um todo, ou de um de seus ramos. A nítida conclusão disso é: aquele que está melhor capacitado a perceber como e a partir de que elementos um silogismo é produzido disporá igualmente da melhor habilidade para o manejo do entimema quando conhecer adicionalmente os objetos de que se tratam os entimemas e as diferenças que os distinguem dos silogismos lógicos. Assim sendo, com base no trecho supracitado, percebe-se que a retórica está fundamentalmente ligada com as estruturas lógicas da dialética, e, portanto, é uma das chaves do conhecimento na Grécia antiga. A analogia feita pelo Estagirita (Ret, 1, 1355a 14-20) é ainda elevada ao patamar de verdadeira ciência, pois assim ele dá seguimento à sua tese: Com efeito, o verdadeiro e o verossímil são apreendidos pela mesma faculdade. Que se observe também que os seres humanos são, por natureza, suficientemente inclinados para o verdadeiro e geralmente atingem de fato a verdade. Assim, está-se em condição de alcançar as probabilidades pelo meio que vos concede a possibilidade de conhecer a verdade. Isto posto, a retórica se apresenta como uma das chaves para o conhecimento dentro do contexto da filosofia na Grécia antiga, já que se trata de uma arte que está fundamentalmente ligada com a lógica e a dialética, de tal modo que o filósofo grego chega ao ponto de se equiparar o domínio da arte da retórica com a verdade. Importante salientar, ademais, que Aristóteles (Ret, 1, 1355a 21) procura ligar esta arte não somente com os valores éticos, mas também com a verdade, afirmando que "a retórica é útil porque o justo tem naturalmente mais valor do que seus opostos". Dessa forma, segue-se à mesma conclusão de Berti (1998, p. 173) sobre o problema filosófico tratado na obra aqui em estudo, em que a "retórica, sendo estruturalmente análoga à dialética, é indiretamente, isto é, por meio desta última, análoga também à ciência, ou seja, à filosofia". Portanto, neste trabalho pretendemos abordar o problema filosófico que Aristóteles coloca sobre a retórica na sua obra homônima, ao mencionar que se trata de uma arte que pertence à dialética, logo, carregada de estruturas racionais análogas às da lógica. Dessa forma, a arte da retórica, ainda que não seja propriamente uma ciência, mostra-se como uma chave primordial para o domínio de qualquer ciência, dada a sua estrutura essencialmente lógica, sem a qual não pode ser estudada fora dos moldes dialética, sendo fundamental para o conhecimento da verdade, e, assim, ela é equiparada com o conhecimento filosófico. # IV. Fundamentação da Hipótese A arte da retórica apresenta uma relação intrínseca com a dialética, e, por conseguinte com a lógica. Aristóteles apresenta novamente essa vinculação com ambas nos Tópicos (ARISTÃ?"TELES 2016, I, 100a 18-20) 2 O propósito deste estudo é descobrir um método que nos capacite a raciocinar, a partir de opiniões de aceitação geral, , quando assim escreve: Volume XXII Issue I Version I 24 ( ) acerca de qualquer problema que se apresente diante de nós e nos habilite, na sustentação de um argumento, a nos esquivar da enunciação de qualquer coisa que o contrarie. Não obstante, ainda é possível notar a analogia entre a estrutura dos silogismos e dos entimemas, já que compartilham tanto seus respectivos pontos de partida quanto a sua finalidade, isto é, a verdade partindo de opiniões de ampla aceitação. Aristóteles revela esse paralelismo pouco adiante no seguinte trecho ainda dos Tópicos (Orga, I, 100a 25-30): O silogismo é um discurso argumentativo no qual, uma vez formulada certas coisas, alguma coisa distinta destas resulta necessariamente delas pura e simplesmente. O silogismo é demonstração quando procede de premissas verdadeiras e primárias ou tais que tenhamos extraído o nosso conhecimento original delas através de premissas primárias verdadeiras. O silogismo dialético é aquele no qual se raciocina a partir de opiniões de aceitação geral. Isto posto, retomando a obra da Retórica, notase que o próprio filósofo grego aplica esse modo de pensar à arte da persuasão, inferindo, dessa forma, que as estruturas da lógica e da retórica são essencialmente as mesmas -apenas com a leve diferença que a retórica é voltada para a persuasão, isto é, está atrelada à um fim prático. Assim lemos na Retórica de Aristóteles (Ret, 1, 1355a, 29-38): Além disso, é necessário estar capacitado a empregar a persuasão, tal como os silogismos podem ser empregados, nos lados opostos de uma questão, não para nos dedicarmos indiscriminadamente a ambas as operações (uma vez que não devemos levar as pessoas a crer no que é incorreto), mas para que possamos ver com clareza o que são os fatos e, no caso de outrem argumentar sem justeza, seremos capazes de destruir sua argumentação. Nenhuma outra arte tira conclusões contrárias por meio do silogismo, exceto a dialética e a retórica, uma vez que ambas têm por objeto os contrários. Entretanto, os fatos subjacentes não têm valor idêntico, pois sempre aquilo que é verdadeiro e naturalmente melhor presta-se melhor ao silogismo e está mais sujeito à persuasão, expressando-se nos termos absolutos. Dado o que foi exposto até esse ponto, podese notar que o estudo da retórica é