Introdução: Um Moinho Que Se Refez nicio este artigo de forma pouco usual, com uma advertência. A referência a Karl Ponalyi para refletir sobre a sociedade neoliberal parece, em um primeiro momento, contraintuitiva. Isso porque em "A grande transformação" o autor sugere que a humanidade teria passado para uma nova etapa histórica, em que a sociedade se impõe ao indivíduo. No capítulo final da obra, a reflexão recai sobre o problema da liberdade, ou seja, se a nova sociedade que surge é compatível com a liberdade, na medida em que a grande transformação por que o mundo passara com as duas grandes guerras teria representado o fim do predomínio dos mercados e a ascensão do fascismo e do socialismo como as formas possíveis de organização social. Polanyi não imaginou que a sociedade de mercado, em um novo tipo de liberalismo, voltaria a predominar, com a reorganização de um sistema autorregulável de mercados em plano global, que predomina sobre outras formas de integração político-social, submetendo Estado, natureza e sociedade a seus interesses. Na construção de seu argumento, o autor define a evolução histórica do capitalismo entre os séculos XVIII e XX como um "moinho satânico", em que o mercado, para se expandir, transforma as relações sociais por inteiro. Neste artigo, buscarei desenvolver esse argumento polanyiano para refletir sobre a racionalidade neoliberal no atual momento histórico. Para isso, situo o debate sobre o neoliberalismo no pensamento político brasileiro, e estabeleço o diálogo entre diferentes interpretações do avanço neoliberal a partir dos anos 1980 e a conceituação de Polanyi. Em seguida, há um aprofundamento sobre a dimensão ideológico-cultural do neoliberalismo, pela discussão das abordagens de alguns de seus principais ideólogos -Hayek, Friedman e os ordoliberais -realizada por três autores contemporâneos que analisam o neoliberalismo enquanto racionalidade: Christian Laval, Pierre Dardot e Wendy Brown. Por fim, corroboro a argumentação de Nancy Fraser sobre a importância do referencial teórico polanyiano para analisar o capitalismo contemporâneo, sendo a realidade brasileira exemplificação da importância de uma visão expandida do capitalismo na análise de sua crise. Pretendo, ao apresentar essa reflexão teórica, discutir sua relação com a leitura histórica de Karl Polanyi acerca do liberalismo, com ênfase na construção da ideia do mercado enquanto "moinho satânico" que dissolve o tecido social para se impor enquanto lógica que organiza a totalidade da vida humana. Ao que parece, pelos subterrâneos dos Estados de bem-estar social e das sociedades industriais, um novo moinho se refez, e neste início de século XXI volta a dissolver as relações sociais como um todo na busca desenfreada pela expansão de um mercado que, apesar de produzir quantidade enorme de riqueza, tem como efeito uma nova catástrofe social, expressa pelo aumento da desigualdade, da violência e do individualismo. # II. # Neoliberalismo No Pensamento Político Brasileiro Polanyi não é um autor recorrente nas análises políticas e sociológicas do neoliberalismo no Brasil. No entanto, é possível dizer que sua caracterização do liberalismo pode contribuir com tal discussão, e de como a lógica de uma economia propriamente de mercado passa a fundamentar a integração social. O autor ressalva que "todos os tipos de sociedades são limitados por fatores econômicos", mas no liberalismo isso assumiu um sentido distinto, pois a civilização passou a se basear no lucro, princípio do qual o mercado autorregulável derivou. Esse é um motivo "raramente reconhecido como válido na história das sociedades", e nunca antes elevado à condição de "justificativa de ação e comportamento na vida cotidiana". Em um curto prazo, a humanidade foi submetida à integral influência de uma forma de progresso econômico que alcançou seu aperfeiçoamento "às custas da desarticulação social" (POLANYI, 2000, 47-53). A partir desse referencial é possível discutir alguns elementos do pensamento político brasileiro sobre o neoliberalismo. Não será apresentada uma revisão da literatura, apenas alguns aspectos de uma vasta produção científica, que vai muito além dos autores aqui abordados. A proposta é situar o debate, ressaltando que o pensamento político brasileiro, sobretudo nas décadas de 1990 e 2000, traz elementos que articulam o neoliberalismo com um processo de desarticulação social decorrente da conformação de um mercado autorregulável. Como será exposto a seguir, Chico de Oliveira (1999) foi quem mais se aproximou de uma abordagem propriamente polanyiana dessa problemática. No entanto, diversos autores expõem como a reapropriação do Estado pelo mercado, e seu avanço sobre os processos de interação social, sob o princípio da expansão do lucro, são aspectos centrais do neoliberalismo. Nesse sentido, podemos dizer que, também por aqui, em uma nova forma de liberalismo, o "moinho satânico" se refez, um mecanismo que progressivamente destrói o tecido social e estabelece o primado do mercado sobre a sociedade. As análises sobre o neoliberalismo no Brasil ganharam corpo, sobretudo, ao longo dos anos 1990, mas remontam ao período de crise do desenvolvimentismo e de sua superação por um novo programa econômico-social. Na década de 1980, acirra-se a disputa entre dois projetos distintos, cada um com seu diagnóstico da recessão, do desemprego e da crise fiscal. De um lado, situou-se o discurso neoliberal, "que pregava a austeridade financeira, o saneamento do déficit público, maior abertura para o capital estrangeiro, aumento das exportações, privatização das empresas públicas e redução acentuada do papel econômico do Estado". De outro, "o discurso desenvolvimentista, fruto da união entre parcelas da elite empresarial e economistas críticos", que propunham uma política de enfrentamento aos ditames do FMI pela defesa da "negociação soberana da dívida", com o reescalonamento da dívida interna, articulação "estreita" entre capital industrial e bancário, e intervenção estatal pelo planejamento, dentre outras medidas (CRUZ, 1997, pp. 59-60). Naquela década, ocorreu "uma enorme transferência líquida de recursos para o exterior, principalmente em função do serviço da dívida externa". Frente a isso e à permanente instabilidade política, o governo federal passa a adotar, entre os anos de 1983 e 1987, diferentes "ensaios ortodoxos e heterodoxos de enfrentamento da crise econômica" (SALLUM JR, 1999, p. 26). Somou-se a isso a pressão internacional sobre os governos latino-americanos para que abandonassem suas políticas desenvolvimentistas e se realinhassem em torno de uma plataforma neoliberal, algo que interessava aos grandes bancos brasileiros. "A Fenaban e a Febraban vinham defendendo a privatização, a abertura comercial e outros pontos da plataforma neoliberal como solução para o país". À época, já se atribuía "todos os problemas econômicos -a começar pela elevação da taxa de inflação -ao déficit público" (BOITO JR, 1999, p. 117). Dentre os diferentes fatores que conformavam uma situação político-econômica nova, destacam-se a pressão dos países centrais para abertura comercial, a transição econômica de renovação tecnológica, a mudança na governança corporativa e na relação capital-trabalho, a transnacionalização, e, internamente, a emergência de um movimento popular e sindical combativo, orientado por um projeto político antagônico, o democrático-participativo (SALLUM JR, 1999; CRUZ, 1997). Tal disputa se expressou na campanha