inseparável do estudo da dialética, e, por consequência, da lógica. Logo, resta clara a tese de Aristóteles de que a tal arte, mesmo visando um fim pragmático, consiste em um poderoso instrumento para a aquisição do conhecimento, justamente porque está ligada com as estruturas do pensamento lógico e dialético. Ademais, Abbagnano (2007 p. 856) escreve em seu dicionário de filosofia que foi Aristóteles quem conferiu a identificação da retórica com a filosofia, justamente ao atribuir sua íntima relação com a dialética. Então, pode-se notar que, ainda que o Estagirita tivesse a pretensão de defender que a verdadeira arte retórica não pode ser separada do verdadeiro, e, igualmente, quanto ao conteúdo, estar fundada sobre os valores políticos e éticos, tal como explicado na seção anterior, a arte da retórica está fundada nas mesmas bases que são inerentes ao conhecimento, isto é, a dialética e as estruturas lógicas do pensamento. De modo similar, Ross (1995, p. 284) chama atenção para essa característica da retórica, afirmando que muitos outras tradados sobre o tema já foram produzidos antes de Aristóteles -revelando simultaneamente o prestígio da oratória na cultura da Grécia antiga -, porém, todas as obras precedentes negligenciaram o elemento argumentativo e lógico do discurso, apelando em última instância para as emoções dos ouvintes. Assim, o Estagirita muda o curso dos estudos sobre a retórica, pois, doravante, trata-se de uma arte na qual suas estruturas lógicas são úteis também para o conhecimento das demais ciências. Isto é significativo, já que Aristóteles procura vincular a retórica, arte valiosa em toda a filosofia antiga, não apenas com os princípios éticos e políticos, como também está necessariamente vinculada com o conhecimento e com a verdade. No entanto, ao concluir suas reflexões, Ross (1995, p. 289-290) argumenta que a obra da Retórica parece à primeira vista uma crítica literária com uma estrutura lógica em segundo plano e acrescenta que, a fim de compreender a referida obra, é essencial ter em mente sua finalidade prática, frisando que não se trata de um trabalho teorético e sim um manual para os oradores, ainda que o assunto interessasse profundamente os gregos, e acrescenta que o conteúdo da obra é aplicável somente ao contexto da Grécia antiga. O professor inglês finaliza, enfim, defendendo a tese de que hoje a retórica goza de um prestígio inferior, e isso ocorre devido ao fato de que os oradores preferem confiar na própria experiência, de um lado, e de outro, os ouvintes sentem-se envergonhados de serem arrastados por uma boa retórica. Em direção contrária a essa, os argumentos de Reale (2013, p. 174, grifos do autor) a esse respeito se mostram mais coesos com o teor da obra de Aristóteles, justamente refutando Ross. Em seu texto, assim lê-se: Todavia, parece-nos que se prescindirmos dos quadros socioculturais e ético-políticos, que têm pouco em comum com os modernos, e do elemento referente ao conteúdo, e se consideramos apenas o aspecto formal, a retórica aristotélica conserva ainda um elemento de validez. De fato, o problema básico da retórica aristotélica é esse: quais são os mecanismos, ou seja, as estruturas lógicas que sustentam as formas dos discursos (das mensagens) que visam persuadir. E se é verdade que hoje são a publicidade e a propagando que visam persuadir, não é menos verdade que a pergunta aristotélica conserva intacto o seu sentido, se aplicada àquelas. Diremos mais: não só tem sentido a pergunta aristotélica se aplicada a essas novas formas de persuasão, mas pensando bem, a resposta leva a conclusões análogas às que chegou Aristóteles. Portanto, percebe-se que a obra da Retórica conserva sua validez nas suas próprias bases de raciocínio, bem como trata-se de uma arte, ou técnica no sentido grego da palavra, em que está atrelada a elas o estudo da lógica e da dialética, de tal forma que a retórica se torna análoga ao conhecimento, logo, também à verdade. Dessa forma, o estudo da retórica, dentro do contexto da filosofia da Grécia antiga, é imprescindível para que se possa adquirir o conhecimento em qualquer ciência, dada a sua vinculação inevitável com a dialética. # Bibliografia Doravante, neste texto, vamos nos referir à obra Retórica, de Aristóteles edição 2011 da seguinte forma: Ret, seguida da numeração universal. Doravante, neste texto, vamos nos referir à obra Ã?"rganon, de Aristóteles edição 2016 da seguinte forma: Orga, seguida da numeração universal. () * Dicionário de filosofia NicolaAbbagnano 2007 5 São Paulo, Martins Fontes * Tradução para o português de Edson Bini Aristóteles Retórica 2011 São Paulo * Tradução para o português de Edson Bini Aristóteles Ã?"rganon 2016 3 ed. São Paulo * As razões de Aristóteles. 2 ed. São Paulo EnricoBerti 1998 Loyola * Introdução à história da filosofia antiga. Volume I. 2 ed. São Paulo, Companhia das letras MarilenaChauí 2002 * WernerJaeger Paideia Die Formung des griechischen Menschen. 5 Auflage Walter de Gruyter 1973 * GiovanniReale Aristóteles IV. 2 ed São Paulo: Loyola 2013 * Léxico da filosofia grega e romana GiovanniReale 2014 Loyola IX São Paulo * SirRoss AristotleDavid 1995 New York, Routledge 6th ed