eleitoral de 1989, quando o país "ficou dividido entre o discurso 'liberal social' de Fernando Collor de Mello e o discurso popular e democrático de Lula e do Partido dos Trabalhadores" (PAULANI, 2010, p. 119). Deste embate, prevaleceram as propostas de que "as reformas liberalizantes recolocariam o país no eixo do crescimento". O programa abordava a necessidade de "desestatização da economia", de transparência nos gastos públicos e de "caça aos marajás", que propalava os supostos "privilégios" do funcionalismo público no Brasil (PAULANI, 2010, p. 119). Por isso, Cruz (1997) sintetiza como fatores que contribuíram para o avanço neoliberal no país, a partir da segunda metade da década de 1980, a derrota do movimento pelas Diretas Já, o fracasso do Plano Cruzado e a pressão dos países do centro do capitalismo, sobretudo dos EUA, para abertura comercial (CRUZ, 1997). Boito Jr (1999) acrescenta a vitória de Collor em uma campanha polarizada, que unificou a burguesia em torno de uma candidatura com plataforma neoliberal (BOITO JR, 1999, p. 119). Conforme apontam Cruz (2007) e Dagnino et al (2006), a forma de implementação e o conteúdo do projeto neoliberal variam nos diferentes países, mas possuem como elementos comuns a privatização de setores estatais e abertura comercial, por exemplo. Por aqui, as estatais privatizadas passaram a ser controladas pelo capital financeiro internacional. Em outras nações, como na Índia, manteve-se uma forte presença da burguesia interna na atividade econômica. Tal variação remonta às condições socioeconômicas e, sobretudo, políticas, que o programa neoliberal encontra e logra impor em cada país (CRUZ, 2007;e DAGNINO et al, 2006). No entanto, os autores afirmam a existência de um projeto neoliberal propriamente dito, uma forma contemporânea de organização do capitalismo, que têm como centro a redefinição do papel do Estado na economia e na política social. Há maior participação do Estado no que se refere à condução da financeirização da economia -controle da taxa de juros, da oferta de moeda no mercado, conversão da dívida externa em interna e consequente política de emissão de títulos da dívida e de controle de seu preço pela taxa de juros e de câmbio, dentre outros mecanismos -, e retração no que se refere à regulamentação da relação capitaltrabalho e oferta de serviços públicos para efetivação de direitos sociais e econômicos (BOITO JR, 1999; A abordagem de Armando Boito Jr se ancora na concepção de Duménil e Levy (2014), que divergem da categoria "projeto" enquanto definidora do neoliberalismo, concebendo-o como uma "fase" do capitalismo, que expressa a recuperação "do poder e da renda das classes capitalistas", com a hegemonia financeira. O neoliberalismo é definido como uma ofensiva das burguesias sobre as classes trabalhadoras, tendo como força hegemônica as burguesias financeiras, que avançam também sobre os interesses de frações de classe das burguesias internas dos países de capitalismo dependente. Este elemento contrapõe, no caso brasileiro, o neoliberalismo à política dos anos de Ditadura Militar, na medida em que o financismo combateu a industrialização e as medidas protecionistas do mercado interno adotadas pelos militares, ainda que estas não buscassem a soberania nacional. Pelo contrário, seguiram diretamente atreladas a interesses do centro do capitalismo, e justamente por isso reafirmavam uma economia voltada ao mercado externo. Tais esforços de definição e interpretação do neoliberalismo no Brasil enfocam, sobretudo, a agenda macroeconômica governamental. Isso prevaleceu nas definições do período subsequente. No início dos anos 1990, lembra Paulani (2010), a agenda neoliberal colocou como saída para o problema da dívida externa e do processo inflacionário a "securitização dessa dívida e a internacionalização do mercado brasileiro de títulos de dívida pública, além da liberalização do fluxo internacional de capitais" (PAULANI, 2010, p. 120). Os bancos centrais se converteram no mais importante "instrumento garantidor de preços, revertendo sua posição subordinada em relação aos Ministérios das Finanças e tornando-se uma instituição-chave na elaboração e implementação das políticas estatais" (NOVELLI, 2001, p. 191). No Governo Itamar (PRN/PMDB -1992-94), o BC deu início à "desregulamentação do mercado financeiro brasileiro", ao abrir a possibilidade de "qualquer agente, fosse ou não residente, enviar livremente recursos ao exterior, bastando, para tanto, depositar moeda doméstica na conta de uma instituição financeira não residente" (PAULANI, 2010, p. 121). Ao assumir a presidência, FHC acelera tal processo, a partir da concretização de um plano de "privatizações e de uma abertura substancial da economia". Assim, compõem seu programa neoliberal medidas como: câmbio flutuante, após uma valorização inicial da moeda que culminou na "crise cambial de janeiro de 1999, que em apenas quatro meses varreu do país cerca de US$ 40 bilhões"; meta fiscal, com aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, em que "os direitos dos credores são colocados acima de quaisquer outros direitos"; venda "ao capital internacional (financiando os compradores com dinheiro público)" de empresas de setores essenciais e estratégicos, tais como energia elétrica, telecomunicações e mineração; elevação da taxa de juros a níveis que chegaram a mais de 40% ao ano; e a isenção de imposto de renda à "distribuição de lucros de empresas a seus sócios brasileiros ou estrangeiros e à remessa de lucros ao exterior" (PAULANI, 2010, p. 120-2). É interessante observar a exposição que o próprio FHC faz de seu programa em artigo publicado em 1998, "Notas sobre a reforma do Estado", em que o afirma como de "reconstrução do Estado". O expresidente defende que, "respeitadas as limitações do mercado", é preciso construir uma "ação pública" cada vez mais ampla e eficaz "do que a ação estatal" (CARDOSO, 1998, p. 7). Cabe ao governo promover reformas que deem "higidez fiscal ao Estado", por meio da "manutenção da estabilidade econômica, pelo equilíbrio orçamentário e pela criação de mecanismos que tornassem transparentes as contas", por processos como a renegociação da dívida, "flexibilização dos monopólios", privatizações e "concessão de serviços públicos à iniciativa privada" (CARDOSO, 1998, p. 9). Assim, ainda que não use tais palavras, há uma defesa da maior participação do Estado na financeirização da economia, e menor participação, em favor do mercado, na efetivação das políticas sociais. Também Bresser-Pereira (1998) define a política daquele momento como de "reconstrução do Estado", ressaltando que "a oferta de serviços sociais será entregue, também de forma competitiva, não a empresas privadas, mas a organizações públicas não estatais", de modo que o Estado se torna "financiador em vez de produtor dos Apesar dessa literatura não fazer referência direta a Polanyi, entendo que é possível recorrer a seu aporte teórico para caracterizar o período e, mais do que isso, analisar algumas das principais contribuições teóricas dos autores aqui abordados. Lembremos que, com os conflitos crescentes entre empresariado e governo no período Sarney, que se deram em torno do controle de preços pelo Plano Cruzado, e com o maior descontentamento das classes médias com o retorno da inflação, "a crítica neoliberal toma a ofensiva". A partir de meados de 1987, o governo Sarney passa a dar vazão aos interesses neoliberais e adota medidas para ampliar o processo de abertura econômica, conjugando a supressão de entraves burocráticos com flexibilidade à entrada de capital estrangeiro. Para isso, fundamentou-se em um discurso que retomou termos clássicos do liberalismo econômico, em reação ao descrédito das teses heterodoxas. Esse foi um momento em que se travou "uma batalha decisiva no plano ideológico" (CRUZ, 1997, p. 75). A reorientação neoliberal da política econômica ao longo das últimas décadas do século XX foi acompanhada por uma desconstrução do referencial desenvolvimentista, que respondia aos desafios de consolidar um capitalismo nacional pela relação entre Estado e classes burguesas, com a localização dos conflitos distributivos no Estado, e sua solução por uma política econômica estatal resultante desses embates em seu interior. Com o avanço neoliberal, em contraposição, o discurso que se torna hegemônico passa a recorrer "incansavelmente à figura mitologizada do mercado autorregulado, denunciando a intervenção do Estado como a origem de todas as mazelas que acometiam a economia nacional", ainda que, na consecução do projeto neoliberal, fosse necessário um Estado ativo e estruturante (CRUZ, 1997, p. 93). No plano do discurso, parcelas significativas do empresariado combatiam "o intervencionismo estatal", clamavam "por desregulamentação, por uma melhor acolhida ao capital estrangeiro, por privatizações" (SALLUM JR, 1999, p. 26). Nesse processo, o papel do Estado vem para o primeiro plano do embate ideológico, e não se trata aqui de "menos" Estado, mas de qual deve ser sua orientação, como fica explícito nas posições de Cardoso (1998) e Bresser-Pereira (1998). Entendo que a reorientação por que passou o Estado brasileiro nos planos econômico, social e ideológico, analisada pelos autores aqui apresentados, remete à interpretação polanyiana do liberalismo. Houve, nas versões clássica e nova de liberalismo, uma mudança de princípio motivador da ação humana: "a motivação do lucro passa a substituir a motivação da subsistência. Todas as transações se transformam em transações monetárias e estas, por sua vez, exigem que seja introduzido um meio de intercâmbio em cada articulação da vida industrial". A orientação estatal como forma de integração social deve, nesse contexto, garantir as condições para que todas as rendas derivem da venda de uma mercadoria, seja ela a própria força de trabalho, a terra (natureza) ou o dinheiro. Assim, "qualquer que seja a verdadeira fonte de renda de uma pessoa, ela deve ser vista como resultante de uma venda. É isto o que significa o simples termo 'sistema de mercado'", que sintetiza o novo padrão institucional e, uma vez estabelecido, deve funcionar sem qualquer interferência externa. "Os lucros não são mais garantidos e o mercador tem que auferir seus lucros no mercado. Os preços devem ter a liberdade de se autorregularem. É justamente esse sistema autorregulável de mercados o que queremos dizer com economia de mercado" (POLANYI, 2000, p. 60). Assim como na versão clássica do século XIX, o neoliberalismo do final do século XX no Brasil coloca o primado do mercado como eixo reorganizador não apenas da economia, mas das relações sociais como um todo, com a transferência de sua lógica própria para a redefinição do papel do Estado e da sociedade civil (SILVA, 2016). Por esse caminhar analítico, a ciência política brasileira aproximou-se do debate atual do neoliberalismo enquanto nova razão do mundo. Duas interpretações desse processo histórico, elaboradas na virada dos anos 1990 para os anos 2000, apontam para esse sentido: o conceito de "confluência perversa" de Evelina Dagnino e as formulações de Chico de Oliveira acerca do neoliberalismo, sendo este um autor pioneiro em utilizar a tese contida em "A Grande Transformação" para definir a existência de um "totalitarismo neoliberal". Nos escritos de Dagnino, a dimensão mais propriamente ideológico-cultural vem para o primeiro plano na análise do neoliberalismo. A partir dos anos 1990, as ideias de eficiência e modernização passam a legitimar o mercado como organizador da vida social e política como um todo, transformando o Estado, no que se refere à política social, em provedor de serviços sob gestão privada, e o cidadão em cliente. No entanto, ressalta a autora, "o projeto neoliberal encontra no Brasil um contendor relativamente consolidado, embora evidentemente não hegemônico, capaz de constituir um campo de disputa", o projeto "democráticoparticipativo" dos movimentos populares, que nos anos 1980 passaram por um processo de ascensão. Tal contexto impôs "direções específicas às estratégias e formas de atuação das forças vinculadas ao projeto neoliberal" (DAGNINO, 2004, p. 99). A caracterização da reforma de Estado como construção de um "Estado social-liberal" é exemplo disso, pois compõe o esforço de interlocução do neoliberalismo com o discurso participativo e democratizante das forças democráticopopulares. Volume XXI Issue II Version I 16 ( ) Noções como participação, cidadania e sociedade civil, que compuseram o projeto político democratizante do Estado, passam a ser apropriadas e redefinidas pelo projeto neoliberal, que se vale de um referencial comum para implementar políticas antagônicas às que os termos anteriormente se referiam. Tal processo histórico é próprio de uma "confluência perversa" entre dois projetos distintos: houve uma ressignificação de referências comuns, deslocadas de seu sentido originário, "de modo a garantir seu papel de orientar práticas adequadas à implementação dos objetivos do projeto neoliberal". Para se legitimar socialmente, o neoliberalismo mobiliza "mesmas palavras e referências, mas seu significado já é outro, ainda que essas diferenças não se explicitem com clareza, o que precisamente torna perversa a confluência". Trata-se da operacionalização de deslocamentos de sentido que obscurecem o conflito presente entre projetos distintos de sociedade. A despeito de apontarem para direções antagônicas, há um referencial comum na análise e definição das práticas sociais e políticas (DAGNINO et al, 2006, p. 55). Assim, pode-se afirmar que houve uma disputa em relação aos significados da democratização brasileira, e como resultado dessa disputa, sua adequação, pelo projeto neoliberal, a um modelo de Estado que "se isenta progressivamente de seu papel de garantidor de direitos". No que se refere à cidadania, as "redefinições neoliberais" reduzem sua dimensão coletiva a "um entendimento estritamente individualista". Ao mesmo tempo, opera-se uma "conexão entre cidadania e mercado", de modo que "tornar-se cidadão passa a significar a integração individual ao mercado, como consumidor e como produtor". Promove-se um deslocamento da noção de cidadania à gestão da pobreza, com um "apelo à solidariedade" que a restringe "à responsabilidade moral da sociedade, bloqueando a sua dimensão política e desmontando as referências à responsabilidade pública e ao bem público" (DAGNINO, 2004, pp. 106-7). Desse modo, o eixo central da redefinição "é a diluição precisamente daquilo que constitui o núcleo da concepção de cidadania, a ideia de direitos universais" (DAGNINO et al, 2006, p. 56). De modo concomitante, houve um progressivo deslocamento da noção de "sociedade civil". De um lado, promoveu-se a valorização do "Terceiro Setor" e da filantropia. De outro, a criminalização de movimentos sociais que mantêm como estratégias a realização de protestos e ocupações de propriedades que não cumprem sua função social. Nesse processo, a noção ampla de sociedade civil a que o projeto democráticoparticipativo remetia teve seu sentido deslocado em direção de uma concepção restrita a um conjunto específico de organizações mais próximas do mercado. A noção de participação acompanha essa mesma direção, ao ser reduzida ao "trabalho voluntário" e à responsabilidade social de indivíduos e empresas. "O princípio básico aqui parece ser a adoção de uma perspectiva privatista e individualista" de participação, de forma a "substituir e redefinir o significado coletivo" a que o termo remetia. Promove-se, com isso, uma "despolitização da participação" e uma dupla restrição do participar: é ação restrita às organizações consideradas "legítimas" a que o novo significado de sociedade civil remete, e também à execução de políticas públicas, excluindo-se o poder decisório. "O significado político crucial da participação é radicalmente redefinido e reduzido à gestão". A ênfase gerencialista e empreendedorista transita entre as áreas da administração privada e estatal, de modo que o deslocamento de sentido de participação a afasta daquilo que é central no projeto democráticoparticipativo, a efetiva partilha de poder (DAGNINO, 2004, pp. 100-3). É desse modo que o projeto neoliberal opera "com uma concepção minimalista tanto da política como da democracia", pela redução do espaço político, de seus participantes e sua incidência (DAGNINO, 2004, pp. 106-8). Trata-se de uma visão "que reage contra a ampliação da política" contida nas demandas dos movimentos populares, traduzindo-se em seu inverso: "a redução dos terrenos, sujeitos, temas e processos considerados como constituidores da política", circunscritos aos limites da representação. "Em contraposição a uma concepção que reconhece a centralidade do conflito e da democracia como a melhor forma para tratá-lo, essa visão minimalista se esforça na sua invisibilidade e no seu confinamento, quando não no seu tratamento tecnocrático e gerencial" (DAGNINO et al, 2006, pp. 58-60). Apesar de a autora não recorrer a Polanyi, é possível estabelecer relações entre ambos. Os "deslocamentos de sentido" são expressões de como o sistema econômico, uma vez controlado pelo mercado, tende a expandir seus princípios como orientadores da organização política e social como um todo. "Em última instância, é por isto que o controle do sistema econômico pelo mercado é consequência fundamental para toda a organização da sociedade: significa, nada menos, dirigir a sociedade como se fosse um acessório do mercado". Ao invés de a economia estar orientada pelas relações sociais, é a sociedade que, progressivamente, é "embutida" no sistema econômico. O fator econômico ganha, aqui, importância vital para a existência da sociedade, e o sistema econômico passa a ser organizado em instituições separadas, com um "status especial", a partir do qual organiza as relações políticas e sociais. "A sociedade tem que ser modelada de maneira tal a permitir que o sistema funcione de acordo com as suas próprias leis. Este é o significado da afirmação familiar de que uma economia de Volume XXI Issue II Version I 17 ( ) mercado só pode funcionar numa sociedade de mercado" (POLANYI, 2000, p. 77). Os "deslocamentos de sentido" são, assim, algumas das expressões de como o mercado, sob o neoliberalismo, modela a sociedade e o Estado de acordo com seus próprios interesses e suas leis. Nos escritos de Chico de Oliveira essa fundamentação ganha centralidade, em sua teorização sobre o "modo de produção social-democrata". Oliveira foi "autor pioneiro" na utilização da tese de Polanyi "a fim de interpretar a encruzilhada nacional: socialdemocracia ou neoliberalismo?" (QUERIDO & BRAGA, 2018, p. 14). O autor recorre à formulação polanyiana de que, frente ao avanço do mercado sobre todas as esferas da vida, inevitavelmente, a sociedade tomaria medidas para se proteger, sendo o surgimento do "antivalor" uma de suas expressões. No entanto, repõese um dilema na relação sociedade-mercado: quaisquer sejam essas medidas, "elas prejudicariam a auto-regulação do mercado, desorganizariam a vida industrial e, assim, ameaçariam a sociedade mais de uma maneira". Isso se desdobrou no "desenvolvimento do sistema de mercado numa trilha definida e, finalmente, rompeu a social que nela se baseava" (POLANYI, 2000, p. 18). A tese neoliberal, no entender de Oliveira (1988), é a de que os controles institucionais próprios do Estado de bem-estar social chegaram a um limite que ameaça a própria acumulação de capital, inviabilizando o crescimento. Entendem os liberais que o "limite do capital e? o próprio capital". No entanto, afirma Oliveira recuperando a formulação propriamente polanyiana, "essa voracidade" do capital não pode ser entregue a si mesma, "sem controles públicos, sob pena de transformar-se numa tormenta selvagem na qual sucumbiriam juntos a democracia e o sentido de igualdade nela inscrito desde os tempos modernos. Não deve escapar a? observação que, em países como os EUA, o tamanho crescente da pobreza ja? e? um risco real nesse sentido" (OLIVEIRA, 1988, p. 27). Com o avanço neoliberal no Brasil e episódios como a forte repressão do governo FHC sobre a greve dos Petroleiros em 1995, o "receio polanyiano manifestado no final dos anos 1980 parecia se concretizar". Ao se ancorar na chantagem e no medo, a destituição dos direitos é "imposta como necessária à adequação à racionalidade instrumental da globalização", na passagem de uma "hegemonia burguesa 'incompleta' para um verdadeiro 'totalitarismo neoliberal', em que a fala do oponente é deslegitimada antes mesmo do conflito emergir" (QUERIDO & BRAGA, 2018, p. 17). Na conceituação de um "totalitarismo neoliberal", Oliveira (1999) novamente recorre à teoria social de Polanyi, ao estabelecer a correlação entre o avanço da autorregulação do mercado e os processos de subjetivação na contemporaneidade. Isso está presente na ideologia neoliberal de "volta ao indivíduo", que é reduzido à "prevalência exclusiva do mercado como a única instituição reguladora, autorreguladora tanto da alocação dos recursos econômicos como das relações sociais e da sociabilidade em sentido geral". Também está presente na redução ao privado, expressa por uma "intensa subjetivação" da acumulação, concentração e centralização do capital. Seu paradigma é a "globalização, que expressa a privatização do público, ou, ideologicamente, uma experiência subjetiva de desnecessidade, aparente, do público" (OLIVEIRA, 1999, pp. 55-7). Dessa forma, seja por mecanismos como a exclusão da fala do oponente acima descritos, seja por um quadro de violência que "é produzida pelos próprios aparelhos de Estado", o avanço neoliberal promove "a privatização do público, e, no seu rastro", a anulação da política. É justamente nessas condições que o neoliberalismo passa "por uma estranha metamorfose: sua face real é a do totalitarismo" (OLIVEIRA, 1999, p. 81). Pode-se dizer, com base nisso, que o "moinho satânico" é refeito, em uma forma nova de liberalismo, que tritura por completo a sociedade pela anulação do dissenso, dissimulação do conflito e confinamento da política ao interesse exclusivo do mercado. # III. # A Razão Neoliberal O fim da perspectiva reformista de matriz social-democrata que acompanhará a obra de Chico de Oliveira nos anos 2000, em que o "totalitarismo neoliberal" avança e se apropria de todas as formas de "antivalor", caracteriza também o olhar de parte da literatura internacional sobre o tema, principalmente pós-crise de 2008. Aqui, pretendo expor uma discussão que coloca em evidência justamente a dimensão subjetiva desse processo. No neoliberalismo, uma nova razão organiza a ação humana e, assim como no liberalismo clássico, está fundada na ficção da mercadoria, que "oferece um princípio de organização vital em relação à sociedade como um todo, afetando praticamente todas as suas instituições, nas formas mais variadas". O significado disso é a impossibilidade de "qualquer entendimento ou comportamento que venha a impedir o funcionamento real do mecanismo de mercado" (POLANYI, 2000, p. 94). Essa visão do liberalismo enquanto concepção de mundo, conjunto de crenças e interesses, como racionalidade social que orienta os sujeitos de diferentes classes, perfaz o esforço reflexivo de Wendy Brown (2019) e Dardot e Laval (2016). Suas obras se apoiam no pensamento de Hayek, Friedman e dos ordoliberais para refletir sobre a "nova razão do mundo" que expressa as relações de hegemonia conformadas nas últimas décadas. Nas referidas obras, há uma mesma problemática acerca da dimensão ideológico-cultural Volume XXI Issue II Version I 18 ( ) do neoliberalismo, em abordagens que partem dos principais ideólogos neoliberais. Porém, enquanto Brown (2019) busca decifrar a razão que articula a moralidade tradicional ao neoliberalismo nas novas formas autoritárias de exercício de poder, Dardot e Laval (2016) dirigem o olhar para a lógica concorrencial que passa a mediar as relações sociais como um todo, não mais restrita ao mercado. A análise das relações entre neoliberalismo e pensamento moral autoritário-conservador é especialmente importante, pois revela uma reorientação de percurso do projeto neoliberal. Na acepção de Nancy Fraser, o "neoliberalismo progressista" resultou de uma articulação entre a agenda financista e a dos movimentos identitários em luta por reconhecimento. Justamente por isso, à redução de direitos na esfera do trabalho se combinou um avanço nos direitos mais relacionados à luta feminista e por igualdade racial, por exemplo. No atual contexto de rompimento com tal forma de neoliberalismo, em uma versão mais autoritária da dominação financeira, vêm para o primeiro plano as concepções originais da ideologia neoliberal, com ênfase em Hayek e Friedman. "Para Hayek, o mercado e a moral, juntos, são o fundamento da liberdade, da ordem e do desenvolvimento da civilização". Desse modo, há um ataque combinado à sociedade e à justiça social "em nome da liberdade de mercado e do tradicionalismo moral" (BROWN, 2019, p. 23). Em Hayek, as noções de sociedade e justiça social dão base para o totalitarismo, pois obstruem as tradições e as liberdades, conceitos que, por sua vez, levam ao progresso. As ideias de justiça social e Estado social, que alicerçaram o Estado de Bem-Estar dos Trente Glorieuses, seriam, no pensamento hayekiano, fundamentos de uma intervenção estatal ilimitada nos mercados e nos códigos morais, com "uma tendência peculiar de autoaceleração" (HAYEK, 1973). Fala-se não apenas de "justiça social", mas também de "democracia social", "economia social de mercado" e "Estado de direito social" (ou soberania social da lei -em alemão sozialer Rechtsstaat); e, embora justiça, democracia, economia de mercado e Estado de direito sejam expressões de sentido absolutamente claro, a adição do adjetivo "social" as torna suscetíveis de designar quase qualquer coisa que se queira (HAYEK, 1973, p. 90). Quanto mais se vê que a posição de indivíduos ou grupos torna-se dependente de ações do governo, mais eles insistirão em que os governos visem algum esquema reconhecível de justiça redistributiva; e quanto mais os governos tentam realizar algum padrão preconcebido de distribuição desejável, mais eles devem sujeitar a posição dos diferentes indivíduos e grupos ao seu controle. Enquanto a crença na "justiça social" governar a ação política, esse processo deverá se aproximar mais e mais de um sistema autoritário (HAYEK, 1973, p. 68). Os postulados neoliberais assim formulados visam legitimar um "certo tipo de intervenção governamental", em favor do mercado. Deve-se manter um cuidado permanente, pois a intervenção política é cumulativa, de modo que qualquer forma de intervenção tem de preservar as ordens espontâneas de mercado. A não preservação se expressa pela intervenção política no domínio da espontaneidade que, "uma vez iniciada, leva necessariamente à coletivização total da economia e ao regime policial totalitário, já que é preciso adaptar os comportamentos individuais aos mandamentos absolutos do programa de gestão autoritária da economia" (DARDOT & LAVAL, 2016, p. 77). Conforme nos explica Brown (2019), tal concepção hayekeana de justiça social teve desdobramentos no "neoliberalismo realmente existente". Epistemologicamente, houve até mesmo a negação da existência da sociedade. Politicamente, expressa-se pelo programa de privatização e desmonte do Estado social. Legalmente, promoveu a liberdade de grupos e indivíduos na contestação do conceito de igualdade como fundamento jurídico, das proteções sociais, ambientais e laborais. No plano da ética e da cultura, há um questionamento da justiça social pela valoração da autoridade natural dos valores tradicionais, com vistas a "desmassificar" indivíduos e famílias, reconhecendo-os enquanto tal. A esse pensamento que advém de Hayek se soma o ordoliberalismo alemão. "A desmassificação ordoliberal visava combater a proletarização por meio da empreendedorização (logo, da reindividualização) dos trabalhadores, por um lado, e da realocação dos trabalhadores em práticas de autoprovisão familiar, por outro" (BROWN, 2019, p. 49). Com isso, a autora aponta três decorrências sociais dessa forma de neoliberalismo: i) a "empreendedorização", alicerçada na noção foucaltiana de "multidão de empresas" e na concepção de "portifólio de autoinvestimentos" como forma de inserção social do indivíduo; ii) a economia de "compartilhamento" e a terceirização, com o chamado processo de "uberização"; iii) e a delegação, às famílias, das tarefas de prover os dependentes. Assim como Evelina Dagnino, a autora estadunidense afirma que tais decorrências resultam de uma limitação da política, apartando-a "da sua soberania, eliminando sua forma democrática e definhando suas energias democráticas (...). O neoliberalismo busca tanto constringir quanto desdemocratizar o político" (BROWN, 2019, p. 70). Isso garante não apenas um afrouxamento do controle político sobre o mercado e seus atores, mas também a substituição da regulação e das políticas redistributivas por liberdade financeira e direitos de propriedade isentos de taxação. Há uma inversão do processo histórico anterior que visava expandir a noção de política para fundamentar a extensão de direitos. Volume XXI Issue II Version I 19 ( ) A autora aponta, no entanto, diferenças entre os intelectuais neoliberais em relação ao político. Milton Friedman e Friedrich Hayek o concebem enquanto domínio perigosamente autoexpansivo. Já os ordoliberais adotam uma posição mais próxima de Carl Schmitt, com a defesa de um Estado forte o necessário para a ordem e a estabilidade econômicas, sendo a tecnocracia e o distanciamento do processo decisório em relação às políticas econômicas as formas de "proteger" (ou isolar) a economia das demandas democráticas. Ainda assim, "todos consideram as liberdades individuais e o mercado, juntamente com a moralidade tradicional, como elementos ameaçados pelos interesses e poderes coercitivos, ingovernáveis e arbitrários abrigados pelo político" (BROWN, 2019, p. 75). Assim como já referido na exposição do pensamento político brasileiro acerca do neoliberalismo, Brown (2019) enfatiza que os ideólogos do neoliberalismo não buscavam um Estado fraco a que a expressão "Estado mínimo" alude, mas sim limitar seu escopo de atuação e direcionar a institucionalidade para os interesses próprios do mercado, isolando-o das pressões democráticas e pluralistas. Um de seus intelectuais fundadores, Milton Friedman, em "Captalism and Freedom", ressalta a codependência entre as liberdades econômicas e políticas, a "conexão íntima entre economia e política". Porém, o exercício do poder político é ameaçador às liberdades nessas duas esferas. "A ameaça fundamental à liberdade é o poder de coagir, seja nas mãos de um monarca, de um ditador, de uma oligarquia ou de uma maioria momentânea" (FRIEDMAN, 2002, p 15). Aqui, há uma legitimação do autoritarismo político com o intuito de forjar mercados liberalizados, tal como a experiência histórica da ditadura de Pinochet no Chile. Em Hayek, a defesa autoritária se opera de outra forma, pelo combate às noções de "soberania popular" e "sociedade". Nas palavras de Brown (2019), o pensador austríaco entende que "a soberania popular ameaça a liberdade individual, licencia o governo ilimitado e confere supremacia justamente ao domínio que precisa ser controlado, o político". Por sua natureza ilimitada, a soberania é "categoricamente incompatível com um governo limitado e com o 'destronamento da política', ambos necessários para uma ordem econômica e moral florescente". Assim Hayek se diferencia de Friedman, pois não reduz democracia ao liberalismo, mas os distingue afirmando que "o único princípio compartilhado por eles é o da igualdade perante a lei (...). O liberalismo é uma doutrina sobre o que a lei deveria ser, a democracia uma doutrina sobre a maneira de determinar o que será a lei". A democracia é um "método de governo -a saber, o governo da maioria', enquanto o liberalismo 'diz respeito ao escopo e propósito do governo'" (BROWN, 2019, p. 87). São, portanto, fortes as tensões entre ambos, na medida em que a democracia limita o poder político somente pela opinião pública e o liberalismo busca impor limites a todas as formas coercitivas de governo. Acima de tudo, argumenta Hayek, a democracia e o liberalismo têm opostos radicalmente diferentes. O oposto da democracia é o autoritarismo, poder político concentrado, mas não necessariamente ilimitado. O oposto do liberalismo é o totalitarismo, controle total de todos os aspectos da vida. Isso faz com que o autoritarismo seja compatível com uma sociedade liberal -com a liberdade, a moral tradicional, uma esfera privada protegida. E o totalitarismo pode ser engendrado e administrado por maiorias democráticas (BROWN, 2019, p. 88). O desdobramento disso na análise política liberal se opera pela noção de "excessos de democracia". Afirmam os neoliberais que, no Estado de Bem-Estar, há uma substituição das funções familiares; e na concepção de justiça social, há uma repressão à lei moral que lhe seria superior em termos de garantias de liberdades. Em Hayek, enfatiza a autora, o "respeito à propriedade privada, normas de gênero e outras crenças tradicionais" é o verdadeiro fundamento de "uma sociedade livre, moral e ordenada" (BROWN, 2019, p. 90). Também os ordoliberais alemães merecem atenção especial tanto de Dardot e Laval (2016) quanto de Brown (2019). Neste caso, a ideologia se caracteriza pela defesa de um Estado forte e tecnocrático, em uma forma igualmente autoritária de liberalismo. "Os ordoliberais são mais diretos em dissociar a democracia de um Estado limitado por um dispositivo que eles chamam de 'constituição econômica'" (BROWN, 2019, p. 79). A democracia aqui é restrita ao voto e a liberdades pessoais, e ainda assim às esferas representativas não recaem as atribuições de definição da política macroeconômica. No ordoliberalismo, como aponta Foucault no Nascimento da Biopolítica, a originalidade em relação às demais correntes neoliberais está em operar um "duplo circuito" entre Estado e economia. "A economia produz legitimidade para o Estado que é fiador dela" (FOUCAULT, 2010, p. 86). Isso significa que se o Estado fornece "o quadro de um espaço de liberdade dentro do qual os indivíduos podem buscar seus interesses particulares, o livre jogo econômico criará e legitimará em outro sentido as regras de direito público do Estado" (DARDOT & LAVAL, 2016, p. 107). Assim, o problema colocado aos ordoliberais não é "abrir espaço para a liberdade econômica dentro de um Estado existente que já tem legitimidade própria, mas, sim, o de fazer um Estado existir a partir do espaço preexistente da liberdade econômica". Tal liberdade tem como princípio fundamental a concorrência, que garante "os planos espontâneos dos indivíduos". É justamente essa "promoção do princípio Volume XXI Issue II Version I 20 ( ) da concorrência" que acaba por introduzir "um deslocamento importante com relação ao liberalismo clássico, na medida em que o mercado não é mais definido pela troca, mas pela concorrência. Se a troca funciona pela equivalência, a concorrência implica desigualdade" (DARDOT & LAVAL, 2016, p. 111). Ao compartilhar da desconfiança de Friedman e Hayek em relação ao político, ainda que não rejeitem a soberania estatal, os ordoliberais buscam "desdemocratizar o Estado e substitui-lo por outro, suportado pela expertise técnica, dirigido por autoridades competentes e devotado aos princípios de uma economia competitiva e liberalizada" (BROWN, 2019, p. 93). Nesse sentido, a proposta de uma "constituição econômica" garante a autonomia do mercado em relação ao restante da sociedade. Aqui, o Estado é dedicado à expansão do mercado que, em contraposição, deve ser autônomo em relação ao poder político. Os Estados ordoliberais não podem aceitar a participação cidadã ou o compartilhamento do poder democrático; ao contrário, eles são moldados por 'uma expressão clara e inatacável da vontade política' fundada na expertise técnica. Dirigir o capitalismo requer uma administração não política e não democrática por autoridades habilmente informadas e que intervêm 'não no mercado, mas para o mercado (...) nas condições do mercado (BROWN, 2019, p. 98). Desse modo, os fundadores da racionalidade neoliberal teorizam acerca de como se conforma um intervencionismo propriamente liberal. Não se trata da retomada da crítica do velho laissez-faire ou da ideia corrente de "Estado mínimo" para caracterizar a relação entre economia e política, mas da necessidade de construir um "código de trânsito" que seja "firme e rigoroso", estabelecendo, na acepção polanyiana, uma complementariedade entre Estado e economia de mercado em oposição à sociedade. Assim, "longe de condenar por princípio a intervenção do Estado como tal", Hayek teve a "originalidade de substituir a alternativa da 'intervenção ou não intervenção' pela questão sobre qual deve ser a natureza de suas intervenções. Mais precisamente ainda, a questão é diferenciar as intervenções legítimas das ilegítimas" (DARDOT & LAVAL, 2016, p. 158). A "racionalidade neoliberal" tem, então, como elemento constitutivo primordial uma "cultura política profundamente antidemocrática" (BROWN, 2019). A democracia é rebaixada e diminuída, de modo que o exercício do poder político é progressivamente "privado da modulação provida por meio da deliberação esclarecida, do pacto, da prestação de contas e da legitimação pela vontade do povo". O Estado permanece como forma e organização institucional do exercício do poder, porém em nome das liberdades e da moral tradicional deve ser "desdemocratizado". Uma vez despojado de soberania popular, o Estado tem sua autoridade fortalecida, o que, na visão neoliberal, levaria a uma pacificação dos potenciais conflitos sociais. Pela tecnocracia, rebaixa-se "ainda mais o valor ou mesmo a possibilidade de participação democrática", com o objetivo de garantir um "anteparo contra os esforços inevitáveis de atores poderosos do mercado para distorcer a concorrência" (BROWN, 2019). Nesse sentido, a argumentação de Brown (2019), conforme já sugerido, aproxima-se de um dos núcleos da teoria de Polanyi. Lembremos que uma economia de mercado é conformada por um sistema autorregulável de mercados, ou seja, "é uma economia dirigida pelos preços do mercado", em um sistema "capaz de organizar a totalidade da vida econômica sem qualquer ajuda ou interferência externa". Isso é uma novidade histórica, de acordo com Polanyi (2000), advinda da Revolução Industrial, e que encontrou no liberalismo do século XIX seu ápice. Até então, o papel desempenhado pelos mercados na economia interna "foi insignificante", e nem mesmo o mercantilismo permitiu prever "um desenvolvimento tão singular". O comércio "livre" da época mercantil o era apenas em relação ao particularismo do período anterior, mas pelo Estado nacional houve uma ampliação do "escopo da regulamentação. O sistema econômico estava submerso em relações sociais gerais; os mercados eram apenas um aspecto acessório de uma estrutura institucional controlada e regulada, mais do que nunca, pela autoridade social" (POLANYI, 2000, p. 62). É contra tal autoridade que o liberalismo se volta na busca pela generalização dos mecanismos de mercado como reguladores das relações políticosociais. Nesse processo, o controle do Estado pelo mercado e a direção precisa do "intervencionismo" a favor da promoção do lucro assumem centralidade no projeto político liberal. Em Brown (2019), há uma articulação dessa evolução histórica com a valoração neoliberal de uma cultura política antidemocrática, pois a completa redução do público ao privado impede qualquer forma de sobreposição do sistema social ao sistema econômico de mercado. No meu entender, a análise político social do neoliberalismo tem significativas perdas se colocarmos em evidência as falhas de previsão de Polanyi, pois isso pode obscurecer as possibilidades de interpretação do presente a partir de sua conceituação de liberalismo. A "racionalidade neoliberal", conforme descrito acima, pode ser interpretada pela noção de "moinho satânico", seja em sua conceituação como cultura antidemocrática que se fundamenta no mercado (Brown, 2019), seja na ideia de generalização da concorrência que perfaz o centro da argumentação de Dardot e Laval (2016). Buscarei demonstrar isso a partir de agora. Polanyi (2000) concebe o mercado, não o Estado ou a sociedade, como força transformadora que move a história, atuando em seus subterrâneos. O mercado é definido por ele a partir de sua historicidade e não como uma relação social natural, pois o ser humano não nasce dotado de propriedade privada. No entanto, sua análise enfatiza o mercado como sistema de trocas que necessariamente tem de ser imposto pelo Estado, e nessa imposição se contrapõe à sociedade. Não havia nada natural em relação ao laissez-faire; os mercados livres jamais poderiam funcionar deixando apenas que as coisas seguissem o seu curso. Assim como as manufaturas de algodão -a indústria mais importante do livre comércio -foram criadas com a ação de tarifas protetoras, de exportações subvencionadas e de subsídios indiretos dos salários, o próprio laissez-faire foi imposto pelo Estado. As décadas de 1930 e 1940 presenciaram não apenas uma explosão legislativa que repelia as regulamentações restritivas, mas também um aumento enorme das funções administrativas do Estado, dotado agora de uma burocracia central capaz de executar as tarefas estabelecidas pelos adeptos do liberalismo. Para o utilitarista típico, o liberalismo econômico era um projeto social que deveria ser posto em prática para grande felicidade do maior número de pessoas; o laissez-faire não era o método para atingir alguma coisa, era a coisa a ser atingida. (POLANYI, 2000, p. 170). Por isso, a dualidade decisiva para compreender o processo histórico, e mais recentemente o neoliberalismo, não é Estado-mercado, mas sociedade-mercado. Para Polanyi (2000), é decisivo pensar nas consequências da expansão do mercado para a força de trabalho, pois na sociedade capitalista quase todo trabalho é exercido na forma de venda da força de trabalho, algo estabelecido e regulado pelo Estado, e fundamento básico do laissezfaire. É justamente essa relação que permeia o cotidiano vivido pelas pessoas. Como dito anteriormente, não nascemos dotados de propriedade privada, mas de força de trabalho, e a consequência disso é estar inteiramente dependente desse fator para sobreviver. Na Inglaterra, coração da Revolução Industrial, afirma Polanyi (2000), "ocorreu um progresso miraculoso nos instrumentos de produção, o qual se fez acompanhar de uma catastrófica desarticulação nas vidas das pessoas comuns". Esse é o processo sobre o qual ele procura refletir sob o termo "moinho satânico": quais fatores determinam as formas dessa desarticulação, que "moinho satânico" foi esse que triturou os seres humanos? "Qual foi o mecanismo por cujo intermédio foi destruído o antigo tecido social e tentada, sem sucesso, uma nova integração homemnatureza"? (POLANYI, 2000, p. 51) O capitalismo, ressalta o autor, tende a produzir, por meio de suas sucessivas crises, um vasto exército industrial de reserva, grande contingente de pessoas que ficam à margem das relações de mercado e não encontram mais lugar em uma sociedade dominada pelo mercado. Mesmo em meio a uma acelerada produção de riquezas, promove-se a exclusão social de um número crescente de pessoas. Por isso a dualidade fundamental é entre sociedade e mercado que, pela relação estabelecida com o Estado e a orientação precisa de sua intervenção, tende a dissolver as relações sociais em todos os seus âmbitos, não meramente econômicos. Com sua tendência de expansão permanente, o mercado no modo de produção capitalista tende a invadir todos os domínios da existência humana, e para tanto disputa o Estado com a sociedade, em uma dinâmica que varia da imposição de limites ao mercado ao alcance do laissezfaire como princípio. Ao tratar da política de cercamento de terras na transição do feudalismo para o capitalismo na Inglaterra, Polanyi afirma que "os senhores e os nobres estavam perturbando a ordem social, destruindo as leis e os costumes tradicionais, às vezes pela violência, às Volume XXI Issue II Version I 22 ( ) vezes por pressão e intimidação". Com o pobre desprovido de sua parcela de terras comuns, "o tecido social estava sendo destruído; aldeias abandonadas e ruínas de moradias humanas testemunhavam a ferocidade da revolução" (POLANYI, 2000, p. 53). Outro exemplo se deu pela "devastação sem precedentes nas moradias do povo comum". Nesse processo, os trabalhadores progressivamente passaram a se "amontoar" em "novos locais de desolação; a gente do campo se desumanizava em habitantes de favelas; a família estava no caminho da perdição e grandes áreas do país desapareciam rapidamente sob montes da escória e refugos vomitados pelos 'moinhos satânicos'" (POLANYI, 2000, p. 58). Os "moinhos satânicos" são, portanto, metáfora de "uma avalanche de desarticulação social", por mecanismos institucionais que provocaram a "devastação" da sociedade por um "novo credo", que "era totalmente materialista", e apregoava que todos os problemas humanos seriam resolvidos com a produção de uma quantidade ilimitada de bens materiais. Um princípio bastante desfavorável à felicidade individual e geral trabalhava na destruição de seu ambiente social, sua vizinhança, sua posição na comunidade, sua profissão, numa palavra, de todas aquelas relações com a natureza e o homem na qual estava embutida a sua existência econômica anterior. A Revolução Industrial estava causando uma desarticulação social de estupendas proporções, e o problema da pobreza era apenas o aspecto econômico desse acontecimento. Owen afirmou, com muita justeza, que a menos que a interferência e a direção legislativas contrabalançassem essas forças devastadoras, ocorreriam grandes e permanentes males (POLANYI, 2000, p. 157) Na noção de "moinho satânico", desse modo, há uma combinação da expansão do mercado com sua organização pelo Estado, com consequências de desarticulação social e apoio em uma nova ideologia. São essas, justamente, as dimensões presentes no debate teórico contemporâneo sobre a racionalidade neoliberal. Ainda que os efeitos imediatos variem, na medida em que se trata de épocas históricas diferentes, os fundamentos pelos quais se operam são os mesmos. Por isso, é possível afirmar que a humanidade neste início de século XXI vivencia um novo "moinho satânico", agora neoliberal. Lembremos ainda que Polanyi distingue a intervenção governamental das fronteiras entre Estado e mercado, ao afirmar que o Estado liberal do século XIX conduziu uma dupla ação. "De um lado, agiu em favor da criação dos mecanismos de mercado e, de outro, implantou mecanismos que o limitaram; de um lado, apoiou o 'movimento' na direção da sociedade de mercado e, de outro, levou em consideração e reforçou o 'contramovimento' de resistência da sociedade aos mecanismos de mercado". Para que a sociedade inteira se organizasse de acordo com a "ficção da mercadoria", constituindo-se como uma "grande máquina de produção e troca, a intervenção do Estado é indispensável", tanto no plano legislativo, "para fixar o direito de propriedade e contrato", quanto no administrativo, "para instaurar nas relações sociais regras múltiplas necessárias ao funcionamento do mercado concorrencial e fazer com que sejam respeitadas. O mercado autorregulador é fruto de uma ação política deliberada". O contramovimento de proteção à sociedade se dá justamente contra tais tendências destruidoras do mercado, sendo algumas de suas expressões o protecionismo comercial nacional e o protecionismo social que se instalou no fim do século XIX. "Portanto, a história deve ser lida segundo um 'duplo movimento' de sentido contrário: o que leva à criação do mercado e o que tende a resistir a ele" (DARDOT & LAVAL, 2016, p. 63-4). É por essa reflexão que Polanyi (2000) fundamenta sua previsão de morte do liberalismo, na "grande transformação" dos anos 1930-40. A catástrofe do século XX foi conformada pela dissolução da sociedade pelo mercado. No pós-guerra, entende o autor, a sociedade reagiu ao mercado, seja pela forma do socialismo, seja pelo fascismo, tendo o liberalismo sucumbido diante de seu grande fracasso evidenciado pelas guerras. Apesar de 30 anos depois o liberalismo ter ganhado novo impulso, apegar-se a tal erro de previsão pode nos impedir de mobilizar os conceitos de Polanyi para definir a racionalidade neoliberal, "moinho satânico" que promove a concorrência em todas as dimensões da vida humana, formas autoritárias de organização político-social e a piora das condições de vida da grande maioria da população em todas as partes do mundo. V. # Considerações Finais O lucro como princípio da ação e da vida humana é o fundamento do mercado autorregulável e de uma sociedade moldada pelo mercado. Em um longo processo histórico de desarticulação social e reorganização do Estado, tal princípio deu bases para a expansão do mercado como agente regulador dos processos de interação social como um todo, em suas dimensões materiais e ideológicas. O avanço é tamanho que ao mercado são atribuídas dotações humanas: ele reage com mudanças de humor a cada manifestação coletiva, intervenção pública ou acontecimento natural. É uma figura mítica, que denuncia qualquer dissenso como origem do caos, e assim expande ininterruptamente o "totalitarismo neoliberal". Não à toa, a atual conjuntura repõe de maneira dramática a velha tensão liberal entre capitalismo e democracia. O sistema econômico, de mercado, ganha corpo a partir de uma institucionalidade que lhe é própria, e cada vez mais apartada de qualquer controle Volume XXI Issue II Version I 23 ( ) social. Desde cima, ou de uma esfera oculta que pouquíssimos alcançam, mas sempre presente, modela a sociedade e o Estado à sua maneira, exigindo que a totalidade social funcione de acordo com seus interesses. Submetido a essa força, o Estado reproduz cotidianamente a sociedade de mercado, e busca legitimação por um já velho jargão: "não há alternativa". Por isso, como nos ensina Nancy Fraser (2017), é preciso construir "uma visão multidimensional de crise". O aporte teórico polanyiano, naquilo que denomia laissez-faire planejado, traz uma concepção de contradição capitalista "entre domínios", não mais restrita ao sistema econômico propriamente dito, mas também presente na "tendência inerente do 'mercado autorregulado' para desestabilizar tanto a sociedade quanto a própria natureza". As contradições envolvem diferentes condições necessárias à produção mercantil, que colocam sob risco os "os processos naturais que sustentam a vida e fornecem os insumos materiais para o abastecimento social", assim como "os processos socioculturais que criam as relações de solidariedade, as disposições afetivas e os horizontes de valor que sustentam a cooperação social" (FRASER, 2017, p. 4). Assim, o mercado livre se opera pelo "incremento de um intervencionismo contínuo, controlado e organizado de forma centralizada". Em uma apenas aparente contradição, o mercado que se autorregula avança na regulação de tudo a sua volta. "A introdução dos mercados livres, longe de abolir a necessidade de controle, regulamentação e intervenção, incrementou enormemente o seu alcance" (POLANYI, 2000, p. 172). Quem cultua de forma permanente o Estado enquanto ausência promove sua presença por mecanismos de controle irrestrito: cabe à tecnocracia e a novas instituições apartadas de qualquer intervenção democrática garantir a expansão ininterrupta do mercado sobre a vida. Novamente recorrendo às palavras de Chico de Oliveira, estamos diante de um "totalitarismo neoliberal" que disciplina todas as dimensões da vida de acordo com os interesses de mercado, e as realidades antes próprias da periferia do sistema capitalista parecem ter-se generalizado. Sob a ação do Moinho Satânico neoliberal, uma razão única busca se impor e submeter por completo a sociedade e a natureza ao interesse único da acumulação de capital. Volume XXI Issue II Version I25( ) © 2021 Global Journals FThe "Satanic Mill" in Neoliberalism © 2021 Global Journals Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism Year 2021 ## F The "Satanic Mill" in Neoliberalism * Política neoliberal e sindicalismo no Brasil. 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